A cultura corporativa, de modo geral, passa por uma profunda crise. E dentro desta crise há várias outras que resultam em um dos momentos mais desafiadores das últimas décadas para líderes empresariais mundo afora. Ultimatos para o retorno ao trabalho presencial, fuga de talentos de grandes centros para cidades menores, demissões em massa, semana útil de quatro dias, entre outros fatos que se tornaram corriqueiros no noticiário de negócios, são apenas as camadas mais expostas do cenário atual.

Um cenário em que os desafios estão centrados nas mudanças profundas do modelo de trabalho, que faz com que todas as corporações repensem as relações com seus colaboradores.

Mesmo antes da pandemia da Covid-19, os desafios para se criar uma cultura corporativa sólida dentro de uma empresa já vinham sendo bastante debatidos. Questões como flexibilidade de carga horária, dress code e mudanças nos formatos dos escritórios faziam parte das discussões dos departamentos de recursos humanos preocupados em fortalecer a cultura das empresas. A pandemia, por sua vez, potencializou esses embates e trouxe uma nova realidade de trabalho para a mesa. E dela dificilmente iremos sair.

Historicamente o trabalho é um dos fatores de arregimentação do coletivo. É algo que dá propósito às pessoas, assim como muitas vezes exercem função similar a família, a religião ou o lazer. Ao se chacoalhar as referências sobre o modelo de trabalho vigente, a cultura corporativa automaticamente é colocada em xeque.

Bem ou mal, durante a pandemia, o formato de trabalho remoto aconteceu para um contingente significativo de trabalhadores. Nas experiências bem sucedidas, o passo seguinte está sendo em como fortalecer a cultura corporativa, criando momentos de trocas entre os times e buscando estreitar os laços entre empresa e colaborador.

Já para o outro extremo, o retorno mandatório ao trabalho presencial, ao mesmo tempo em que retoma a hierarquia e o controle direto dos gestores sobre a produtividade dos times, gera instabilidade entre os funcionários. Algumas vezes com situações bastante inusitadas, como a possibilidade de apenas profissionais de tecnologia terem direito ao home office.

Para ilustrar melhor essa crise de confiança de modelo de trabalho, para além dos efeitos da pandemia, basta pensar na composição de equipes hoje em dia dentro de uma empresa. Muito provavelmente haverá representantes das gerações X, Y e Z, talvez até baby boomers, o que já é um conflito complexo a ser endereçado dentro de uma estratégia de criação de cultura corporativa.

Soma-se a isso os efeitos do trabalho remoto, no qual as maneiras de liderar equipes e mensurar resultados tiveram de ser revistas. Dúvidas surgiram em relação a formas de garantir que as diretrizes dadas pela corporação sejam seguidas sem o ambiente físico de trabalho, até então voltadas ao formato de comando e controle, ou então, sobre as melhores práticas para mensurar entregas e metas atingidas.

É possível afirmar que trata-se de um cenário bastante presente nas empresas em todo o mundo, inclusive em startups, que, em tese, se desenvolveram em um ambiente de trabalho mais dinâmico.

É inegável também que formatos interessantes de gestão vêm sendo aprimorados nos últimos anos. O estabelecimento de OKRs (Objetivos e Resultados-Chave, na sigla em inglês), KPI (Indicador de Performance), ou então as famosas planilhas de carga horária e entregas, que muitas empresas passaram a utilizar com o trabalho remoto, para citar alguns exemplos. Ainda assim, tais inovações estão mais relacionadas com performance e resultados. Onde fica a cultura?

Repensar o modelo de trabalho significa repensar também o propósito do trabalho. A motivação financeira é e sempre foi o principal propósito. O tempo de lazer desfrutado aos fins de semana e férias é outro motivador profissional relevante. A questão financeira segue latente, ainda mais em um momento de crise. Mas o mesmo já não é uma certeza absoluta quando o motivador é o lazer, sobretudo para as categorias profissionais em que o trabalho remoto se mostrou viável.

Afinal, se é possível trabalhar de qualquer local com acesso à internet, as férias passam a ser vistas de outra forma. A semana útil também. Obviamente estamos falando de um contingente pequeno perto do todo, mas o potencial deste movimento ser ambicionado por cada vez mais trabalhadores não pode ser desprezado.

Como, então, planejar a cultura de uma empresa em meio a tantos conflitos? As soluções ainda não estão claras. Mas, ao mesmo tempo, parece certo que os valores das empresas serão cada vez mais levados em conta pelos colaboradores. Os momentos de convivência, seja online ou offline, também precisarão ser melhor planejados.

Até lá, ainda mais em um momento de mercado de trabalho mais restritivo, em que as demissões seguem frequentes, os ultimatos ao trabalho presencial tendem a funcionar. Só que não vão resolver o conflito nos escritórios. Pesquisas e especialistas sérios tratam da insatisfação dos trabalhadores que estão voltando aos escritórios por determinação das empresas. Certamente trata-se de um contingente relevante de trabalhadores que estará disposto a buscar muito em breve oportunidades onde o home office não seja um tabu.

As regras do jogo mudaram sem termos tempo para pensar qual é o jogo que estamos atuando. Hoje, cada jogador interpreta as regras à sua maneira e cabe às lideranças das empresas convencê-los de que vale a pena fazer parte de suas culturas. Caso contrário, o jogo vai ser enxugar gelo.

Repensar a cultura corporativa ou enxugar gelo?

Por Karina Rehavia, fundadora e CEO da Ollo e da Social Talent – empreendedora e líder empresarial, possui mais de 20 anos de carreira contribuindo para o desenvolvimento e crescimento de iniciativas empresariais de organizações nas áreas de desenvolvimento de negócios internacionais e gestão e liderança de projetos de grande escala, com vivência no Brasil, EUA, Inglaterra, China e Emirados Árabes Unidos.

 

Ouça o episódio 157 do RH Pra Você Cast, “O onboarding ainda é subestimado pelas empresas brasileiras?“. O quanto vale investir em um bom onboarding? Para Hugo Soares, CEO e co-founder da Eva People, muito mais do que os gestores podem imaginar. O executivo, que já enfrentou uma péssima experiência de boas-vindas – nem tão boas assim – em uma das empresas por onde passou, é enfático ao elencar todas as principais vantagens que uma boa primeira impressão – e mais do que isso – pode deixar. A efetividade do onboarding está muito além de uma recepção de primeiro dia de trabalho. É um conjunto de ações que pode ser o fator determinante para aumentar o engajamento de um profissional. Mas como, de fato, as empresas podem caprichar para garantir um onboarding que eleve a sua competitividade? Isso e muito mais você descobrirá neste episódio do RH Pra Você Cast. Confira.

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Capa: Depositphotos