Conquistar uma promoção no trabalho é um objetivo almejado por muitos profissionais. De acordo com uma pesquisa realizada pela 7 Waves, na lista de desejo dos brasileiros, 54,2% tinham como principal objetivo, em 2021, serem promovidos.

“Às vezes a oportunidade está à nossa frente e simplesmente estamos tão presos à rotina que não vemos o que podemos fazer de melhor para galgar um novo cargo e /ou mudar de função dentro da própria empresa. Conversar com o gestor e entender o momento que a empresa está pode abrir várias portas para o colaborador”, explica Leandro Rampazzo, especialista em carreiras da Godiva Propaganda.

No entanto, apesar de não parecer tão comum, conseguir uma promoção ou alcançar um cargo de liderança é uma realização que nem todos os profissionais buscam, seja pelo momento que vivem – por não se sentirem ainda prontos para liderar um time ou para assumir mais responsabilidades – ou por não acreditarem que seu perfil se encaixa com a oportunidade oferecida de crescimento. Este lado da moeda, que dificilmente você verá tão exposto no LinkedIn quanto os anúncios de conquista de promoção, ainda traz consigo alguns estigmas.

Promoção? Aqui, não!

Depois de recusar três promoções, a especialista em finanças Luana Ferreira, 31, finalmente disse “sim” ao seu chefe para uma oferta que a tiraria do cargo de analista e a tornaria supervisora.

Durante os dois primeiros dos três anos em que fez parte do quadro de funcionários de uma empresa de logística do interior de São Paulo, a jovem negou oportunidades de subir de função, pois “não sentia que estava pronta para comandar um time, afinal o meu trabalho era praticamente todo operacional e abaixo de mim estavam apenas duas assistentes, enquanto como supervisora eu ficaria responsável por mais pessoas e por mais de um setor”. A mudança de decisão ocorreu quando a companhia promoveu alterações no quadro de gestão, mas não foi necessariamente uma escolha que Luana teve em mãos.

“Quando eu dizia que não queria ser promovida, a coordenadora da área demonstrava compreensão. Ela me dizia que eu deveria buscar algum curso de liderança ou alguma especialização para lidar com os pontos que eu não me sentia confortável e que as portas não se fechariam. Com as mudanças que a empresa promoveu, um novo coordenador assumiu e meu nome já havia sido recomendado à promoção, mas ele não sabia que eu tinha negado anteriormente. Quando ele fez a oferta e eu disse ‘não’, ele reagiu dizendo que não trabalha com pessoas acomodadas e presas na zona de conforto. Me deu um dia para escolher se eu queria ser supervisora ou ex-funcionária”, relata.

Encurralada, Luana aceitou a vaga e diz que levou alguns meses para se adaptar, de fato, ao novo ritmo. “Busquei apoio e fui fazer um curso para liderança. Estava muito insegura e sentia que não ia dar conta. Me achava nova – 26 anos, na época – e incapaz de comandar um time e fazer com que as pessoas se motivassem, conseguissem entregar bons resultados. Fiquei um ano na função e, honestamente, não acho que fui mal, pelo contrário, mas demorei para ficar à vontade. Tive que lidar com uma forte ansiedade”, explica.

A especialista financeira, hoje, está fora do mercado pois optou por se dedicar a cuidar da filha, que está prestes a completar 2 anos. Entretanto, já planeja o seu retorno. “No segundo semestre deste ano quero voltar a trabalhar. Se operacional ou como líder, ainda não sei, mas posso garantir que, hoje, estou muito mais preparada do que naquela época para liderar pessoas”.

Para a psicóloga e especialista em Gestão de Pessoas, Bárbara Lima, é preciso ter muito cuidado com o tabu que se criou por trás do não aceite a eventuais ofertas de promoção. Ela explica que a resposta negativa não representa acomodação ou falta de ambição, mas um contexto que pode ser de insegurança, falta de preparação ou simplesmente busca por objetivos diferentes daquele proposto.

“Se criou um estigma perigoso que é dizer que quem recusa uma promoção fecha as portas para o mercado de trabalho, fica ‘queimado’, se torna mal visto. Vejo muitos especialistas defenderem tal visão e isso me preocupa muito. A recusa pode ser por conta de questões pessoais, por falta de treinamento, por ser uma oportunidade que se distancia das ambições atuais do colaborador, etc.”, salienta a psicóloga, que deixa claro que é preciso compreensão para entender por que, afinal, a chance de subir de cargo está sendo passada.

“É muito importante que haja comunicação entre gestão e empregado para que o motivo seja compreendido. Se eu sinto que não tenho as skills necessárias, a empresa pode solucionar investindo em treinamento e preparação. Se a vaga me desinteressa, a organização pode buscar entender quais são as minhas metas. Caso o problema seja algum momento pessoal ou até profissional de turbulência, a empresa pode tentar, de algum modo, oferecer suporte.”

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Como dizer não?

Bárbara elucida que a resposta negativa à oferta de promoção deve ser bem justificada. Segundo ela, se o problema estiver relacionado à insegurança, pode ser válido, em vez de recusar de cara, pedir um tempo para pensar e, neste período, buscar entender melhor quais serão as responsabilidades e como isso pode afetar a rotina profissional e pessoal.

Caso o colaborador não esteja se sentindo pronto, é importante ser transparente com o gestor e apontar quais são os pontos que ele sente que não é capaz de atender. “Em meio a isso, se for uma vaga que de fato o interessa, ele deve deixar claro que deseja solucionar os gaps. Vale sugerir ao gestor que a empresa invista no desenvolvimento de suas habilidades”, diz a psicóloga.

Profissionais recusam promoção

A especialista deixa claro, também, que há casos de profissionais que simplesmente estão felizes em seu cargo atual e não almejam mudar. Além disso, algumas vazas exigem algum tipo de formação específica, seja ela técnica ou universitária, o que pode comprometer o tempo do profissional fora do expediente. Quando for o cenário, ela recomenda que o colaborador deixe bem claro que sente pode contribuir mais à empresa fazendo o que faz.

“Nós criamos uma visão social de que todos devem ser ambiciosos no trabalho, mas não precisa nem deve ser assim. A vida não se resume ao trabalho. Você pode perfeitamente ter como foco outras questões. Se a sua condição profissional atual te deixa bem ou te possibilita concretizar metas pessoais e afins, não há porque criar a pressão de fazer mais e mais”, aponta.

Promoção fantasma

Falar em promoção, comumente, nos faz pensar em algo positivo, vantajoso, mas nem sempre é assim. Há casos, especialmente em panoramas de crise, nos quais o aumento de salário é incompatível com o aumento de pressão e responsabilidades. Nestes momentos, ao invés de ser um ganho, a promoção se torna uma armadilha.

De acordo com levantamento feito pela Robert Half nos Estados Unidos, em 2018, quase 40% dos empregadores revelaram que a prática não é incomum. Ainda assim, 64% dos profissionais respondentes admitiram que topariam ser promovidos em tais condições – especialmente se acreditarem que o salário é vantajoso apesar dos excessos que a vaga pode trazer.

“Quando se fala sobre esse tipo de promoção, o quanto, de fato, os desafios estão claros ao empregado? Ele será apenas um ‘tapa-buraco’ para uma demanda extra ou, de fato, tal promoção pode ajudá-lo a crescer ainda mais na empresa? O dinheiro conta, mas quando a vaga for, para valer, uma cilada, o salário não garantirá que o trabalhador se sinta, com o tempo, igualmente engajado e produtivo como era no início. A falta de reconhecimento pode pesar e a alta demanda sem valorização pode levá-lo a um burnout. Promoções fantasma podem ser temporárias, para realmente cobrir um problema, mas podem ser permanentes”, ressalta Bárbara.

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O lado da empresa

Segundo o advogado trabalhista Carlos Costa, um colaborador dizer não a uma promoção nem sempre é tão simples quanto deveria ser. O especialista jurídico comenta que, dependendo da necessidade da organização, ela não terá tempo para esperar o colaborador se decidir ou se especializar.

“Nós sabemos que o mercado de trabalho não é um mar de rosas. Em organizações que trabalham bem o seu ambiente e o seu planejamento, a recusa pode ser perfeitamente aceita e o profissional não terá qualquer prejuízo momentâneo ou futuro, podendo até, mais para frente, ter a oferta em mãos novamente. Outras, porém, podem partir até mesmo para demissão”, diz.

Todavia, o advogado deixa claro que há posturas que as companhias não devem tomar. “No caso trazido, da Luana, a depender de como foi a abordagem do novo coordenador, ele poderia ter sido denunciado por assédio moral. Nada impede que uma demissão ocorra caso o empregador acredite que o colaborador não atende seus valores, mas o gestor não pode fazer qualquer tipo de ameaça, o que inclui demissão”, deixa claro.

Costa traz à tona que muitos gestores encaram a recusa como insubordinação e, por tal, aplicam algum tipo de consequência ao empregado. Porém, existem alguns fatores que devem ser avaliados.

“Quando há uma contratação, qualquer eventual alteração nas condições de trabalho deve ser consentida e documentada. Ou seja, é necessário consentimento de ambas as partes. Você não chega em um assistente e diz: ‘amanhã você será analista’. Há uma conversa, uma oferta, uma combinação de condições. Quando casos assim são levados à Justiça, é normalmente aceito que haja a recusa. Afinal, a melhora de salário não é fator único ponderado. A nova carga de responsabilidade, a pressão estabelecida, questões pessoais e outras causas podem apresentar prejuízo ao colaborador”, finaliza.

Por Bruno Piai