Visto como a grande revolução profissional dos últimos dois anos, o trabalho remoto não nasceu com a pandemia e já vinha sendo praticado há alguns anos em países como os Estados Unidos, por exemplo. No entanto, devido às severas restrições em função do Covid-19, o home office passou a ser cada vez mais valorizado, tanto por empresas quanto por colaboradores.

Passados dois anos desde o início da popularização deste modo de trabalho, é necessário fazermos importantes reflexões: os colaboradores realmente se adaptaram a trabalhar em casa? Será que todos possuem um ambiente de trabalho adequado para manter uma rotina saudável?

Os benefícios do trabalho remoto são inegáveis. Não é preciso gastar tempo com o deslocamento até o escritório, os horários são mais flexíveis, é possível acompanhar mais de perto o crescimento dos filhos e ver a família com mais frequência, além da economia diária com transporte e alimentação. Porém, após as primeiras boas impressões, algumas questões importantes sobre o home office surgiram. A primeira delas é que o trabalho remoto não é uma solução para todos.

Disparidade nas oportunidades de trabalho

Olhando para o mercado de trabalho no Brasil, vemos que esta realidade ainda é para poucos. Segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), apenas 11% dos brasileiros têm condições de trabalhar à distância, e aproximadamente somente 17% dos empregos têm potencial para teletrabalho, tendo capacidade de efetivamente realizar as tarefas.

No país, as oportunidades de trabalho no estilo home office concentram em poucas capitais, 28% dos que aderiram à modalidade estão no Distrito Federal e 21% em São Paulo, enquanto apenas 8% ficam nos estados do Pará e Maranhão, o que revela uma desigualdade de oportunidades e de acesso à tecnologia nessas regiões.

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Para além do recorte geográfico, esta disparidade está presente também nas questões de gênero em todo o mundo. Durante a pandemia, a jornada dupla que as mulheres sempre estiveram expostas se intensificou, principalmente para as mães. Para elas tem sido um verdadeiro malabarismo lidar com tarefas de trabalho, estudos, cuidados com a casa e filhos.

Em pesquisa divulgada este ano pela Allianz Pulse, sobre a pandemia e trabalho remoto, os dados revelam que existe uma parcela de mulheres inativas profissionalmente na sociedade devido à responsabilidade de cuidar. Em 2021 esse número foi de 31% na Alemanha, 21% na França e 30% na Itália. Isso mostra que disponibilizar o trabalho remoto não é suficiente, pois as atividades da casa ocupam muito espaço da sua rotina.

A diferença de responsabilidades entre homens e mulheres gera também uma distância profissional e desigualdade de oportunidades, pois a mulher não tem a mesma disponibilidade de tempo para realizar suas tarefas e o trabalho remoto não é efetivo para igualar a relação de gênero. Seria necessário criar modos de trabalho que possibilitassem que a mulher tivesse mais qualidade de tempo para desempenhar bem suas tarefas profissionais e ascender profissionalmente.

Trabalhadores arrependidos?

Muitas das queixas registradas pela pesquisa da Allianz Pulse estão relacionadas ao nível de estresse durante a rotina de trabalho online. Em muitos casos o trabalhador não dispõe de um ambiente adequado para realizar as tarefas e se vê obrigado a dividir um espaço – muitas vezes precário, com outros familiares.

Em outros momentos, é preciso somar a rotina doméstica com a vida profissional. Por este motivo, enquanto muitos colaboradores ao redor do mundo preferem trabalhar no conforto de seus lares, o estudo citado mostrou que países como Alemanha, França e Itália já veem seus postos físicos de trabalho sendo preenchidos novamente pelos colaboradores. Tanto no formato híbrido ou integral, este número aumentou 7% na Alemanha e Itália e 4% na França, em comparação com o ano anterior.

Por fim, os dados mostram que o teletrabalho foi uma importante conquista para os trabalhadores, mas que ainda há questões importantes a serem discutidas e avaliadas, tanto na esfera trabalhista quanto na social. A princípio, a pandemia era algo sem precedentes na era moderna e não tínhamos em vista qualquer perspectiva de voltar ao trabalho presencial. Atualmente já podemos repensar nosso modo de trabalho, e o home office do início de 2020 – sem estrutura, sem plano de carreira, sem preocupação com a saúde mental dos colaboradores e sem um equilíbrio entre vida pessoal e profissional-, já não brilha tanto aos olhos do trabalhador.

Trabalho remoto: a lua de mel acabou?

Por Patricia Pelayo Romero, especialista em seguro e ESG na Allianz Trade. Economista com foco em seguros, patrimônio familiar e ESG trabalhando na Alemanha. Experiência em pesquisa, sustentabilidade, insights de risco, bancos e seguros. Apaixonada pela integração da sustentabilidade no dia a dia dos negócios/vida. Apoiador da igualdade de gênero, inclusão e empoderamento no local de trabalho. Constantemente explorando tendências, oportunidades e missões no trabalho.

Ouça também o PodCast RHPraVocê, episódio 85, “Presencial, Remoto ou Híbrido: como definir o modelo de trabalho da empresa?” com Lucia Santos, diretora de RH da Adecco. Clique no app abaixo:

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