A primeira menção desse termo, Corpo Político, foi na Europa no século XV, usado em analogias feitas entre as doenças no corpo humano e suas equivalentes no campo político, que eram consideradas pragas ou infecções que poderiam ser tratadas com remédios milagrosos.
Usarei essa metáfora para o campo do trabalho, no mundo corporativo, no qual as algumas “doenças” são preconceitos, discriminação, racismo institucional e estrutural, como barreiras de entrada e de ascensão, dos corpos das populações minorizadas, que incrivelmente representam a maioria do povo brasileiro. São os grupos sociais historicamente excluídos do processo de garantia dos direitos básicos: Negros, Pessoas com Deficiência, LGBTQIA+,50+ e os financeiramente precarizados, entre outros.
Abordarei o tema considerando 2 tempos: Passado e Presente
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Passado
Eu sou um corpo político; meu corpo e minha cor sempre chegam primeiro aos ambientes em que transito. Aqui ressalto que é um corpo político que não exterioriza partidarismo, mas que materializa – valores.
A primeira experiência que me revelou que eu era uma mulher preta foi aos cinco anos de idade, no “Jardim de Infância” de uma escola particular, gerida por uma igreja católica, no Rio de Janeiro, cidade onde nasci.
Todos os dias meu corpo de criança sofria a agressão de um colega de turma, menino bem mais velho, que tinha prazer em puxar as minhas tranças, com toda a sua força, ao que o restante da turma achava graça. Uma menina preta usando longas tranças causava curiosidade. Aquelas crianças não sabiam, mas estavam materializando o que lhes era ensinado por seus ancestrais, que denominamos de Racismo Recreativo.
“O humor racista opera como uma espécie de pedagogia racial. É preciso dizer aos negros, que não podem demandar o mesmo nível de respeitabilidade social dos brancos. Piadas reforçam a ideia de que os não negros são superiores. O humor racista é estratégico, reproduz estereótipos que servem para legitimar estruturas de poder”. Dr. Adilson José Moreira . “Racismo Recreativo”.
Mas, em casa, sempre tive a autoestima mantida elevada, valorizada e a cada nova agressão, eu era ensinada a não revidar; eles eram muitos e maiores do que eu fisicamente e naquela época, não tínhamos a quem denunciar.
A estratégia que eu adotava era a do desempenho, que deveria ser cada vez melhor para avançar. Não me retirar dos lugares por mais inóspitos que fossem. E funcionou.
Solidão
A solidão durante os anos de escola tinha uma resposta: eu era a única preta nas turmas. Solidão a qual eu respondia com – desempenho acima da média.
E no trabalho, a pergunta: Mas… Jorgete é a Senhora? Ouvi isso por duas vezes, em empresas diferentes, ao que complementavam: porque aqui não temos negros!
Estereótipos têm uma força indescritível. Nutrem os preconceitos e se materializam pela discriminação. Algumas pessoas não admitem ver as pessoas “diferentes” em espaços nos quais lhes fora ensinado que seriam apenas reservados a elas a propriedade e direito de usufruir.
O estranhamento à presença de pessoas de grupos minorizados no espaço onde habita o poder vai desde a inaceitação às vestimentas, penteados, maquiagem até as maneiras de se expressar verbal ou corporalmente. Tudo pode causar estranhamento.
Algumas pessoas precisam colocar um rótulo para poder conviver com o diferente. Precisam que haja um cargo, uma relação com uma empresa, pois não imaginam que haja luz no fim do túnel e que pessoas de grupos minorizados, superem a todas as imposições do mercado e vençam. Precisam branquear as pessoas, aos seus olhos, reforçando com expressões racistas (negro de traços finos etc…)
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Presente
Eu vejo o presente repetir o passado!
Neste momento estamos assistindo a perseguição à criatividade, naturalidade, felicidade de Vini Jr, jogador de futebol, brasileiro jogando na Espanha, que teve um estádio de futebol repleto, em coro, chamando-o de macaco, o que foi repetido por Pedro Bravo, presidente da Associação de Empresário de Jogadores da Espanha, em um programa televisivo na Espanha. Ele depois se desculpou pelo uso de expressão com a palavra “macaco” durante programa.
Mas desculpa não apaga a dor, já dizia a minha sábia avó, Rosa Guilhermina Souza Anunciação, uma mulher preta, filha de escravizados.
Qual a aprendizagem que retiramos desses episódios?
Uma sugestão: retornem a leitura dessa matéria “Negros e Brancos, Juntos – e o aprendizado para 2021”
Por que? Porque acredito que estejamos passando por um momento de inflexão e diante da mudança expressa pelo crescente poder financeiro e intelectual dos negros, pessoas reagem com ódio, fincando os pés em seus espaços herdados, entrincheirando-se para impedir um avanço que é inexorável. Não há retorno.
Sigamos em frente. Você vem?
Por Jorgete Lemos, sócia fundadora da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços – Consultoria. É uma das Colunistas do RH Pra Você. O conteúdo desta coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.