De acordo com a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do IBGE, o atual índice de desemprego no Brasil está na casa dos 9,8%. Apesar do registro indicar que o país vem se recuperando do cenário da pandemia da Covid-19 – com, inclusive, número recorde de pessoas ocupadas desde o início da série histórica, em 2012 -, mais de 10,6 milhões ainda sofrem com a desocupação, o que representa um terreno fértil para a aplicação do golpe do emprego falso.
Segundo levantamento realizado pela OLX, de janeiro a maio de 2022, cerca de 29 mil pessoas foram vítimas de oportunidades falsas de emprego a cada mês. As tentativas, por sua vez, atingem três a cada quatro candidatos, diz relatório da Heach, consultoria de Recursos Humanos.
Alerta de golpe
Afonso Morais, CEO da Morais Advogados Associados e especialista em recuperação de crédito e fraudes digitais, destaca que o período pandêmico foi um facilitador para a aplicação dos golpes, especialmente pelo cenário de incerteza econômica vivido pelo país. No entanto, o executivo deixa claro que não são somente pessoas desempregadas que se tornam alvo dos golpistas. Promessas de renda complementar para quem está empregado também ganharam força.
“As propostas sempre parecem reais e irrecusáveis em termos de salário e benefícios. A vítima começa a fazer a seleção e, antes de assumir a vaga, é informada pela recrutadora, por meio de mensagens de texto, que precisa efetuar uma transferência como garantia da vaga”, detalha o advogado.
Morais salienta que anúncios em sites (o que inclui portais conhecidos), e-mails, redes sociais e aplicativos de conversa costumam ser as principais portas de entrada para o golpe do emprego falso. Além das promessas de ganhos fáceis, as mensagens fazem o uso indevido de nome de empresas verdadeiras e sérias, para passar uma falsa credibilidade.
Alguns se apresentam como gerentes ou supervisores. Fazem isso para gerar autoridade e dar uma falsa segurança ao que estão oferecendo. As mensagens que circulam no WhatsApp ou no Telegram, por exemplo, variam, mas de forma geral tem o mesmo objetivo e propostas parecidas.
“A porta de entrada é uma mensagem oferecendo as vagas. A prática e a forma como o golpe é aplicado pode variar muito, então tenha sempre muito cuidado. O natural é que as empresas recebam currículos e não o contrário, essa abordagem a números desconhecidos não acontece”, elucida Amador Gonçalves, especialista de segurança da plataforma Site Confiável.
Um outro levantamento, realizado pela PSafe, empresa de segurança em tecnologia, identificou que, entre setembro do ano passado e fevereiro de 2022, mais de 608 mil tentativas de golpes de emprego falso foram aplicadas. Além do dinheiro tirado da vítima – que normalmente não tem mais retorno do “recrutador” após transferir o valor -, clicar em links maliciosos pode culminar em outros sérios problemas aos profissionais enganados, como roubo de dados e acesso a informações pessoais privadas.
Atividades dos golpistas chegam ao LinkedIn
Uma vez que a atividade criminal envolve ofertas fakes de trabalho, é natural que no LinkedIn, a maior rede social profissional do mundo, as ações dos golpistas estejam presentes.
“Embora todas as plataformas de mídia social possam ser um vetor para fraudes, uma coisa que torna o LinkedIn especial é a percepção pública de um ambiente profissional seguro. Neste sentido, os golpes no LinkedIn continuam a prosperar e dispararam nos últimos meses. Enquanto alguns golpistas podem fazer muito sucesso com truques muito simples e antigos, como solicitar seus dados bancários ou adiantamentos em troca de uma entrevista de emprego aparentemente legítima, outros podem ser muito sofisticados”, diz Camilo Gutiérrez Amaya, chefe do Laboratório de Pesquisa da ESET América Latina.
Só em fevereiro os casos de phishing – que, em poucas palavras, são comunicações de fontes falsas, mas que parecem chegar de lugares confiáveis – cresceram em 232% na plataforma. As vagas falsas, por exemplo, costumam chegar inesperadamente, com salários acima da média e menores exigências, o que motiva quem as recebe a pedir mais informações.
O mesmo vale para golpes de pirâmide, que encontraram no LinkedIn um espaço para se difundir. um caso conhecido é o de um consultor financeiro aparentemente legítimo que entra em contato por mensagem direta oferecendo um programa de investimento atraente que promete dinheiro fácil, algo de interesse para qualquer pessoa em dificuldade financeira ou para quem confia que vai ficar rico no campo das criptomoedas.
Propostas como essas costumam ser “boas demais para ser verdade”, e geralmente a mensagem direta enviada pelo LinkedIn vem acompanhada de um link para uma página bem elaborada que endossa a proposta e inclui muitas resenhas de novos milionários contando sua história. Leva apenas alguns cliques e um investimento inicial para participar, explicam os golpistas. E para que pareça seguro e protegido, todas as transações ocorrem dentro do mesmo site. Mas uma vez que a transferência é feita, o dinheiro é perdido.
“Qualquer um de nós pode ser vítima de um golpe. Estar ciente disso é, de fato, o primeiro passo para se proteger dos golpistas, seja no LinkedIn ou em qualquer outro lugar”, diz Gutiérrez Amaya.
Apesar do desespero, atenção não pode ser perdida
Para o consultor de RH, Flávio Cabral, em hipótese alguma a vítima pode ser culpabilizada pelos golpes. “Você está desempregado, precisa pagar as contas, alimentar sua família, se recolocar no mercado. Conforme o tempo passa e o contexto não muda, é natural que você encare riscos maiores. É fácil exigir que as pessoas façam análises frias se eu não estou sentindo na pele o desespero delas”, pontua. Entretanto, alguns sinais podem ser previamente identificados para que haja uma desconfiança por trás de certas ofertas.
Assim como o pedido por depósitos dá o tom de que há algo suspeito, é importante o profissional ter cautela sobre a abordagem recebida. “Somente responda a anúncios de empresas que estão recrutando diretamente ou caso de uma empresa recrutadora confirme a sua idoneidade, podendo usar o Reclame Aqui ou SERASA. Também pode ser interessante solicitar contrato entre a recrutadora e a empresa que vai contratar”, alerta Afonso Morais.
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Outros pontos importantes são ver se a vaga realmente existe e ligar o alerta para qualquer valor pedido para obtenção de emprego. Quem deve pagar pelo recrutamento normalmente é a empresa que vai contratar o empregado. “Peça também a um amigo ou parente para te ajudar a analisar se a informação é verdadeira. Alguém de fora pode te ajudar a pensar melhor, pois não tem vínculo emocional com a oferta de emprego”, orienta Gonçalves.
Por fim, Amaya recomenda que as fraudes sejam sempre denunciadas – as redes sociais costumam ter canais específicos para isso – e que informações como número de documentos ou cartões jamais devem ser compartilhados. “Os recrutadores não solicitam dados bancários e nem depositam o salário utilizando essas informações antes do início efetivo do trabalho”, finaliza.
Por Bruno Piai