7 em cada 10 brasileiros já acreditaram em algum conteúdo falso sobre o coronavírus. O dado é de uma pesquisa realizada em 2020 pela Avaaz, que revelou que o WhatsApp e o Facebook assumiram o protagonismo entre os canais de maior disseminação das fake news. Dados mais recentes, já dentro do panorama pós-pandêmico, deixam claro que a propagação de materiais inverídicos só cresceram de lá para cá e que a tendência não é a do cenário amenizar.

De acordo com estudo elaborado pelo jornal O Globo, em uma análise feita com 80 conteúdos sobre eleição, dos dez que mais viralizaram, seis eram mentirosos. Ou seja, postagens mentirosas têm um potencial de disseminação maior do que publicações apuradas.

“Se compartilham comigo, deve ser verdadeiro. É dessa forma que os disseminadores das fake news pensam. É esse mesmo indivíduo que vai legitimar a ‘verdade’ da ciência ou não, de acordo com suas crenças e ideologias”, explica o advogado e escritor André Faustino.

Outro levantamento, desta vez do Poynter Institute, com apoio do Google, indica que 62% dos quase 1,2 mil respondentes recebem informações falsas toda semana pelos meios de comunicação e redes sociais que utilizam. Os números, revelados no dia 11 deste mês, mostram também que quase 40% dos entrevistados já repassaram de forma involuntária algum post falso.

“Sensação de anonimato e falta de relação dos indivíduos com uma consequência [estimulam o compartilhamento de fake news]. As relações dentro das redes sociais são efêmeras e voláteis, dessa forma a própria pessoa que compartilha a desinformação não tem uma noção da consequência daquilo, pois isso é tudo fruto do próprio momento que o homem passa vivendo em sociedade. Vivemos o tempo do pós, a pós-modernidade, a pós-verdade, o pós-humano, o pós-deus e assim por diante” afirma Faustino.

Veja mais: Os empregadores devem enfrentar as fake news no ambiente de trabalho?

Quando as mentiras chegam às empresas

Relatório recente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) revela que metade das empresas brasileiras já foi vítima de alguma fake news. Por tal, a imensa maioria dos respondentes (92%) tem real preocupação sobre o quanto as inverdades podem causar estragos à reputação das empresas.

Em 2016, por exemplo, a PepsiCo viu suas ações caírem rapidamente de uma média de US$ 106,58 para menos de US$ 100. A organização foi alvo de um boicote realizado por apoiadores do ex-presidente Donald Trump, motivado por uma declaração que nunca aconteceu. Após se espalhar pelas redes sociais que a diretora executiva Indra Nooyi pediu para os apoiadores de Trump “fazerem compras em outro lugar”, não demorou para uma crise se estabelecer.

A preocupação com boatos e fake news deve ser pilar central das políticas e estratégias das organizações que se preocupam com sua reputação, pois crises podem gerar grandes danos. O máximo de atenção e cuidado é recomendado”, salienta Isabela Pimentel, sócia-fundadora da Comunicação Integrada e autora do livro “Ouvi Dizer – Comunicação Integrada como antídoto para boatos organizacionais”, que visa orientar profissionais de diversas áreas sobre como proteger a imagem das marcas.

Isabela Pimentel, sócia-fundadora da Comunicação Integrada

Isabela Pimentel, sócia-fundadora da Comunicação Integrada

A pesquisa da Aberje elenca os danos causados à reputação da marca, o estrago à imagem da organização, o prejuízo financeiro e o impacto à credibilidade do negócio como os principais pontos de ruptura causados pelas fake news, segundo os participantes do estudo. 90% acreditam que veículos tradicionais, como jornais e revistas online e impressos  são confiáveis, enquanto 82% não têm dúvidas que nas redes sociais estão os ambientes de menor confiabilidade. Não à toa, monitorar as redes sociais (90%) é a prática mais comum das empresas para identificar o que é dito sobre sua imagem.

Isabela orienta que as organizações sejam assertivas no desenvolvimento de estratégias para gerenciar boatos e fake news. A especialista elucida que a criação de canais de escuta e de processos transparentes de comunicação podem contribuir para que os impactos de uma crise causada por notícias falsas não chegue aos colaboradores. Além disso, para gerenciar o impacto de postagens mentirosas, a jornalista e historiadora orienta:

  • Capilarizar a missão, a visão e os valores do negócio juntos aos times;
  • Ter comitês com embaixadores internos;
  • Criar campanhas de conscientização e, em todas elas, informar e instrumentalizar o público interno para que saibam identificar fontes oficiais de notícias;
  • Promover canais de comunicação.

“Assim, bem informado, o time se sente valorizado e tem menos chances de acreditar em notícias falsas”, destaca. “Ainda que seja pouco provável extinguir os boatos nesses ambientes, dada sua natureza tão humana, podemos e devemos entender as motivações que os originam e seu fluxo de circulação, assim como mapear os graus de ruído e possíveis riscos envolvidos. E agir antes que eles se disseminem, provocando insegurança emocional e prejuízos aos funcionários e às companhias”, acrescenta.

Veja mais: Redes sociais: posicionamento x influência

Em artigo, Tato Athanase, gerente sênior de Recursos Humanos da SAS na América do Sul, manifesta que o RH precisa contribuir contra as fake news, posicionando-se contra eventuais informações inverídicas que sejam compartilhadas. Para ele, o setor tem a missão crítica de prover confiabilidade, especialmente aos funcionários que integram a base da pirâmide do negócio.

“Ao reduzir a nocividade das fake news na força de trabalho por meio de conteúdo útil e verificado, o RH também aumenta a confiança das pessoas. Além disso, é importante lembrar que não são só os colaboradores que leem e ouvem o conteúdo que seus empregadores divulgam: as pessoas replicam estas informações. Pense no efeito positivo que isso pode ter para os colaboradores de uma fábrica, grande varejista ou banco, e a vida de suas famílias e amigos: o impacto na sociedade é gigantesco”, finaliza.

Por Bruno Piai