No último domingo (8/1), o Brasil parou para acompanhar a invasão e a destruição dos prédios dos Três Poderes, em Brasília, consequências de atos antidemocráticos ocorridos na capital federal. Ao todo, mais de 1,5 mil pessoas foram detidas – sendo 600 delas já liberadas por “questões humanitárias”, em sua maioria idosos, mulheres e pessoas com problemas de saúde -, mas quem esteve presente no cenário de depredação pode enfrentar também uma outra punição: demissão por justa causa.

Segundo o advogado José Carlos Wahle, sócio da área trabalhista do Veirano Advogados, é necessário, porém, que o empregador reflita antes de dispensar um colaborador por justa causa em decorrência dos acontecimentos em questão. O especialista ressalta que, a priori, o que o empregado faz fora do ambiente de trabalho não diz respeito ao empregador.

“O empregador tem poder de orientar, de treinar, de disciplinar e de exigir conduta dentro do ambiente de trabalho, mas não deve interferir na vida privada do seu empregado”, comenta.

Ainda assim, Wahle salienta que, em caso da empresa identificar com absoluta segurança que seu colaborador ou colaboradora teve participação nos atos de vandalismo ou de invocação de golpe militar, deverá analisar a proporcionalidade da sua participação nos fatos.

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Palácio do Supremo Tribunal Federal destruído após atos antidemocráticos. Imagem: Valter Campanato/Agência Brasil

Uma vez identificada a efetiva participação do empregado em atos violentos e ilegais, dos quais possam decorrer a vinculação da imagem do empregador a tais ações, além de prejuízos à sua reputação, a rescisão do contrato por justa causa pode ser aplicada.

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Justa causa é, de fato, a melhor opção?

O advogado trabalhista Lucas de Souza, por sua vez, manifesta que, apesar de todo cidadão ter o direito de manifestação assegurado pela Constituição, a partir do momento que exista um crime configurado na prática, a organização pode optar por medidas mais drásticas em relação ao seu funcionário. Apesar disso, em sua visão, é mais seguro para o negócio pensar, primeiramente, em uma dispensa sem justa causa, caso a demissão esteja em pauta.

“Estamos falando de uma situação grave, mas que varia de acordo com algumas circunstâncias. Para que a justa causa seja aplicada sem que se torne uma dor de cabeça ao gestor, é importante que ele tenha provas bastante claras sobre a participação de seu colaborador nos atos antidemocráticos, além de avaliar o impacto que a imagem do mesmo pode causar ao negócio”, diz Souza. “Caso contrário, sem que tudo esteja bem documentado, o funcionário pode reverter judicialmente a dispensa”.

Assim como Souza, Wahle elucida que, para maior segurança por parte do empregador, a dispensa sem justa causa, que é um direito a ele estabelecido, é a mais recomendável, especialmente se não houver uma exposição direta do negócio.

É preciso ter cautela e avaliar se o funcionário de fato participou dos atos ou apenas estava ali como curioso”, explica. “Agora, se o ato que o empregado pratica é de uma natureza tão grave, que torna a convivência com os seus colegas ou a confiança do empregador impossível de manter, apesar de esses atos não resultarem em prejuízo ao empregador, é recomendável uma demissão sem justa causa”, diz Wahle. 

O advogado também explica que a falta no serviço por motivo de prisão não justifica a rescisão por justa causa com fundamento no abandono de emprego. “O abandono é uma conduta que depende da vontade do empregado. Porém, se ele for julgado culpado, deverá sim ser demitido por justa causa”, destaca. 

Por fim, Souza pontua que materiais divulgados na mídia ou postagens em redes sociais que provem a presença do colaborador nos atos pode contribuir para que o empregador tenha embasamento na ação da demissão por justa causa.

“Caso ela ocorra, o trabalhador perde direitos que integram um desligamento sem justa causa, como aviso prévio, possibilidade de saque do FGTS – e o recebimento da multa de 40% do mesmo -, seguro desemprego e os proporcionais de férias e 13º salário”, finaliza.

Por Bruno Piai

Crédito foto de capa: Valter Campanato/Agência Brasil