É sabido que, nos últimos anos, os Recursos Humanos mudaram o tom de sua atuação. Se antes o setor era praticamente um sinônimo do departamento pessoal, hoje, cada vez mais, as áreas têm suas responsabilidades divididas, com burocracias e estratégias ainda caminhando próximas, mas em equilíbrio.
Embora tal adequação fosse mais do que necessária, especialmente por conta das mudanças enfrentadas não só pelo mercado, mas pelo mundo nos últimos anos, é inegável que o “novo RH” tem metas a superar para, de fato, alcançar a tão necessária maturidade que o colocará como uma área pronta para o presente e para o futuro do trabalho.
O profissional do setor não deve apenas olhar para o “futuro do RH”. Igualmente, ele tem a missão de construir o “RH do futuro”. Para auxiliar nessa jornada, separamos aqueles que serão os grandes desafios dos Recursos Humanos em 2023 e nos próximos anos. Confira:
Retenção de talentos
Reter talentos é uma missão desafiadora e os RHs sabem disso. Segundo pesquisa do Infojobs, engajar pessoas é a principal preocupação apontada pelos recrutadores entrevistados. Não à toa, para 96,7% as empresas devem investir mais na valorização dos funcionários para que, assim, possam motivar seus colaboradores a permanecer no negócio.
Fato é que, nos últimos anos, a meta se tornou especialmente complexa. Além de todo o impacto da pandemia da Covid-19, principalmente na discussão de práticas para cuidar da saúde mental das pessoas, há também a cultura de trabalho das novas gerações, como a Z. Dados do Ministério do Trabalho e Previdência revelaram que, em 2020, quase 25% dos jovens entre 18 e 24 anos mal completaram três meses de trabalho em suas empresas.
De acordo com Ana Paula Prado, CEO do Infojobs, a retenção precisa ser feita como parte do processo de integração do funcionário, desde o princípio da contratação. “O ideal é que a empresa ofereça suas melhores práticas e proporcione um ambiente motivador desde o princípio e não apenas quando há o diagnóstico de alta rotatividade”, ressalta.
Para Tonia Casarin, autora do livro “Liderança Exponencial”, um passo importante para reter talentos é melhorar a capacitação das lideranças. É fundamental que líderes e RHs estejam alinhados no desenvolvimento de ações e na construção de ambientes que não sobrecarregue o colaborador e que o faça sentir que há propósito em sua rotina. Além disso, feedbacks, prestação de suporte para eventuais adversidades, remuneração justa e plano de carreira devem fazer parte do pacote.
“A retenção de talentos é um desafio para empresas de todos os portes e segmentos. Hoje, a grande maioria dos profissionais busca um propósito na carreira e deseja atuar em organizações com valores alinhados aos seus. Nesse sentido, ter um líder engajado com o aspecto humano é um grande diferencial”, diz.
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RHs 4.0 e 5.0
O conceito do 4.0 começou a ganhar força na indústria em 2011, sendo ele a representação de estratégias tecnológicas para otimizar negócios. No RH, o termo remete à transformação digital como potencializadora do trabalho com pessoas. Porém, enquanto muitas empresas ainda têm RHs que engatinham no tema, a era do RH 5.0 chegou. Seu propósito é revolucionar os Recursos Humanos focando em rotinas de gestão que priorizem a jornada do colaborador, o bem-estar e ambientes saudáveis e inclusivos.
Vale o adendo que ambos os conceitos se complementam. Um RH pronto e adaptado ao 4.0 é um setor que terá maior assertividade para montar planos e ações que o farão ser um destaque positivo na implementação das práticas 5.0. Fica o alerta, portanto, de que RHs ainda distantes de uma transformação digital efetiva tendem a ficar para trás no mercado atual.
“O departamento tem uma participação ativa nas decisões da empresa, com um perfil estratégico e conciliador, e o principal fator que contribui para que isso aconteça é a tecnologia. Com a automação de processos repetitivos, as pessoas conseguem focar no que realmente importa: atividades que agregam valor à organização”, destaca Cesar Heli, CEO e fundador da Magicel.
Para entrar com o pé direito na era 5.0, Fernanda Consoni, Gerente de Recursos Humanos do Grupo Benner, aconselha que as empresas invistam em soluções que facilitam a rotina do gestor de RH, pois elas ajudam na tomada de decisões mais conscientes quanto a fatores como sucessão, promoção, bonificação, capacitação e custos, “bem como indicadores para gestão estratégica em tempo real, como custo da folha, banco de horas, benefícios, absenteísmo, rotatividade, acompanhamento de PDI, férias e evolução de colaboradores, por exemplo”.
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ESG
Aportuguesado para ‘ambiental’, ‘social’ e ‘governança’, o ESG é muito mais do que apenas uma simples sigla. Segundo um estudo feito pela EY, o conceito já é responsável pelo direcionamento de decisão de 99% dos investidores no Brasil. Ainda de acordo com o relatório, 78% dos investidores acreditam que as empresas devem dar início aos investimentos na agenda, mesmo que isso signifique redução nos lucros a curto prazo.
O ESG não é uma responsabilidade exclusiva do RH. Toda a empresa precisa estar alinhada e estruturada para fazer a agenda acontecer. A missão do RH, segundo Renato Dias, fundador da Taqe, é a de articular ações com as demais equipes da organização.
“É preciso que não somente a diretoria esteja engajada, mas também que as lideranças se alinhem às práticas e que todos os colaboradores tenham conhecimento e ajam de acordo com o que a empresa está realizando”, pontua.
Para Dias, algumas ações que podem ser realizadas envolvem: implementar boas práticas de segurança da informação; estar em compliance com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD); diversificar de vagas e contratações; buscar certificações como ISO (de segurança) e selos ambientais; e promover ações de saúde física e mental dos colaboradores.
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Diversidade & Inclusão
Ser diverso, para muitos negócios, pode não ser o maior dos desafios. Mas ser inclusivo talvez não seja tão simples assim. Por mais que D&I seja um tema exaustivamente debatido nos últimos anos, a jornada de conscientização sobre a importância da pluralidade para o mercado de trabalho ainda dá seus primeiros passos.
De acordo com o levantamento Tendências de Gestão de Pessoas 2022, do GPTW, em 2022 o D&I era prioridade para 17,9% das companhias entrevistadas, número bem aquém dos 37% registrados no ano anterior. Outra pesquisa, desta vez da Adobe, revelou que 38% dos entrevistados se sentem mais propensos a consumir produtos e serviços de marcas assumidamente diversas, enquanto 34% disseram ter, ao menos uma vez, boicotado marcas que não os representam.
Em meio a isso, o RH assume o papel de voltar a colocar a diversidade e a inclusão em destaque. Estudos revelam que empresas plurais são mais atraentes, lucrativas e têm maior potencial de retenção, enquanto o turnover sofre queda. Entretanto, D&I vai muito além de contratar minorias. Líderes e RHs devem construir ambientes que comportem o respeito às diferenças e que possibilitem debates saudáveis de ideias.
Deives Rezende Filho, CEO e Fundador da Condurú Consultoria, destaca que as empresas que querem ter um papel realmente ativo em D&I devem refletir sobre cinco pontos: continuidade da violência racial; modismo vs. importância real; raízes na diversidade (inclusão que vai além de vagas afirmativas); D&I para C-level; e cultura de letramento (educação e treinamentos sobre o tema).
“No Brasil, por exemplo, 56% da população é negra, mas essas pessoas ainda são minoria em muitos espaços. Como é possível que mais da metade da população não tenha quase nenhum espaço dentro de determinados setores no mercado de trabalho? Assim, o debate sobre diversidade foi crescendo e englobando diversos recortes: gênero, etnia, idade, condição física, naturalidade, etc”, elucida Jhenyffer Coutinho, especialista em Recursos Humanos e CEO da Se Candidate, Mulher!.
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Segurança de Dados
Isso é um problema exclusivo do setor de TI, certo? Errado! Se no trabalho 100% presencial as empresas já precisam tomar um alto cuidado com a sua segurança de dados, os modelos de trabalho que envolvem atuação a distância exigem atenção ainda maior.
A responsabilidade do RH é simples: conscientizar o máximo possível. Além disso, o setor pode oferecer apoio direto na prevenção contra fraudes e problemas com dados se formular políticas sólidas de proteção digital. A regra vale para a própria área de Gestão de Pessoas, que tem em sua cola a Lei Geral de Proteção de Dados.
A Kaspersky, em estudo publicado em 2021, identificou que o Brasil foi o país mais afetado por tentativas de roubo de dados pessoais e financeiros de pessoas na internet ao longo de 2020. O percentual de usuários brasileiros que tentaram abrir links enviados para roubar dados pelo menos uma vez representa 19,9% dos internautas do país.
“Como as empresas não podem mais depender de limites físicos ou virtuais para definir o que é confiável ou não, muitas organizações estão adotando uma política de segurança de confiança zero. Essa abordagem de segurança “nunca confie, sempre verifique” exige que todos os acessos a redes, aplicativos e serviços sejam autenticados. Como resultado, os gerentes de identidade e acesso estão atendendo demandas significativamente maiores em suas organizações”, explica Diana Jovin, VP de marketing de produtos da DigiCert.
Por Bruno Piai