Não dá para negar o fato de que a sigla ESG (environmental, social and governance – ambiental, social e governança) está, cada vez mais, caindo nas graças das organizações. Seja na teoria ou já com ações práticas, o mercado identificou que as iniciativas de ESG ganharam força diante dos stakeholders

Não é à toa que, segundo a pesquisa “Visão do Mercado Brasileiro sobre os Aspectos ESG”, da Bravo Research, 65% dos gestores pretendem, nos próximos dois anos, criar essa área. 90% acreditam que as boas práticas que envolvem o conceito, como as de sustentabilidade, podem trazer ganhos. Entretanto, o quando, de fato, o ESG pode contribuir? As empresas estão preparadas para se engajar na causa?

Indicadores

De acordo com Marcos Untura, Head de Privacidade e Cibersegurança da keeggo, empresa de soluções de tecnologia, o primeiro desafio em relação ao ESG está em saber por onde dar início no processo de implantação do conceito. 

“A maioria das empresas já identificou a necessidade de implantar ações de ESG em sua cultura interna, mas grande parte não sabe como começar. As organizações que tiverem esse mindset bem estabelecido estarão à frente no mercado. Mensurar esses resultados é outro desafio, portanto, é preciso lidar com essa temática atuando de ponta a ponta e não somente em reuniões estratégicas da alta cúpula”, orienta.

Segundo Rafael Martins, consultor e gestor de RH, as companhias devem, antes de qualquer coisa, identificar quais são suas expectativas em relação ao ESG, criando um planejamento para buscar compreender se suas ações terão impacto efetivo para o negócio e para a sociedade ou se tendem a ser somente iniciativas de fachada que pouco podem contribuir.

“Desenvolver um trabalho ESG não é tão simples. Não é somente jogar responsabilidades no gestor e no RH e esperar que algo mágico aconteça. Muitas vezes, um trabalho em torno do social, do ambiente e da governança pode ser algo que redefina a cultura organizacional. Um projeto sério de ESG vai muito além do marketing, é o envolvimento efetivo com ações que não devem visar somente lucro ou imagem do negócio, mas ganhos reais também no caráter social. Alta direção, RH, gestão, liderança, colaboradores, enfim, todo o ecossistema empresarial precisa se envolver”, pontua.

Tanto para Untura quanto para Martins, é fundamental que as empresas realizem relatórios e busquem ter métricas para analisar a eficiência ou ausência dela do programa de ESG. O consultor destaca que a criação de uma área de ESG não é obrigatória, mas pode ser um diferencial importante para “fazer acontecer”, enquanto o executivo da keeggo reforça o potencial de competitividade que o investimento pode proporcionar.

Além da importância da sustentabilidade dos negócios em si, o ESG se tornou requisito indispensável para uma empresa se manter competitiva no mercado. Fundos de investimento e investidores em geral olham com bastante atenção esses critérios na hora de definir seus aportes”, explica.

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Quanto à mensuração de indicadores, as empresas podem escolher quais serão divulgados, mas alguns cuidados devem ser tomados. Um artigo da Harvard Business Review indicou três erros comuns cometidos:

  • Medir os sinais e ignorar os processos: é preciso considerar o que está além dos números e entender o que levou a esses resultados;
  • Mensurar o que está aparente e ignorar o sistema: buscar a resolução de um problema sem considerar a complexidade na qual ele está inserido pode levar a decisões erradas;
  • Nem sempre o que pode ser mensurado tem mais valor: as emissões de CO2 são um bom exemplo. Apesar de serem fáceis de medir e monetizar por meio de créditos de carbono, não costumam considerar os impactos na biodiversidade, cuja relação de causa e efeito é mais complexa.

“Ou a empresa se aprofunda de forma a entender as situações e buscar soluções realmente eficientes ou cria uma fachada para fingir ser a empresa amiga das pessoas e do meio ambiente. Mas para quem escolher a segunda opção, afirmo que a bomba estoura. Isso não é ESG. O ESG é um conjunto de boas práticas. Ou a empresa mergulha nelas com segurança ou se afunda tentando mentir”, destaca Martins.

ESG no Brasil

Para entender o atual panorama da temática no país, a pesquisa “Retrato da Sustentabilidade no Mercado de Capitais”, conduzida pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), traz informações importantes.

Segundo a pesquisa, ainda existem muitas dificuldades em relação à trilha ESG. “A maioria das instituições atribui relevância ao tema: 86% classificou a importância com notas de 7 a 10. Das cerca de 44% que indicaram a relevância do assunto com as notas 10 e 9, a principal justificativa foi de que sustentabilidade é um assunto importante que todos devem se engajar (sociedade, investidores, colaboradores)”, explica o relatório. Porém, somente 18% das entrevistadas estão adiantas na implementação de iniciativas concretas para ESG. 30% têm planos e 38% afirmam ter dado início. Outras 14% não possuem nada sendo implantado ou disseminado.

ESG três letras para o futuro

Embora haja percepção de que a sustentabilidade é importante, o relatório mostra que a teoria e a prática estão distantes. Sob análise de padrões de comportamento baseados na compreensão e no posicionamento sobre o tema, foi identificado que as empresas estão, em relação a ações :

  • Distante (35,5%);
  • Iniciado (32,1%);
  • Emergente (21,5%);
  • Engajado (6,8%);
  • Desconfiado (4,2%)

De acordo com o estudo “A Evolução do ESG no Brasil”, feito pela Rede Brasil do Pacto Global e pela Stilingue, as cinco iniciativas de ESG atualmente mais identificadas dentro das organizações do país são:

  1. Criação de mecanismos internos de compliance e governança que inibam práticas desleais dentro das empresas (79%);
  2. Gestão de resíduos (reciclagem e reaproveitamento de insumos) (76%);
  3. Criação de comitês e instâncias de governança que contribuam para integridade da organização (68%);
  4. Apoio emergencial à Covid-19 (61%);
  5. Apoio às comunidades do entorno (60%).

Vale destacar também, principalmente em relação ao social, políticas de equidade de gênero (57%) como destaque. O assunto ainda é mais visado nas organizações do que iniciativas de equidade de raça (46%) e ações afirmativas para o público LGBTQIA+ (31%).

Em 2020, fundos ESG captaram, no Brasil, R$ 2,5 bilhões, segundo a Morningstar e a Capital Reset. Em pesquisa global feita pela PwC, 77% dos investidores manifestaram que, nos próximos dois anos, tendem a não mais comprar produtos não ESG. 

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Contra fakes

A exigência cada vez maior do mercado corporativo de atitudes condizentes com os princípios ESG tem levado muitas empresas que ainda não se encontram nos níveis ideais desta métrica a tentarem maquiar suas realidades praticando aquilo que se convencionou chamar de  Greenwashing. O termo se refere a tentativas de enganar possíveis investidores demonstrando preocupação com o meio ambiente, mas escondendo problemas nesta área ocorridos no passado.

Atento a esta estratégia, o ambiente institucional procura cada vez novas formas de evitar este ‘golpe’. Prova disso é o crescimento das pesquisas relacionadas ao assunto na plataforma SaaS para compliance Kronoos. De acordo com a startup, em 2021 foram feitas 300% mais pesquisas buscando informações sobre o envolvimento de empresas com problemas ambientais do que em 2020.

“Não é segredo para ninguém que as propagandas na televisão e todo o aparato de marketing tradicional e digital não podem ser usadas como verdade para conhecer o histórico de respeito à sustentabilidade e outros aspectos das empresas com quem se negocia. Felizmente, a tecnologia tem avançado muito rápido neste sentido e permitido trazer à tona em questão de segundos aquilo que muitos preferem esconder”, diz o CEO do Kronoos, Alexandre Pegoraro.


Por que essas três letrinhas têm o potencial de proporcionar uma ruptura no mercado de trabalho como conhecemos? Para debater a “nova tendência” e explicar os motivos que tornam o investimento em iniciativas com esse viés tão importantes atualmente para as empresas aumentarem a sua competitividade – além de falar sobre quais são as missões do RH diante disso, o CEO do Grupo TopRH, Daniel Consani, e o jornalista Bruno Piai conversaram com Alan Kido, Gerente de Diversidade e Inclusão da TIM. Confira o bate-papo no player abaixo ou clicando aqui.


Na tentativa de restringir a prática do Greenwashing, o deputado federal David Miranda (PDT-RJ) propôs, em junho do ano passado, o projeto de lei 2.041, que proíbe empresas com processos judiciais, administrativos ou arbitrais por desrespeito às leis ambientais de veicularem publicidade na qual promovam uma imagem positiva como ambientalmente engajadas.

Na justificativa, o parlamentar alerta para a possibilidade de vermos empresas adotando o greenwashing para surfarem a onda ESG até que haja forte regulação e controle, além de adequado alinhamento de incentivos. “Com o projeto, objetivamos reduzir e, quem sabe, eliminar a disseminação de discursos enganosos capazes de afetar hábitos de compra e alocação de capital em desacordo com os princípios de desenvolvimento sustentável”, disse.

Por Bruno Piai