A modalidade de trabalho intermitente, antes de ser implementada pela empresa em uma atividade rotineira, deve ser analisada sob dois aspectos distintos de incidência de risco, sendo o primeiro por parte de quem vai prestar o serviço, o empregado, e o segundo por parte de quem contrata, a empresa.

Do ponto de vista do empregado, os destaques da lei (CLT, artigo 452-A) sobre o trabalho intermitente devem estar presentes para evitar a desconsideração do contrato, sendo eles: não continuidade/ausência de habitualidade; obrigatoriedade de alternar trabalho ativo com períodos inativos; e imprevisibilidade de oferta de trabalho. Sendo esse último uma construção da jurisprudência ao conjugar os dois primeiros pressupostos.

O regime intermitente pressupõe obrigatoriamente que o empregado tenha com o seu empregador um trabalho irregular, mesclando períodos de atividade com períodos de inatividade, sob pena de descaracterização do contrato.

Significa dizer que, se o empregado se acostumar a uma rotina de trabalho fixa, seja ela semanal ou mensal, o que era intermitente passa a assumir um caráter contínuo e habitual, contrariando a finalidade da lei.

No quesito habitualidade, tanto a legislação, quanto a jurisprudência, não definem parâmetros objetivos, de modo que o caso a caso deve ser acompanhado. Toda a convocação de um mesmo empregado que seguir uma padronização (ex. uma vez por semana, toda semana, em dia pré-determinado) sem uma justificativa específica, por conflitar com os pressupostos acima destacados, pode ser questionada. O ideal, portanto, é evitar uma conduta padrão de convocação sobre um trabalho recorrente.

Caso a empresa mantenha um “banco de intermitentes” e promova um rodízio na convocação dos trabalhadores para assegurar a aplicação dos pressupostos da lei, para a relação empregado-empregador não haverá risco de desvirtuamento do contrato de intermitente.

A principal diferença, portanto, entre o contrato intermitente e o contrato de trabalho regular/padrão, do ponto de vista do empregado, é a imprevisibilidade. Enquanto no regular há uma demanda corriqueira de trabalho, com uma expectativa básica constante, no intermitente não se sabe ao certo quando a necessidade surgirá, sendo dependente de fatores que descolam da atividade ordinária. O trabalhador intermitente presta serviços apenas quando convocado pelo empregador e, ao final do período demandado, não tem previsão de uma nova convocação. O período de inatividade, portanto, também deve ser irregular.

Do ponto de vista do empregador, são três indicativos que justificam a contratação de um empregado intermitente: oscilação de intensidade de trabalho (aumento de carga ou atividade pouco frequente), expertise diferenciada para tarefa ou evento específicos substituição temporária de empregado convencional.

O uso do empregado intermitente requer, por parte da empresa, a existência de uma demanda que sobrepõe a rotina operacional ordinária. Somente essa demanda diferenciada será capaz de justificar a contratação de uma pessoa por um período singular.

Entenda-se como demanda diferenciada não apenas no quesito quantidade/volume de operação, mas também na escassez de ação, ou seja, havendo um trabalho necessário, mas muito pouco utilizado, essa demanda também será entendida como fora do padrão e pode ser absorvida por um empregado intermitente.

Essa condição (demanda diferenciada) para esse tipo de regime contratual se justifica em razão da principal característica conceitual do trabalho intermitente, que é a alternância obrigatória de períodos ativos e inativos, ou seja, se há uma demanda ordinária, inserida no sistema operacional da empresa e que precisa ser cumprida rotineiramente, essa demanda deve ser executada por um empregado convencional e não pode ser suprida por empregado intermitente.

O balizador será, portanto, a quantidade de horas trabalhadas por mês no regime intermitente. Atingindo-se um número mínimo mensal rotineiro, estará subentendido que o contrato correto a ser utilizado será o de tempo parcial, ainda que em números menores do previsto no caput do artigo 58-A, da CLT, consoante previsão no parágrafo 4º do mesmo artigo, devendo ser descartado o trabalhador intermitente para tal atividade.

Para o empregador, a má utilização do trabalho intermitente pode gerar uma fiscalização e autuação da Superintendência do Trabalho ou o enfrentamento de um procedimento administrativo por parte do Ministério Público do Trabalho, principalmente se, na prática do dia a dia, for identificada uma precarização do trabalho ou a redução de custos e encargos de maneira ilícita.

Para suprir essa necessidade de mão de obra regular com um custo menor, caso a jornada de oito horas seja extensa, há duas alternativas: utilizar-se do contrato a tempo parcial para trabalho de 26h ou 30h por semana (lembrando que a carga horária semanal pode ser ainda menor e restrita a um ou dois dias na semana); firmar um acordo coletivo para regrar as condições específicas do trabalho intermitente, conferindo mais segurança jurídica.

Conclui-se, portanto, ser possível a implementação do trabalho intermitente em uma atividade rotineira desde que sobreposta por um dos três indicativos acima descritos, caso contrário, sua utilização poderá ser questionada.

Trabalho Intermitente e segurança jurídica: risco ou oportunidade?

Por Decio Sebastião Daidone Jr., advogado trabalhista, professor universitário, mestre em Direito do Trabalho e Processo do trabalho pela PUC/SP, sócio do Barcellos Tucunduva Advogados.

 

 

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