É chover no molhado enfatizar o quanto a relação entre trabalho e maternidade é, ainda, um grande tabu. Em 2021, tocamos na ferida ao abordar o tema em uma das matérias mais lidas da história do portal. Nela, a jovem Patrícia, à época operadora de caixa, compartilhou os problemas que teve na empresa após anunciar que seria mãe.

Diante do que enfrentou – confira aqui –, foi enfática ao dizer que, ao mesmo tempo em que a sociedade exige da mulher que ela assuma, querendo ou não, o papel de mãe em algum momento da sua vida, o mercado de trabalho pode ser um grande inimigo de quem leva tal plano adiante. 

Além de ser um dos posts mais lidos, foi também um dos – se não o mais – comentados em nossas redes sociais. E não foi ao empregador que considerável parte das opiniões mais críticas foi dirigida, o que não é uma surpresa pensando na nossa sociedade.

Fato é que, ao longo dos anos, a dinâmica profissional-maternal não evoluiu tanto quanto o esperado. Uma pesquisa recente, feita no ano passado pelo Empregos.com.br, revelou que mais da metade (56%) das mães respondentes já enfrentou uma demissão ou conhece alguém que foi desligada logo após o final da licença-maternidade.

Um cenário como este justifica o injustificável: marcas que fazem o mínimo – ou seja, não usam a maternidade como um critério para demitir suas colaboradoras (ou pelo menos algumas delas) – são praticamente cases de sucesso quando o assunto é diversidade.

Ao menos, felizmente, há os contextos nos quais as companhias vão além e, mais do que só cumprirem com a sua obrigação, realmente trabalham o exemplo, a valorização e a inspiração.

Caso que mostra isso é o da Bitso, que em 2021 contratou Beatriz Oliveira, hoje CMO da marca, prestes a dar à luz a gêmeos. No ano seguinte, na fase de questionamentos pós-puerpério, ela foi promovida, enquanto no ano passado, ao comemorar o primeiro ano dos filhos Matheus e Lucas, ela foi alçada ao seu atual cargo.

Quem nos conta um pouco da história é a própria Beatriz:

“O processo de contratação foi bem surpreendente para mim. Eu o fiz sem contar da minha gestação. Já havia sofrido perdas e estava bem no início da nova gravidez, ainda sem completar três meses. No final da seleção, com os três meses já superados, resolvi contar e pensei: ‘por causa disso, vão me tirar do processo’. E foi o contrário.

Quando comuniquei à recrutadora e expliquei por que não havia contado antes, a resposta dela foi: ‘mais um motivo para que a gente queira tê-la no time’. Ela conversou com o gestor, ele me ligou, me parabenizou e me deu toda a tranquilidade e segurança de que ficaria tudo bem [após oficializar a contratação].

Na licença-maternidade, eu estava muito focada nos meus filhos. Naquele momento decidi: ‘vou viver isso aqui e o que tiver que acontecer depois, vai acontecer’. Em um puerpério de gêmeos, então…

Depois [quando voltei], me veio a surpresa de ser valorizada e promovida. As expectativas foram completamente diferentes em relação ao que eu pensava que seria a realidade”.

Impacto emocional:

“Até hoje eu sinto muito o apoio [emocional]. A Bitso é muito verbal e clara sobre prioridades, valores da família, importância do indivíduo como um todo, sem que seja feita a divisão entre o profissional e o pessoal. Passei a gestão muito suportada e apoiada na gestão. Meu gestor, quando saí de licença, garantiu que meu emprego estava seguro. Isso foi verbalizado, não tratado com indícios. De novo, isso me deu muita liberdade de viver o momento [com meus filhos].

A Bitso é um dos melhores exemplos que temos [de cultura organizacional voltada ao apoio]. Até pelo fato de ter, também, licença-paternidade de quatro meses, o que equipara os homens e as mulheres. Há a tranquilidade da mulher sair de licença sabendo que seus colegas homens também sairão quando forem pais. Ela não deve nada pelo fato de se ausentar por quatro meses enquanto um colega sai por 20 dias.

Há aqui vários casos de líderes que viveram esse processo de maternidade com todo o apoio da empresa. No meu time, inclusive, mais homens do que mulheres saíram ou estão para sair de licença.”

Que inspire outras marcas:

“Gosto muito de contar essa história, tanto para as pessoas que chegam ao meu time quanto em meu círculo de amizade. Há muito esse mito da mulher ter que atrasar a maternidade para poder crescer na carreira.

Acabei sendo mãe um pouco mais velha, o que não necessariamente foi planejado, e numa fase em que eu já estava bem na carreira. Mas ainda assim, conto essa história para que saibam que o mercado está mudando e que, sim, existem empresas como a Bitso, que valorizam a maternidade. Quero que outras mulheres, inclusive àquelas mais novas do que eu, saibam que podem ter seus filhos e suas carreiras.”

Por Bruno Piai