O Boston Consulting Group lançou um novo estudo, em parceria com a Harvard Business Review, em que relata a experiência de pessoas trans e de gênero não-conformista (GNC) no ambiente de trabalho. Na pesquisa, realizada com mais de 2,2 mil profissionais, o BCG aponta que mais de 40% dos respondentes já sofreram com algum tipo de assédio sexual ou má conduta de colegas nas empresas onde trabalham – 59% dos brasileiros entrevistados afirmaram vivenciar esse tipo de comportamento de forma rotineira.
A pesquisa ouviu profissionais brasileiros e de outros países como Alemanha, Austrália, Estados Unidos, França, Índia, México e Reino Unido, focando em pessoas trans, que não se identificam com o gênero que lhes foi designado ao nascimento, e pessoas de gênero não-conformista, que não se limitam ou não se encaixam nas normas de gênero culturalmente tradicionais.
Quando questionados se são assumidos no trabalho, menos de um terço dos respondentes disse sim, mas o resultado foi diferente no Brasil: 43% dos profissionais brasileiros responderam ser abertamente trans ou GNC no ambiente profissional, 14 pontos percentuais acima da média global. Ainda assim, no Brasil, 55% se sentem desencorajados a mostrar a sua verdadeira identidade de gênero.
Segundo o BCG, a principal razão para os profissionais se manterem “no armário” é a vontade de manter separada a vida profissional da vida pessoal. Ainda existem preocupações com as reações de clientes e colegas, além do receio de que a informação prejudique o avançar da carreira.
Por outro lado, trabalhadores assumidos o fizeram para que pudessem ser seu autêntico “eu” também no ambiente profissional. Outra motivação foi estar em um ambiente corporativo inclusivo, o que os deu segurança para se identificarem como pessoas trans ou GNC no trabalho.
“Mais do que tratar pessoas trans e de gênero não-conformista com respeito e dignidade, por ser a coisa moralmente certa a se fazer, é importante entender que um ambiente inclusivo é benéfico para todos – inclusive para os negócios. Colaboradores mais engajados são mais produtivos e inovadores, o que impacta no sucesso das empresas”, afirma Fleuri Arruda, sócio do BCG.
Um ponto de atenção revelado pela pesquisa do BCG mostra que a relação do departamento de recursos humanos com os colaboradores precisa melhorar: entrevistados dos oito países se mostraram desconfortáveis em se assumir para as equipes de RH. No Brasil, a área só perde para a dificuldade e receio dos colaboradores em se abrirem para seus líderes diretos.
“Este dado é relevante, pois o RH é um dos principais responsáveis por manter um ambiente profissional seguro, acolhedor e inclusivo. Além disso, gerentes e diretores são diretamente responsáveis pela experiência de seus times e por zelar por uma cultura inclusiva de fato, livre de ações ou comentários prejudiciais. É difícil imaginar um caminho inclusivo sem o apoio dessas duas frentes”, diz Arruda.
Ainda em processos de RH, mais da metade dos respondentes dos oito países já interrompeu um processo seletivo, declinou uma oferta de trabalho ou deixou a empresa onde trabalhava pela percepção de uma cultura não inclusiva no ambiente corporativo. No Brasil, 62% dos respondentes escolheram não aplicar para uma vaga, e 47% escolheram sair do emprego em que estavam por falta de políticas de inclusão, impactando a atração e retenção de talentos diversos.
Veja mais: O mercado é efetivo na promoção de ações de visibilidade trans?
Criando um ambiente para todos
O estudo identifica três grupos como os principais responsáveis para fazer a diferença no ambiente de trabalho, pois podem determinar as expectativas a respeito do comportamento e da forma como os colegas trans ou GNC são tratados e acolhidos:
Alta liderança: em empresas onde líderes sêniores estão comprometidos com diversidade, equidade e inclusão, 84% dos funcionários se sentem valorizados e respeitados, versus 44% em empresas onde a liderança não se compromete. A alta liderança da empresa precisa estar envolvida e criar ações tangíveis para esse público, incluindo políticas internas, treinamento para colaboradores e adaptações no ambiente de trabalho, mostrando claramente a preocupação pelo bem-estar de todos.
Recursos humanos: é importante que o RH garanta que funcionários trans e GNC sintam segurança física e psicológica, livres de assédios e hostilidade de outras pessoas. Oferecer acesso ao desenvolvimento pessoal e profissional de forma equitativa também pode ajudar, como licença parental independente do gênero.
Ainda, o BCG destaca que treinamentos de sensibilização para todos os funcionários têm um grande valor: todos devem saber respeitar pronomes e reconhecer preconceitos e vieses inconscientes. “Trabalhar no letramento dos colaboradores é importante para combater e mitigar atitudes enviesadas”, pontua o executivo.
Gerentes diretos: são os responsáveis pela experiência diária dos colaboradores e devem ser os principais defensores da inclusão. Funcionários da maioria das regiões entrevistados pelo BCG se mostraram relutantes em se assumirem aos seus gerentes por receio de que isso afete sua carreira de alguma forma, por isso é papel desses líderes promover e garantir uma cultura inclusiva dentro de suas equipes.
“Um ambiente inclusivo é parte significativa de um bom programa de diversidade, equidade e inclusão, e isso depende de diversos players dentro de uma organização. O sucesso, aqui, é medido pela satisfação dos colaboradores, que precisa ser priorizada para manter o desempenho, engajamento e motivação de todos”, finaliza Arruda.
O estudo completo do BCG está disponível, em inglês, no link.
Por Redação