Embora cuidar de pessoas seja uma das mais importantes missões do RH – se não for a mais –, muitas vezes falta à área alguém que lhe ofereça os mesmos cuidados. Isso é enfatizado pelo estudo Panorama da Saúde Emocional do RH, produzido pela Flash People, unidade de negócios da Flash. Segundo a pesquisa inédita, nove entre dez profissionais de Recursos Humanos se sentem sobrecarregados em suas rotinas corporativas. Além disso, 59% alegam sentir níveis elevados de pressão.
O levantamento foi realizado com 702 profissionais da área em todos os níveis hierárquicos e diversas frentes de atuação, como departamento pessoal, remuneração e benefícios, recrutamento e seleção, entre outros. Entre os principais motivos que impactaram a sensação de sobrecarga estão a necessidade de estar disponível o tempo todo (27%), falta de ferramentas para gestão de pessoas (18%), falta de reconhecimento (17%) e falta de apoio da liderança (14%).
De acordo com Jan Christian, general manager da Flash People, o cenário ainda é consequência direta do impacto da pandemia no mercado de trabalho, uma vez que a área foi uma das mais exigidas para gerenciar a crise – o que incluiu uma mudança no modelo de trabalho que, para muitas empresas, foi um processo bem mais complexo. Fatores como a aceleração dos processos digitais também contribuem para o aumento do cansaço.
“Quando se tinha todos os colaboradores dentro do escritório, a gestão era mais concentrada e com um viés mais pessoal, com a distância física impulsionada pelo isolamento social e o modelo remoto, a área de recursos humanos precisou acelerar a digitalização e encontrar soluções para essas novas demandas. Em nossas análises, vimos que esse fluxo necessita de revisão, pois atualmente os profissionais acessam, em média, sete ferramentas diferentes, o que torna o processo pouco fluido e estimula uma atuação pouco estratégica e muito operacional”, pontua.
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Medicina do trabalho em alerta
A sobrecarga no trabalho pode ser um gatilho não apenas para problemas de saúde pontuais, mas também para enfermidades mais duradouras. Altos índices de ansiedade – e eventuais crises –, ataques de pânico, Burnout e até mesmo depressão são alguns exemplos. Dito isso, os efeitos dos excessos e da pressão sentida por ser manifestados em sintomas físicos e/ou mentais das mais diversas gravidades.
A questão é tão séria que algumas empresas especializadas em medicina do trabalho já alertam para um fenômeno cada vez mais comum: empresas com mais afastamentos em decorrência de doenças mentais do que físicas. “Há 20 anos, o maior número de afastamentos era por conta de acidentes de trabalho, de trajeto ou por problemas ortopédicos. Hoje, a situação se inverteu. Em uma rápida análise, percebemos que na Unidade da Moema 70% são de pacientes com problemas psiquiátricos. Em seguida vêm os problemas ortopédicos”, aponta Tatiana Gonçalves, sócia da Moema Medicina do Trabalho.
Ela acrescenta que nestes 70% entre as doenças que acometem as pessoas se destacam o transtorno de ansiedade, a depressão e a Síndrome de Burnout. Essas doenças e os transtornos que as permeiam correspondem a um conjunto de doenças psiquiátricas, caracterizadas por preocupação excessiva ou constante de que algo negativo vai acontecer.
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Esgotamento emocional
Os dados trazidos pela executiva são corroborados pelo estudo da Flash People. De volta ao levantamento, ele mostra que 64% dos profissionais de RH respondentes afirmam ter tido algum problema relacionado à saúde mental no último ano. A ansiedade foi o sintoma mais citado (41%), seguido por falta de motivação (16%), Burnout (4%) e – por fim – depressão (3%). Entre os cargos que mais sinalizaram a presença de casos de saúde mental estão analistas, assistentes e coordenação.
“Quando se trabalha por muitas horas seguidas, especialmente em tarefas repetitivas nas quais você não vê muito valor sendo gerado, o esgotamento e a frustração aparecem, causando sintomas relevantes. O ponto positivo é que as empresas estão atentos a isso e o exercício é cuidar de quem cuida, pois o RH também precisa dessa atenção”, salienta Christian.
Mais da metade dos respondentes (54%) também sinalizaram que viram colegas de profissão que foram afastados por esgotamento profissional nos últimos meses. Um dos fatores importantes identificados foi a quantidade de horas trabalhadas por esses profissionais. Mais da metade dos respondentes (51%) sinalizou que ficam entre 6h a 8h habituais, mas 40% ficam entre 8 a 10h e 5% ultrapassam as 10h de expediente diário.
Para combater esses problemas existem caminhos para empresas, um desses passa pela intensificação de ações relacionadas à medicina do trabalho que trabalhem o lado de bem-estar. “Uma alternativa é que as empresas possam fazer grupos para vivenciamentos, onde se aprenda a lidar com situações e pessoas”, explica Vicente Beraldi Freitas, médico, consultor e gestor em saúde da Moema.
Como estes problemas são mais frequentes, um caminho é sempre repensar situações que podem originar esses males. Com melhores condições de trabalho e das relações profissionais com diminuição do isolamento.
Pode ser importante um afastamento temporário do local de trabalho da pessoa impactada, a reorganização das suas atividades, um adequado investimento em outros interesses, como no maior convívio com família e amigos, a prática de exercício físico ou de atividades relaxantes.
Por Bruno Piai