Já em 2018 a OMS (Organização Mundial da Saúde) alertava sobre o aumento dos casos de transtornos de ansiedade e depressão, e dizia que estas seriam as maiores causas de afastamentos do trabalho em todo o mundo até 2020. Foi exatamente naquele ano que se iniciou a pandemia da Covid-19 e os impactos na saúde mental foram além de qualquer estimativa.

Segundo a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, o Brasil registrou 576 mil concessões de afastamentos por transtornos mentais e comportamentais em 2020, 26% a mais do que o registrado em 2019, a maior alta já registrada. Os números do ano passado ainda não foram compilados, mas a tendência é de aumento dos casos e dos afastamentos.

Fato é que o aumento dos transtornos mentais e comportamentais podem ter uma relação com a pandemia, inclusive com o risco de se contaminar sendo considerado fator estressor para a saúde mental.

Outros fatores impactam na saúde mental do trabalhador brasileiro, como as mudanças abruptas na rotina, a adaptação ao home office, a volta ao presencial, o trabalho híbrido e as incertezas em relação ao futuro pós-covid.

Para Ricardo Pacheco (foto abaixo), médico CEO da Oncare Saúde e presidente da ABRESST (Associação Brasileira de Empresas de Saúde e Segurança no Trabalho), nem sempre é possível perceber os sintomas de depressão e ansiedade. “Muitas pessoas continuam nas suas atividades laborais sem sinais aparentes de que algo não vai bem, por isso é preciso prestar atenção a mudanças significativas na qualidade de vida do indivíduo. Sensações prolongadas de tristeza ou de inutilidade e abuso de substâncias como álcool e drogas são pontos de alerta”, alerta.

Ricardo Pacheco

Cristina Rodrigues, psicóloga organizacional da Oncare Saúde enfatiza que sem saúde mental, não existe saúde. “Por isso, é fundamental que as empresas reforcem os critérios para avaliação, e estamos vendo esse comprometimento. Uma pesquisa intitulada Gestão de Pessoas na Crise de Covid-19, da Fundação Instituto de Administração (FIA), apontou que desde o início da pandemia 75% das empresas brasileiras desenvolveram iniciativas para cuidar da saúde mental dos colaboradores. O nosso serviço de saúde enfatiza sempre que é preciso ter um olhar mais atento e cuidadoso para as questões de saúde mental”.

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Pandemia impulsiona declínio

Mais de 50% dos brasileiros afirmaram que sua saúde emocional e mental piorou desde o início da pandemia. Esse índice é superior à média dos 30 países pesquisados pelo Instituto Ipsos, que entrevistou 21 mil pessoas para o levantamento encomendado pelo Fórum Econômico Mundial.

Cerca de 53% dos brasileiros declararam que seu bem-estar mental piorou entre 2020 e 2021, índice somente maior em quatro países: Itália (54%), Hungria (56%), Chile (56%) e Turquia (61%). Em outra pesquisa global de março de 2020, 41% dos brasileiros disseram ter sintomas como ansiedade, insônia ou depressão.

Burnout

Pacheco lembra que a saúde mental do trabalhador é uma das grandes preocupações das organizações. “Especialmente considerando as diversas transformações ocorridas nesses ambientes devido à pandemia do novo coronavírus. Entre as doenças mentais que podem estar relacionadas ao trabalho estão a depressão, a ansiedade, as dependências de álcool e outras drogas e a Síndrome de Burnout − um distúrbio psíquico causado pela exaustão extrema relacionada ao trabalho de um indivíduo. Juntas, essas doenças e síndromes estão entre as principais causas de afastamento do trabalho no Brasil, segundo a Previdência Social”, afirma o CEO da Oncare Saúde.

Além disso, Cristina (foto abaixo) chama a atenção para o fato de que grande parte das organizações não estão preparadas para lidar de maneira satisfatória com os problemas relacionados à saúde mental dos colaboradores.

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“Aquelas que estão mais preparadas o fazem por meio da assistência – o que também é importante, mas não é suficiente, já que esse respaldo não influencia nas causas das doenças. É óbvio que ações de assistência, corretivas, são necessárias. Mas o ideal é trabalhar com a prevenção e com diagnósticos preventivos contínuos dos trabalhadores. Atuar na saúde mental envolve um nível de investigação muito maior. Fazemos esse trabalho preventivo com acolhimento que traz excelentes resultados”, salienta a psicóloga.

Cristina Rodrigues

Pacheco acrescenta, ainda, que, o meio ambiente do trabalho adequado é uma forma de prevenir a saúde mental do trabalhador. “É preciso que se busque um meio ambiente do trabalho psicologicamente hígido a partir da relação entre os riscos psicossociais laborais e os transtornos mentais ocupacionais, cujo tema é de extrema atualidade e importância no campo das relações de trabalho, especialmente no momento em que vive o Brasil, diante de verdadeira epidemia de doenças ocupacionais, com destaque para o aumento das doenças mentais que atingem os trabalhadores”.

Por Bruno Piai