O trabalho faz parte de nossas vidas desde que existimos como indivíduos – salvo raras exceções. Ensinamos para as crianças que os pais precisam trabalhar para sustentar a casa, que existem diversas profissões e, costumeiramente, perguntamos “o que você quer ser quando crescer?” nos referindo a qual trabalho desejam ter.
Na sociedade que construímos, o trabalho ocupa parte fundamental da estrutura de nossas vidas e impacta diretamente nossas relações familiares e pessoais. O conceito de “bem sucedido” passa, muitas vezes, diretamente sobre nossa posição e ascensão profissional. E é em busca desse sucesso que, na composição de nossos dias, acabamos passando mais tempo com colegas de escritório do que com aqueles que amamos mais profundamente.
Por ter tamanha importância, sempre me chama atenção a forma como nos relacionamos com o trabalho em si – não só com o que fazemos (que podemos amar ou não), mas também com o ambiente em que exercemos o nosso ofício e sobre como enxergamos que esse espaço de atuação deve e pode ser para fazer sentido que todos os dias o escolhamos.
Eu tenho por hábito conversar individualmente com membros dos diferentes times que compõem a empresa. Para mim é importante para manter o pulso da realidade do negócio, não me encastelar e conseguir enxergar a companhia sob a ótica de quem realmente a faz existir: as pessoas que trabalham comigo.
Quando implantamos a semana de quatro dias de trabalho na Vockan, os resultados positivos apareceram logo. Além de a produtividade ter crescido 23%, a sensação de felicidade dos colaboradores aumentou. Obviamente, eu queria ouvir dos participantes do projeto modelo o que eles estavam achando de ter finais de semana estendidos.
Em uma dessas conversas, veio a surpresa. Uma colaboradora que conheço há anos – extremamente competente e dedicada, que entende tudo de sua área – declarou, como se diz por aí, “na lata”: não gostei. “Como assim? Você não gostou de não ter que trabalhar às segundas-feiras?”, tentei confirmar se o que eu tinha entendido era real. Mas, era isso mesmo, ela não tinha gostado da experiência. Ela me contou que se sentia culpada pelo filho vê-la de folga e se preocupava com o exemplo que está dando ao não trabalhar em um dia útil.
A semana de quatro dias é uma disrupção de um modelo que vem sendo aplicado desde a década de 1920, quando o fordismo calcificou que deveríamos trabalhar cinco dos sete dias da semana. É um século de “tradição”, mas vale lembrar que antes disso a carga era de seis dias e foi a busca por aumentar a produtividade e reduzir as faltas que fez o industrial propor dois dias de descanso. 100 anos depois, estamos na mesma encruzilhada. Precisamos produzir mais e, ao mesmo tempo, preservar a saúde mental de nossos colaboradores.
Confesso que eu não esperava que alguém não se adaptasse a ter mais tempo livre e isso me fez refletir sobre o papel do trabalho em nossas vidas. Talvez, por trabalhar ser algo tão natural da vida, não olhemos para ele como objeto, isto é, como algo que pode ser alterado, melhorado e até largado.
Quantas vezes ouvimos que o importante é estar empregado, não importa onde? Trabalhar com propósito é lindo, até os boletos baterem na porta, certo? Eu concordo. Existem momentos pelos quais todos nós passamos, em que temos que aceitar o trabalho que está posto antes de dar o próximo passo. Mas o fato é que não podemos mais deixar que o limite da nossa saúde mental seja ultrapassado porque se sucumbirmos não haverá pelo quê trabalharmos.
Com o passar do tempo, a colaboradora que citei acima conseguiu ressignificar a experiência e me contou que estava plenamente adaptada. Eu espero que o exemplo que a semana de quatro dias possa proporcionar seja o do equilíbrio.
Não precisamos esperar a aposentadoria para viver a alegria de estarmos com nossas famílias. O trabalho não precisa sugar os melhores anos de nossas vidas. Esse novo modelo veio para ficar porque seremos empresas, pessoas e um mundo melhor a partir dele.
Por Fabrício Oliveira, CEO da Vockan. Com mais de 15 anos de carreira na QAD, o executivo foi responsável pela implementação de diversos projetos de ERP, contribuindo na reestruturação da área de serviços e na utilização de ferramentas de usabilidade global. Como Head de Operações, liderou os times de Vendas, Suporte e R&D no Brasil.
Ouça o RH Pra Você Cast, episódio 119, “Quintou: o que é preciso para termos uma semana de 4 dias de trabalho no Brasil?”. Em junho de 2022, milhares de profissionais do #Reino Unido ganharam um final de semana de três dias. O piloto, que durará seis meses, envolve 3.300 trabalhadores de 70 empresas que terão uma jornada de trabalho de quatro dias sem corte em seus salários. Por aqui, em terras brasileiras, algumas empresas já demonstraram interesse no modelo. Será que temos maturidade para aderir a semana de 4 dias? Aos interessados, como se planejar para isso? Como equilibrar #produtividade e #flexibilidade? Nesse episódio, Daniel Consani, CEO do Grupo TopRH, e Gabriela Ferigato, editora do RH Pra Você, conversaram com Lucas Freire, psicólogo organizacional e especialista em felicidade no trabalho, sobre o assunto. Acompanhe com a gente!
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