A Lei de Cotas completa 10 anos e qual sua influência no Mercado de Trabalho?
No próximo dia 29 de agosto, a lei de cotas completa 10 anos. Este texto traz a minha reflexão em relação à formação universitária de pessoas de grupos minorizados e os efeitos disso no acesso de oportunidades no mercado de trabalho.
A lei de cotas determina que as universidades públicas e institutos federais devem reservar metade de suas vagas para alunos que fizeram todo o nível médio em escolas públicas e com renda familiar de até um salário-mínimo e meio. Destas vagas, metade é destinada a negros, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na proporção em que essa parcela da população está representada no estado onde se localiza a instituição.
Lembro quando eu entrei na universidade na época não existia a lei de cotas, estudei a vida toda em escola pública, mas a possibilidade de eliminar o gap do ensino público em relação ao particular veio por meio de uma bolsa de estudos que consegui em um cursinho na minha cidade.
É muito importante entender que existe uma discrepância enorme entre as instituições de ensino públicas e privadas, além das dificuldades sociais e econômicas que se somam a isso. Por isso, as cotas atuam como um mecanismo de incluir pessoas que ficariam de fora se nada fosse feito. E isso pode ser observado nos números, entre 2010 e 2019 um crescimento de quase 400% no número de alunos negros e negras no ensino superior.
Sem contar que o ensino superior é muito importante como um requisito para formação de profissionais para atuarem em diferentes setores da economia.
Mas será que o mercado de trabalho reflete esta evolução? Tivemos um crescimento de pessoas negras em posições que exigem um nível maior de escolaridades e que representam cargos com salários maiores?
A resposta é não.
Nas empresas brasileiras, menos de 30% dos cargos de liderança são ocupados por pessoas negras, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os negros representam 55,9% da população brasileira, mas ocupam apenas 4,7% dos cargos de liderança nas 500 maiores empresas do país, segundo pesquisa do Instituto Ethos.
E quando as empresas possuem pessoas pretas ou pardas nas suas estruturas, observamos que estão concentradas em posições operacionais e não de gestão que exigem o curso superior.
Ainda é comum ouvir das pessoas responsáveis pela seleção e contratação dizerem que não encontram pessoas negras qualificadas para as suas vagas.
Na verdade, falta de mão-de-obra é um gargalo no mercado de trabalho há anos e as organizações têm se estruturado para treinar e desenvolver as pessoas dentro da própria empresa como forma de superar este gap. Então por que não treinar e capacitar pessoas negras ou pessoas com deficiência?
O meu ponto nesta reflexão é: a lei de cotas tem cumprido seu papel referente ao acesso das pessoas pobres, negras, indígenas e com deficiência ao ensino superior, por outro lado, as empresas precisam permitir o acesso destas pessoas nas suas estruturas e garantir que tenham crescimento nas suas carreiras.
Ações afirmativas nas empresas devem promover o acesso e garantir a inclusão.
Por exemplo, um programa de estágio para pessoas negras garante o acesso, mas é a cultura e a liderança inclusivas que permitirão que estes estagiários sejam os líderes do futuro nesta mesma empresa.
Quando as iniciativas públicas e privadas convergem seus interesses existe uma enorme potência de transformação social e econômica.
Por Vanessa Lemos, CEO da DiversasHub. Em 2015, sua trajetória profissional ganha destaque ao criar um Programa para contratação de pessoas acima de 45 anos, na empresa Allianz Partners. Em 2007 criou o programa de contratação de pessoas com deficiência visual, atingindo 77 colaboradores na empresa. É professora convidada de Pós-Graduação em Psicologia do Trabalho, disciplina Ética e Responsabilidade Social nas Organização e Avaliação de Pessoas, Universidade Presbiteriana Mackenzie.
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