Lembro- me do impacto quando o professor Ritchie, da matéria de Comportamento Organizacional de meu MBA na Universidade de Brigham Young disse em classe: “Pobre do executivo cujo livro de cabeceira é um livro de negócios.”

Esta frase me fez pensar muito nos anos que se seguiram, lembrando o quanto já tinha lido em minha vida a respeito dos mais diversos assuntos e o quanto fui afortunado por ter pais que me ensinaram a importância da leitura desde a minha infância.

Seja qual for o campo de leitura, sempre nos trazem novas visões do mundo, seja em história, química, física, biologia, clássicos, ou qualquer outra área. Fornecem também “insights” que podem ser usados no campo profissional.

Por exemplo, gosto muito de história, biografias, e, em especial, livros sobre a Segunda Guerra Mundial, tanto do estudo das batalhas como das consequências geopolíticas que nos acompanham até hoje. Gostei tanto desse assunto, que acabei escrevendo e lançando um livro identificando competências que são usadas tanto nos campos de batalha, como em nossas carreiras.

Agora, um fato impressionante: é muito grande o número de executivos em posições de destaque e até CEO’s que não têm o hábito de leitura.

Leem muito sobre aquilo que precisam ler para o bom desempenho do trabalho, são geralmente muito bem-sucedidos, workaholics e têm a sua “cultura estreita” oculta pelo importante título em seu cartão de visita.

Geralmente as suas conversas giram em torno do esporte que dominam ou mais acompanham, dos assuntos políticos que dominam as mídias, os fatores econômicos que afetam seu mercado. Enfim, sabem de tudo que possa influenciar o seu trabalho. Isto não está errado, apenas não está completo.

Posso apresentar um mix de chefes que tive em minha carreira que exemplificam estes tipos que descrevi. Um deles lia as novidades de nossos produtos e de nosso mercado e era um exímio golfista… para fazer negócios. Nunca o vi conversar sobre qualquer outro assunto que não fosse negócios.

O outro, com estilo semelhante ao primeiro, nunca o vi com qualquer livro na mão e suas conversas versavam sempre sobre seu esporte preferido e era um exímio contador de piadas. Antes de ser o VP da América Latina, presidiu a operação do México e nunca falou espanhol dizendo que sua missão era “ensinar inglês aos mexicanos”.

Imagino o quanto ele perdeu no entendimento da cultura local!

Ambos os casos acima eram de altos executivos com excelentes resultados e uma cultura muito “estreita” e focada.

Dentre os superiores que muito me impressionaram e com os quais cresci como profissional e como pessoa, está um executivo italiano, mas que falava cinco línguas fluentemente. Os clientes o adoravam, pois quando os visitava falava dos mais variados assuntos ligados aos interesses pessoais dos clientes ou do país de origem dos mesmos.

Longas conversas de assuntos gerais e “sem importância” preparavam o caminho para a conversa final sobre negócios, quando o clima já era de amizade. A sua presença era de um “lorde inglês” transmitindo muito respeito e tinha uma capacidade fora do comum para entender as pessoas.

Um outro caso, foi de um VP para as Américas formado na Academia Militar de West Point, nos Estados Unidos. Em uma conversa de coquetel descobrimos o nosso gosto comum por leituras sobre a Segunda Guerra e passamos a trocar títulos.

Li vários livros recomendados por ele, incluindo publicações ainda não traduzidas para o português que muito inspiraram o meu livro. Aqui, a cultura comum abriu portas para uma amizade que perdura até hoje na contínua troca de indicações de títulos.

O único caso de um brasileiro foi de um empresário com amplos conhecimentos nos campos da filosofia, religiões, física quântica, astronomia e lia muito a respeito da natureza humana.

Este leque de conhecimento sempre gerava inúmeras conversas e considerações sob o prisma destas áreas, trazendo fundamentos filosóficos no dia a dia das decisões da companhia.

Olhando agora o passado e fazendo comparações de estilos, os três últimos tinham uma visão holística do mundo junto com uma profunda capacidade de entender as pessoas. Também com ótimos resultados nos negócios, porém tinham o respeito natural como líderes.

Por “coincidência”, os dois primeiros eram grandes “chefes”, com subordinados tendo sérios problemas de adaptação, se não pensassem como eles.

Estes não foram os únicos chefes de minha carreira, mas meus líderes já na fase madura de minha trilha profissional. Tive muitos outros e que posso claramente classificá-los em um destes dois grupos.

Isto me faz lembrar uma palestra de meu amigo Rafael Viñas, que foi um grande executivo do mercado financeiro, com longa carreira internacional no Citibank. Infelizmente já partiu prematuramente.

Falando a um grupo de jovens a respeito de carreira, aconselhou: “Preocupem-se com o que vocês querem SER e não apenas com o querem TER”.

Um instrutor de um curso a respeito de negócios com diferentes culturas internacionais nos disse: “Leia Dom Quixote ao lidar com espanhóis, Os Lusíadas ao tratar com portugueses, O Inferno de Dante ao dialogar com italianos, Guerra e Paz se fizer negócios com russos”. Uma grande mensagem!

Lembro-me de que na época em que eu tinha um contato muito próximo com a China, inclusive com várias viagens para aquele país, li um livro a respeito da história da China no século XX e também a biografia de Mao Tsé Tung.

Fiz grandes amizades lá, nos coquetéis e jantares, pois adquiri uma grande capacidade de empatia por aquele povo e o que levou a terem o papel que têm hoje no mundo.

Tenho a impressão de que grande parte dos executivos estão focados no TER, perdendo assim a vista de uma maravilhosa jornada por este incrível universo de conhecimento que os tornariam pessoas com uma cultura ampla, que fortemente influenciam o cotidiano da vida profissional. Pessoalmente nunca tive um livro de business em minha cabeceira.

Aquele momento foi sempre de aliviar o stress com as leituras que já citei, além daquelas que fortalecem meu lado espiritual.

Tudo, entretanto, começa com o mais simples: o hábito de leitura dos mais diversos temas, começando por assuntos que você mais gosta. Como todo novo hábito, se você ainda não o tem, é preciso forçar no início e garanto que você será “contaminado” por esta janela para um mundo maravilhoso.

A geração que hoje está na casa dos 40 anos e aquelas mais recentes que estão no mercado de trabalho, já cresceram com vários obstáculos para a leitura sadia: vídeo games, a amplitude do que se assiste na TV e mais recentemente as mídias sociais.

Tudo que é usado com equilíbrio não é nocivo, mas geralmente não é o caso.

No livro “Ensinamentos” de Gordon B. Hinckley” (pg.55) o autor diz “...Lamento a terrível perda de recursos intelectuais de pessoas…que devotam horas sem fim assistindo bobagens na televisão. Que coisa maravilhosa é, de outro modo, ser encontrado submerso(…) no mundo dos livros, onde se pode caminhar com os grandes pensadores de todos os tempos (…) George Wilhelm Friedrich Hegel uma vez fez uma declaração que dizia que aqueles que não lêem a respeito da história acabarão por repeti-la”.

Fica aqui um questionamento final:

O que você quer SER e se você se coloca na categoria daqueles com uma “cultura estreita” ou com uma “cultura ampla”.

Nunca é tarde para mudar!

Cultura “Ampla” versus Cultura “Estreita”Por Danilo Talanskas, autor do livro “Lições de Guerra – Vencendo as Batalhas de Sua Carreira“, foi o CEO de três multinacionais: GE Healthcare, Rockwell Automation e Elevadores Otis. Em paralelo à sua carreira como executivo, atuou como palestrante e professor em cursos de pós-graduação nas áreas de Estratégia, Ética e Negócios Internacionais. Nos últimos anos fez parte de conselhos de administração, conselhos consultivos e assessora empresas. É formado em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, com MBA pela Universidade de Brigham Young (EUA) e é mestre em Administração pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Atualmente assessora a Fernandez Mera Negócios Imobiliários Ltda.

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Capa: Deposithphotos