O painel Reframing the DEI Debate, realizado durante o SXSW 2025, reuniu especialistas para discutir os desafios e oportunidades das políticas de diversidade, equidade e inclusão (DEI) em um cenário empresarial marcado por retrocessos significativos nos Estados Unidos.

Moderado por Megha Bansal Rizoli, senior director da Jobs for the Future (JFF), o debate contou com a participação de Michael Bush, CEO do Great Place to Work, e Ellen Mcgirt, Editor-in-chief da Design Observer. A cobertura foi realizada por Renata Rivetti, fundadora da Reconnect Happiness at Work e especialista em bem-estar corporativo, em parceria com a Vidalink, empresa de planos de bem-estar corporativo, representada por Luis González, CEO e cofundador da companhia.

Segundo Renata e González, os principais temas discutidos foram:

  1. A ilusão da meritocracia — como decisões de contratações são influenciadas por vieses inconscientes e redes de relacionamento;
  2. Diversidade como motor da inovação — casos concretos mostrando como a inclusão de diferentes perspectivas impulsiona o crescimento das empresas;
  3. Critérios reais para contratação: paixão e resiliência — a importância de buscar talentos fora dos circuitos tradicionais e valorizar características como determinação e vontade de inovar;
  4. O papel da liderança no futuro das organizações — a necessidade de líderes que vejam a diversidade como uma estratégia de negócios, não como um imperativo social.

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Quem está na contramão da diversidade?

O painel começou reconhecendo as mudanças significativas no cenário de DEI desde 2020. Grandes corporações como Google, Disney, GM, Intel, Meta e Deloitte suavizaram ou retiraram referências a DEI de seus relatórios anuais, conforme análise da NPR. O Google, por exemplo, excluiu o Mês do Orgulho LGBTQIA+ e o Mês da História Negra de sua agenda, justificando que manter essas datas manualmente não era sustentável.

Por outro lado, algumas empresas mantêm uma postura firme. A Apple, alvo de uma proposta do National Center for Public Policy Research para abandonar suas iniciativas de DEI, defendeu publicamente essas políticas, destacando que a diversidade é essencial para seus resultados financeiros. Os acionistas da Costco também rejeitaram propostas semelhantes.

“Devemos olhar como exemplo aquelas que estão indo na contramão e mostrando, na prática, como a diversidade beneficia diretamente os negócios. A própria Apple reconheceu seu quadro inclusivo como determinante para seu valor de mercado de US$ 3,7 trilhões — maior do que qualquer outra empresa no mundo”, afirmou Luis González, CEO da Vidalink.

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Diversidade como estratégia de negócios: uma necessidade, não um imperativo social

Michael Bush destacou que, pela primeira vez, as corporações americanas operam sob influência do medo, provocado por ordens executivas que pressionam a revisão das políticas de DEI. Para o executivo, a diversidade deve ser vista como uma estratégia de negócios sólida, capaz de impulsionar a inovação e os resultados financeiros.

“A inovação só existe de fato com times diversos. Se todo mundo for igual, as empresas vão deixar de inovar. Além disso, empresas que ampliaram a diversidade aumentaram significativamente seu valor de mercado. A inovação vem do esforço extra de equipes que se sentem valorizadas e respeitadas”, relata Renata Rivetti.

O mito da meritocracia e as barreiras sistêmicas

Ellen Mcgirt criticou a meritocracia corporativa como um reflexo do narcisismo dos líderes, que tendem a contratar “mini versões de si”. Para ela, a inclusão vai além de uma questão de justiça social — é uma necessidade estratégica para empresas que lidam com sistemas cada vez mais complexos.

Megha Bansal Rizoli também questionou a validade da meritocracia, apontando que essa lógica ignora barreiras sistêmicas que dificultam a diversidade real nas organizações.

”A verdadeira questão é: quem não está na sala? Entender essas ausências é crucial para corrigir desigualdades estruturais. Não adianta falar em meritocracia se a liderança acredita que todos vieram do mesmo ponto de partida“ reforçou Renata Rivetti.

Trazendo para o contexto brasileiro, Luis González destacou o conceito de “pobreza de tempo”, que impacta diretamente grupos como as mulheres pretas e pardas. Segundo pesquisa da Vidalink, 41% dessas mulheres enfrentam uma dupla jornada de trabalho, dividindo-se entre emprego formal e responsabilidades domésticas, enquanto 43% relatam sentir-se ansiosas na maior parte do tempo.

“Precisamos de culturas organizacionais que se adaptem a essas necessidades específicas. E mais do que um ato de solidariedade, isso é uma forma de trazer as condições necessárias para que essas pessoas contribuam para o sucesso da empresa”, afirmou.

“Grit”: a nova métrica para contratações

Bush argumentou que líderes devem buscar pessoas com “grit” — termo popularizado pela psicóloga Angela Duckworth em seu livro “Grit: The Power of Passion and Perseverance”. O conceito se refere à combinação de paixão e persistência para alcançar objetivos de longo prazo.

“O ponto sobre ‘grit’ ser um fator determinante para o sucesso dentro das empresas é interessante. A ideia de que as melhores contratações não vêm apenas de faculdades renomadas, mas de pessoas com algo a provar, desafia os métodos convencionais de recrutamento”, pontuou Rivetti.

Diante do retrocesso nas políticas de DEI, os especialistas alertam para os riscos estratégicos dessa postura: “Com empresas começando a retirar iniciativas de DEI, é como mexer em time que está ganhando. Se a empresa aumentou receita, melhorou resultados, por que mudar algo que claramente funciona?”, questiona Renata.

“O grande diferencial estará nas empresas que mantêm a consistência entre o discurso e a cultura de diversidade e bem-estar desenvolvida nos últimos anos, bem como nos resultados que isso trará para a produtividade e o crescimento da empresa”, conclui Luis González.