Em busca do “elo perdido”: equipes inclusivas como parte essencial de organizações inclusivasO que vem imediatamente à sua cabeça quando ouve o termo “organizações inclusivas”?

Provavelmente você pensa em organizações que adotam práticas de diversidade e estimulam de forma sistemática a construção de um ambiente inclusivo. Por exemplo, aquelas que expressam publicamente valores pró-diversidade e inclusão, que definem uma estratégia com metas ambiciosas nessa área, que promovem treinamentos e desenvolvimento de pessoas nessa área ou que favorecem fornecedores que comprovem ter políticas de diversidade e inclusão. 

De fato, é comum entendermos como organização inclusiva aquelas empresas que implementam ações e iniciativas top-down, definidas no nível estratégico da organização e disseminadas para os demais níveis da estrutura organizacional.

Mas, a pesquisa acadêmica sugere que a jornada da inclusão precisa conectar a estratégia, que “pertence” ao RH ou à presidência, e se transforma em práticas top-down aplicadas a toda organização e com o requisito da conformidade, com movimentos bottom-up, que são de “propriedade” das equipes, e envolve a influência recíproca e voluntária, por meio de comportamentos inclusivos exibidos pelos seus membros e direcionados aos colegas de trabalho.

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Fazendo um paralelo com o princípio do Yin Yang da filosofia chinesa, essas são abordagens opostas e complementares e reside nessa complementariedade a manutenção e essência do movimento que leva ao avanço. Entretanto, o lado bottom-up da inclusão tem ficado relativamente esquecido. Ir em busca desse “elo perdido” é importante para se avançar na agenda de inclusão nos ambientes organizacionais. 

Iniciativas bottom-up de inclusão surgem primordialmente no contexto de equipes inclusivas. Vale ressaltar que equipes inclusivas são diferentes de equipes diversas. Essas últimas são aquelas formadas por membros de diferentes grupos de diversidade, enquanto equipes inclusivas são entendidas como aquelas que gerenciam a diversidade de forma ativa e produtiva, ou seja, uma equipe que tem por hábito adotar comportamentos de inclusão.

Isso se dá, por exemplo, quando a equipe estabelece diretrizes sobre como lidar com microagressões ocorridas no âmbito da equipe ou define como regra a nomeação de membros para agirem como “advogados do diabo” em reuniões internas para garantir que opiniões diversas sejam ouvidas.

Membros de equipes se envolvem em conversas francas e sinceras sobre preconceito e discriminação e dão feedback uns aos outros. Embora estejamos falando de comportamentos que surgem “de baixo para cima” e, portanto, se mostram a priori independentes da organização, essas podem, especialmente por intermédio das lideranças, criar condições que favoreçam a emergência desses comportamentos inclusivos e a formação de equipes inclusivas.

Mas como?

Para responder essa pergunta é necessário recorrer às pesquisas acadêmicas desenvolvidas pelo psicólogo Albert Bandura. Bandura buscou em seus estudos explicar como o comportamento humano – e aqui se inclui qualquer tipo de comportamento, incluindo o comportamento inclusivo – é aprendido a partir de indivíduos que são vistos como modelos (“role models”).

Em um estudo hoje considerado o clássico da abordagem proposta por Bandura, denominada teoria da aprendizagem social, ele e seus colegas confirmaram suas hipóteses modelando o comportamento agressivo versus não agressivo de crianças do berçário da Universidade de Stanford.

Crianças que observaram um adulto (o modelo) jogar, chutar e bater com uma marreta em um boneco inflável tiveram uma probabilidade significativamente maior de fazer o mesmo do que as crianças que observaram o adulto brincar silenciosamente com brinquedos.

Embora estudos posteriores tenham evidenciado circunstâncias específicas que podem neutralizar ou mesmo reverter o efeito dessa aprendizagem social, permanece válida a ideia de que comportamentos podem ser aprendidos por meio da observação de algum “modelo”.

Isso significa que, uma vez que os líderes são, em certa medida, os modelos e referências que funcionários têm para aprender os padrões de conduta, seus comportamentos e ações podem ser observados e replicados quer por meio da experiência direta ou pela observação indireta da interação desse líder com outros empregados.

Ou seja, no âmbito das equipes, é possível que os líderes sejam capazes de “modelar” comportamentos inclusivos se estes forem exibidos por ele próprio no dia a dia da equipe. Ou seja, aquela máxima “lidere pelo exemplo” não só é verdade, como no contexto da inclusão poderia ser especificada como “lidere pela inclusão”.

E quais comportamentos fazem parte de uma “liderança pela inclusão” e poderiam ser “modelados” pelos líderes. Existem vários comportamentos que são entendidos como inclusivos e aqui elenco três exemplos:

  • Substituir do vocabulário termos discriminatórios

Muitas expressões da língua portuguesa carregam conotações depreciativas, discriminatórias e reforçam estereótipos e por isso devem ser retiradas do vocabulário. Por exemplo, a palavra “lista negra” é frequentemente usada para descrever pessoas que, por alguma razão negativa, estão excluídas de alguma coisa. Ou seja, essa expressão faz uma associação da palavra “negra” a algo negativo. Veja aqui uma lista de palavras que devem ser substituídas.

  • Dar espaço e incentivar as celebrações de grupos diferentes

Uma equipe diversa é composta por pessoas que celebram diferentes festividades, sejam elas religiosas (por exemplo, o Rosh Hashaná, ano novo judaico) ou históricas (como o dia orgulho gay ou da consciência negra). Permitir que outras pessoas celebrem essas ocasiões e participar de eventos organizados é uma ótima maneira de reconhecer o individualismo e incentivar que todos também ajam assim. Celebrar essas ocasiões junto com todos os membros da equipe vai sinalizar para todos da equipe que as diferenças devem ser aceitas e respeitadas.

  • Reconhecer as condições particulares e interesses individuais

Ao organizar atividades, leve em consideração as diferentes condições de cada membro da equipe e respeite as suas características e interesses. Por exemplo, se todo evento social for beber em um bar à noite em uma zona privilegiada, isso pode impedir a participação de mães e pais, pessoas de condições menos favorecidas, funcionários remotos ou pessoas que não bebem álcool.

Nesse caso, considere propor atividades das mais diversas possíveis, como bate-papos virtuais, trabalho voluntário e jogos online.

Garantir que todos participem do maior número possível de atividades da equipe ajudará o grupo a melhor se relacionar.

Equipes inclusivas como parte essencial de organizações inclusivas

Por Liliane Furtado, mestre e doutora em Administração pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (EBAPE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Leciona as disciplinas Comportamento Organizacional, Tópicos atuais em Liderança e Metodologia de Pesquisa nos cursos Graduação e Mestrado do Instituto COPPEAD de Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde desenvolve pesquisas sobre liderança, diversidade e inclusão. É também bolsista Jovem Cientista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ. Atua como palestrante na área de liderança em eventos científicos e empresariais.

Ouça o episódio 143 do RH Pra Você Cast, “Inclusão 50+, bom para o presente e para o futuro (de todos nós)“. Como você se enxerga daqui a cinco ou dez anos? O questionamento, que já deve ter sido feito a muitos de vocês durante algum processo seletivo ao longo da carreira, nem sempre traz consigo uma resposta fácil. Especialmente para um público que, diante de tantos estereótipos e preconceitos, sequer sabe como será o dia de amanhã em sua vida profissional. A cada nova geração que entra no mercado, uma anterior se vê diante do dilema de ficar para trás e ver cada vez menos portas se abrirem.

O panorama, todavia, não só precisa como deve ser mudado. Pesquisas revelam que o tão falado “choque geracional” é extremamente benéfico não só a profissionais de todas as idades, mas também às empresas. E, afinal, se não olharmos para o público 50+ com atenção, como será quando chegar a nossa vez de lutar por espaço com os mais jovens? Para falar sobre as vantagens de mesclar gerações e como desenvolver mecanismos de inclusão, o RH Pra Você Cast traz Mórris Litvak, Fundador e CEO da Maturi. Confira o papo clicando no app abaixo:

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