Uma pesquisa recente da Sodexo Benefícios e Incentivos mostrou que o vale-refeição do brasileiro tem durabilidade cada vez menor. De acordo com o levantamento, que utilizou como base para análise o valor médio de R$ 40,64 da Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), o benefício tem duração média de 13 dias, o que desfalca o colaborador por nove dias (considerando um total de 22 dias – úteis – de concessão).
Para efeito de comparação, segundo o estudo, em 2019, o VR durava por 18 dias, com o trabalhador precisando gastar do próprio bolso apenas quatro vezes por mês para almoçar. Ou seja, enquanto a inflação sobe, o vale-refeição oferecido pelas empresas não acompanha o ritmo. Segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), até o primeiro trimestre de 2022 a inflação atingiu os 11,3%, enquanto a média de reajuste do benefício no período foi de 7,3%.
De acordo com a ABBT, o custo da alimentação apresentou alta de 16% nos três primeiros meses do ano contra o mesmo período em 2021. Diante disso, segundo Willian Tadeu Gil, Diretor de Relações Institucionais da Sodexo Benefícios e Incentivos, uma vez que o VR ainda é um benefícios principais na atração e na manutenção de talentos, é importante que as empresas se atentem ao aumento dos gastos por parte dos colaboradores e não percam de vista o olhar estratégico sobre o vale. O mesmo se aplica ao vale-alimentação, que também é afetado pela inflação.
“É preciso estar atento à média de preço praticado pelos restaurantes e padarias da região. Afinal, o funcionário busca por estabelecimentos próximos ao local de trabalho para almoçar ou jantar, por isso, é importante estar atento aos valores do entorno. Além disso, para o vale-alimentação, deve-se utilizar como base o levantamento mensal de evolução de preços da cesta básica realizado pelo Dieese”, explica.
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Panorama exige ação por parte das organizações?
Uma série de fatores determina como o benefício do vale-refeição é concedido por parte das organizações. Mesmo diante de um cenário no qual os trabalhadores que o recebem precisam, cada vez mais, arcar com custos de alimentação por conta própria, há fatores que determinam se as empresas podem – ou devem – acompanhar a realidade imposta pelos índices de inflação.
Para entender melhor o papel das organizações em meio ao panorama, conversamos com o advogado Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, sócio da área Trabalhista e Previdenciário do FAS Advogados. Confira:
RH Pra Você: Com base no levantamento feito pela Sodexo, que traz o dado de que o VR do brasileiro dura, em média, 13 dias – considerando análise feita com sua base de clientes -, as empresas que oferecem o benefício têm a obrigação de rever o valor cedido para que seus colaboradores não precisem gastar do próprio salário para almoçar?
Mendonça: O vale-refeição é um benefício que é concedido pelas empresas, mas que não está previsto na Consolidação das Leis Trabalhistas. Portanto, caso não haja a previsão nas Normas Coletivas (Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo), o empregador não é obrigado a conceder, tratando-se de mera liberalidade. Os benefícios do vale-refeição e vale-alimentação deverão sempre atender aos fins a que se destinam, mas não existe a obrigação de rever os valores.
O que acontece é que anualmente as normas coletivas acabam prevendo os aumentos do benefício de acordo com um índice de correção negociado entre os sindicatos. É o que chamamos de data base. Se ficar acordado que os benefícios previstos na Norma Coletiva serão reajustados, a empresa deve aplicar e rever. De qualquer forma, não há obrigação de rever os valores, pois em tese os sindicatos que representam os interesses da categoria aceitaram e concordaram que seria possível a alimentação com aquele valor diário.
RH Pra Você: E de que modo empresas e sindicatos definem o valor dos benefícios de alimentação? O ticket médio dos restaurantes e padarias da região precisa, necessariamente, entrar na discussão?
Mendonça: O valor mensal ou até diário via de regra é decidido e negociado com o Sindicato daquela determinada categoria. O valor do ticket médio dos restaurantes da região não costuma ser levado em conta, pois a negociação coletiva definirá um valor para vigorar em determinado limite territorial. Vai depender da abrangência da norma coletiva. Por exemplo, se ficar definido que o valor diário de um vale-refeição em São Paulo será de R$ 30,00 para determinada categoria, tal valor vai valer para a Zona Sul e Zona Leste, mesmo que o custo de vida do empregado da Zona Sul seja mais caro.
Vale lembrar que a norma coletiva prevê o valor mínimo e não máximo. Se a empresa quiser dar um benefício em valor maior, nada a impede.
RH Pra Você: E quanto ao fator inflação, ele é considerado na determinação da oferta e dos valores de um benefício de alimentação?
Mendonça: Todos os índices são discutidos e aprovados em negociação coletiva. Por isso é sempre importante as empresas e os empregados (por meio de seus sindicatos) participarem das negociações coletivas. Há convenções coletivas que preveem a reposição da inflação acrescida de um aumento real de X%.
RH Pra Você: Muitas empresas, ao oferecer o VR, promovem desconto na folha de pagamento do colaborador. Sob circunstâncias como a trazida pela pesquisa, que indica que o valor recebido pelo trabalhador não supre o mês todo, o desconto deve ser realizado mesmo com o funcionário custeando algumas refeições com o próprio salário?
Mendonça: Os descontos também devem ser previstos nas normas coletivas. É uma prática comum no mercado, pois torna o benefício oneroso para ambas as partes (patrão e empregado) que acabam colaborando com o benefício, dentro de uma proporcionalidade. O desconto não tem qualquer relação com o fato de o valor do benefício estar defasado.
Se a empresa quiser deixar de descontar do trabalhador, por mera liberalidade, poderá fazê-lo sendo que é importante que tal alteração seja feita por negociação de acordo coletivo para que não se torne um direito adquirido do trabalhador.
Por Bruno Piai