2023 chega ao fim. O que esperar de 2024? 

Espero que haja uma reflexão e ação quanto à manutenção do termo Black Friday. Temos cuidado tanto para que a comunicação racista seja eliminada do nosso dia a dia e mantemos Black Friday!

O registro mais antigo da expressão Black Friday é de 1951, pela American Dialect Society, entidade dedicada ao estudo da língua inglesa nos EUA. Muita gente faltava ao trabalho para emendar o feriado de Ação de Graças com o fim de semana – e essa sexta-feira foi apelidada de “negra”.

Os varejistas não gostavam da expressão “sexta-feira negra” como sinônimo do dia em que mais vendiam. Tentaram mudar o nome para “Big Friday”, mas o negócio não pegou. Assim, Black Friday permaneceu. Saiba mais!

Há também o registro de Black Friday ter surgido do departamento de polícia da cidade de Filadélfia, devido ao grande número de pessoas que saiam às compras na última sexta-feira de novembro e ocupavam toda a cidade, deixando-a caótica e fazendo com que as forças de segurança pública denominassem o dia como Black FridayFonte: David Zyla: How to Win at Shopping

Seja qual tenha sido a origem, denominar situações negativas como “negras” nos remete a termos que estamos retirando do nosso vocabulário, tais como:

  • “A coisa está preta”
  • “Lista negra”
  • “Trabalho de preto”
  • “Isso é coisa de preto”

Atualmente, Black Friday estende-se cada vez mais à totalidade do mês de novembro e não apenas a um dia, como era no início.

O que eu quero para 2024 é que as pessoas saibam sobre a origem dessa denominação; não tenho, ainda, a pretensão de que seja adotada uma  outra denominação, como “Big Friday…”

O que eu quero para 2024: que Consciência Negra, não mais se restrinja ao dia 20 de Novembro e estenda-se  a todos os dia do ano.

Você conhece a história de: Aqualtune princesa do Congo, avó de Zumbi dos Palmares I Zumbi dos Palmares I Dandara

Por quê?

Porque precisamos acelerar as oportunidades de tomada de consciência pelas pessoas, para que assumam atitudes antirracistas.

Conscientizar para Evoluir – Como combater o racismo além das ações em desenvolvimento

A tomada de consciência acontece quando saímos de uma “consciência ingênua” para uma “consciência crítica da realidade”, o que ocorre por meio da nossa atuação ativa nessa realidade e pelo diálogo, sem medo do certo e errado. É um processo, não uma mudança que ocorre de uma hora para outra.

Referências aprendidas desde infância e alicerçadas ao longo da vida geram medo frente à descoberta da necessidade de evolução.

Letramento Racial

Para tanto, temos uma boa alternativa, que é o Letramento Racial, que segundo a sua criadora, France Winddance Twine, objetiva:

  • Envolver negros, brancos, amarelos, vermelhos, enfim, a humanidade toda;
  • Responder individualmente às tensões raciais, lado a lado com respostas coletivas, por meio de Políticas Públicas;
  • Desconstruir o racismo a partir da reeducação, eliminando o desconhecimento para que o sistema não continue a ser reproduzido sem questionamentos.

O desconhecimento das questões raciais é um dos principais facilitadores do racismo hoje em dia e lutar para que isso seja eliminado faz parte da luta antirracista.

Conscientizar Para Evoluir

Trazemos os ensinamentos de Lia Vainer Schucman, que recomenda seguir 5 passos, aos quais  agregamos comentários:

1º ) Reconhecimento da branquitude  

“No Brasil, as pessoas brancas são beneficiadas pela falsa ideia de superioridade branca, desde os tempos da colonização. Isso faz com que esse grupo ocupe posições privilegiadas, que facilitam o acesso a espaços de decisão”.

Entendamos que as pessoas brancas, de hoje, não escravizaram as pessoas negras no passado, mas herdaram os privilégios dos seus antepassados, beneficiando-se nos dias atuais.

Já os negros de hoje trazem o peso daquele período e o não privilégio, apenas por serem negros. Por isso, cabe a nós, que vivemos atualmente, aprender e fazer o que deveria ter sido feito no passado: dar dignidade e direitos a todos.

2º) Reconhecer que o racismo não está no passado

A  população negra, pretos e pardos é estatisticamente predominante nos índices de vulnerabilidade social, faltando-lhe acesso a habitação, saneamento, saúde, estudo e tantos outros recursos vitais. Faltam, e muito, políticas públicas e ações afirmativas para construir alternativas para esse cenário de desigualdades; e ainda, falta conhecimento sobre o tema para corrigir os erros causados no passado que se mantém praticados nos dias atuais.

3º) Entendimento que o racismo é aprendido.

Uma criança não nasce dominando uma linguagem. Ela passa por um processo de alfabetização e de letramento para assimilar a tal linguagem. O mesmo acontece com o racismo, que é reforçado por meio de códigos e relações aprendidas ao longo da vida, inclusive na escola.

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4º) Uso do “vocabulário racial”

A língua brasileira, herdada dos portugueses, é cheia de expressões racistas. No dia a dia, reproduzimos tanto essas expressões que as naturalizamos. Mas isso não quer dizer que elas não sejam racistas.

5º) Interpretação dos códigos racistas de nossa sociedade  

Para que isso seja possível, precisamos desconstruir o mito de que vivemos em uma democracia racial. Ou seja, a ideia de que o Brasil é um caldeirão multicultural, onde todas as raças e etnias convivem em paz e harmonia. Isso está longe de ser verdade.

O Que Fazer Além das Ações atuais?

O primeiro passo é reconhecer a existência do racismo; parar de naturalizar atitudes e discursos racistas. Por que não fazemos isso?

Segundo Daniel Teixeira, diretor-executivo do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades):

“…a desigualdade social no Brasil se deu pelo racismo e, por isso, a luta contra as desigualdades não pode ocorrer sem o fim do racismo.

Uma vez que a falsa doutrina da supremacia branca se produz no país desde a invasão portuguesa, de forma sistemática, não é qualquer educação que pode resolver os problemas do Brasil, uma vez que muitas vezes ela mesma reproduz o racismo. É preciso promover a educação antirracista”. 

Educação e Posicionamento antirracistas

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Evoluir na batalha contra o preconceito racial é ter a educação como ferramenta para a promoção de reflexões e conteúdos sobre Direitos Humanos e discriminação, pois assim é possível transformar mentalidades, reconhecer e enfrentar estruturas racistas que seguem presentes em vários contextos do cotidiano, promover a conscientização constante e não em práticas isoladas do calendário e exigir uma mudança cultural e, principalmente, individual dentro das empresas – tanto no discurso quanto no posicionamento e nas oportunidades oferecidas.

Temos a Lei Nº 10.639 de 2003, base do Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, que coloca as atribuições dos sistemas e das instituições de ensino para a implementação.

Esta Lei é ignorada em mais de 70% das escolas brasileiras: apenas 29% das secretarias municipais de educação têm ações consistentes e continuadas, conforme pesquisa do Geledés Instituto da Mulher Negra com o Instituto Alana.

E, enquanto isso, neste mês de novembro de 2023, acontecimentos ratificam que estamos muito longe da esperada evolução para o comportamento antirracista:

20.11.2023 

Haiara Fernandes Coelho, estudante de medicina veterinária, informou que alunos usaram um grupo na internet para discriminá-la. Os ataques ocorreram na Universidade Positivo Ecoville, em Curitiba. A universitária chegou a ter fotos tiradas sem permissão que foram enviadas ao grupo.

Um processo foi aberto entre abril e maio e Haiara segue aguardando o desenrolar do caso.

21.11.2023

“Porta-bandeira histórica relata abordagem racista em aeroporto no Distrito Federal”. Vilma Nascimento havia sido homenageada na cidade, no Dia da Consciência Negra. Durante a espera do voo, uma segurança pediu para ver sua bolsa na loja Duty Free.

Em nota, a Portela, a escola de samba em que Vilma atuava, repudiou a “atitude racista” e o “preconceito”.

E no mundo do trabalho?

Estudo realizado pelo Instituto Identidades do Brasil evidencia as desigualdades sociais no mercado de trabalho e prevê uma equidade racial por volta do ano 2190, ou seja, 167 anos.

Apenas a terceira geração das atuais crianças estará em pé de igualdade racial. São 17 anos a mais que a previsão de 2017, promovida pelo Instituto Ethos. Saiba mais!

Por fim, trago Maurício Rodrigues, presidente na Bayer Crop Science América Latina, que participou da 9ª edição do Fórum Brasil Diverso, 17 e 18 de novembro 2023.

O CEO esteve no painel “No olho do Furacão – Como grandes empresas tem lidado com crises envolvendo marcas” e nos deixou algumas contribuições, como estas:

“Somos reflexo de uma sociedade racista”

Precisamos:

  • Estar inseridos na sociedade;
  • Educar, via letramento e vieses;
  • Enfrentar o problema, o que requer coragem.

Por Jorgete Lemos, sócia fundadora da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços – Consultoria. É uma das Colunistas do RH Pra Você. O conteúdo desta coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.