Há várias notícias de fim do teletrabalho, muitas com justificativas de perda de produtividade, perda de cultura da empresa, controle excessivo dos gestores… e por aí vai.
“No exterior, o movimento é liderado pelas big techs. Recentemente, Mark Zuckerberg movimentou as redes sociais com um post sobre o futuro da Meta, conglomerado que abarca companhias de tecnologia como o Facebook – que fundou em 2004 -, Instagram e Whatsapp. No texto, ele elencou os objetivos para 2023, em uma espécie de “carta aberta” aos funcionários, e explicou quais caminhos deverão ser tomados para uma guinada “mais eficiente”, nas palavras do executivo.”[1]
“Outro exemplo veio do mercado financeiro. O JP Morgan anunciou na quarta-feira, 12, que orientou seus diretores administrativos a trabalhem todos os cinco dias úteis da semana no escritório. Com isso, o banco encerra oficialmente o modelo híbrido de trabalho para os executivos administrativos, adotado pela instituição ao longo da pandemia de covid.”[2]
Por outro lado, o fim do teletrabalho não atinge tantas pessoas assim, afinal, somente *** das funções pode ser exercida remotamente. A imensa maioria de pessoas em teletrabalho têm curso superior[3] O potencial de trabalho remoto seria de 25,5% dos trabalhadores brasileiros, mas somente 10% deles, mesmo na pandemia exerceram o trabalho remoto[4].
Passando das estatísticas, ou seja, estamos falando da minoria dos trabalhadores, apesar do barulho na imprensa, será que a motivação é mesmo só o “controle”, “produtividade”? Ou há algo mais no “reino da Dinamarca”?
Não há nas reportagens, envolvendo, por exemplo, os riscos em matéria de segurança e saúde ocupacional, que, na minha experiência, tem sido um dos maiores questionamentos das empresas.
A CLT estabelece que o empregador deve orientar o empregado sobre o trabalho em condições seguras de trabalho (art 75-E), por outro lado, pela lei previdenciária considera como acidente de trabalho típico (art. 19 lei 8213/91):
“Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”
E o parágrafo primeiro desse artigo diz que o empregador “é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador. “
Além disso, a mesma lei trata da doença profissional (ligada a uma função específica) ou do trabalho (ligada a condições de trabalho) – art. 20 da lei 8213/91.
Portanto, de maneira objetiva, o empregador é considerado responsável pelas condições seguras de trabalho, e haverá acidente do trabalho ou doença do trabalho ou profissional se as condições da lei previdenciária estiverem presentes. Assim, não vale apenas a lei trabalhista, mais “branda” em termos de orientação, porque a lei previdenciária se aplica.
Assim, as empresas devem, além de olhar para cultura, controle do trabalho, para essa questão da segurança do trabalho, que é um tema bem difícil de lidar porque envolve a residência do empregado, ou, ainda qualquer lugar em que ele esteja, já que teletrabalho não é necessariamente, home office.
Lembrando que os empregados em teletrabalho não estão mais isentos de marcar o ponto, e o sistema eletrônico deve ser, ou aprovado por sindicato em acordo ou convenção coletiva, o REP-A, ou o modelo REP-P com as regras técnicas legais.
Portanto, é um assunto que exige atenção e análise, e talvez não seja só o “controle do chefe” que esteja gerando essa volta ao presencial, mas toda essa necessidade de cuidados legais.
Se a questão for cultural ou querer-se um maior controle, vale analisar a necessidade de um treinamento e adequação das políticas, reuniões presencias para preservar a cultura, bem como ferramentas de mediação de produtividade sem que se entre na será de um assédio moral…
Mas as empresas devem analisar tudo com cuidado, para criar uma política que atenda às necessidades dela e dos empregados.
[1] https://www.terra.com.br/noticias/educacao/carreira/o-home-office-vai-acabar-no-pos-pandemia-empresas-comecam-a-questionar-modelo,0e6433e13e1635fd8c4403247a495c64iyz1e4j9.html (abril 2023)
[2] Idem
[3] https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/11730/1/TD_2830_web.pdf
[4] https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/no-brasil-home-office-foi-realidade-para-poucos/
Maria Lucia Benhame, advogada e sócia do escritório Benhame Sociedade de Advogados, especialista em gestão trabalhista. É uma das colunistas do RH Pra Você. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.