Para começar a falar de licença-paternidade no Brasil, é preciso voltar algumas décadas. Embora hoje muitos pais ainda desconheçam o seu direito à ela, a licença começou em 1943, com a CLT garantindo um dia de ausência justificada após o nascimento de um filho. Com o passar dos anos, o benefício garantido pela Constituição Federal passou por mudanças e vai além da legislação, o que faz com que empresas e profissionais ainda tenham questionamentos a respeito, os quais vamos abordar no decorrer deste texto.

1) Afinal, são 5 ou 20 dias de licença-paternidade?

De cara, vamos responder aquela que é, talvez, a principal dúvida dos pais em relação ao benefício. A advogada Claudia Securato, sócia do escritório Securato e Abdul Ahad Advogados, explica que a legislação garante o afastamento de cinco dias do colaborador que tem direito à licença (é importante considerar que a CLT não diz se os cinco dias devem ou não ser corridos).

Os outros quinze dias são garantidos caso a empresa empregadora esteja cadastrada no programa Empresa Cidadã, totalizando, então, 20 dias de licença-paternidade. Vale ressaltar que todas as regras também são estabelecidas a pais adotivos.

2) O que é o programa Empresa Cidadã?

O programa foi instituído em 2008 pelo Governo Federal, com o propósito de aumentar a participação de pais e mães nos primeiros dias de vida dos filhos. Enquanto aos pais é acrescido mais 15 dias de licença, às mães, o benefício da licença-maternidade, que por padrão da lei é de 120 dias, é acrescido em mais 60. Até setembro do ano passado pouco mais de 22 mil organizações do País já faziam parte do Empresa Cidadã.

“O Empresa Cidadã é um programa instituído pela Lei nº 11.770/2008, mas somente em 2016 prorrogou a licença paternidade. Ele foi criado inicialmente para prorrogar a licença-maternidade para 6 meses mediante a concessão de incentivo fiscal às empresas que se inscrevem”, explica Claudia.

3) Quando o pai tem direito aos 120 dias de licença?

Assim como as mães, os pais também podem ter direito a 120 dias de licença. Contudo, é necessário que algumas condições específicas se apliquem. No caso, é necessário que o indivíduo do sexo masculino tenha a guarda unilateral da criança. Em português mais claro, por exemplo, em casos nos quais o homem adota uma criança sozinho ou quando há o abandono por parte da mãe.

4) A licença-paternidade se estende ao período de gravidez ou é exclusiva ao pós-nascimento?

Ao pé da letra, o pai tem seus direitos durante o período da gravidez, mas eles não são efetivamente parte da lei da licença-paternidade em si. E quais seriam esses direitos?

Segundo Claudia, “a lei da CLT prevê dois dias de ausência do pai sem penalização para acompanhar consultas médicas e exames complementares da mãe gestante”. Além disso, após o nascimento, o pai tem direito a um dia de ausência remunerada no ano para poder levar o filho ao médico. “Esse recurso pode chegar até dois dias, dependendo do sindicato do pai e é válido para crianças até seis anos de idade”, acrescenta a advogada.

5) A licença-paternidade funciona para todos os vínculos empregatícios?

A advogada trabalhista Juliana Silva pontua que a licença-paternidade é um direito exclusivo a profissionais CLT, na escala privada e a servidores públicos. “A regra, legalmente falando, não se estende a pessoas jurídicas que prestam serviço às empresas. Nesse caso, um período de afastamento – remunerado ou não – fica a critério do empregador”.

6) Como e quando solicitar a licença? E quais são as exigências?

É aqui que Juliana reforça a importância dos colaboradores se atentarem a algumas questões. “Uma vez fui contatada por um profissional que queria entrar com uma ação contra a empresa por ela não autorizá-lo a ter sua licença-paternidade. Porém, ao contar o caso, ele revelou que teve um filho no mês de abril, mas só deixou a gerência ciente em dezembro, pois gostaria de folgar no período do Natal e do Ano Novo, o que por praxe não era habitual naquela organização. Infelizmente, tive que explicar ao colaborador que o benefício não tinha mais validade a ele”. E por que isso ocorreu?

Segundo a lei, o profissional deve deixar o empregador a par do nascimento ou da consolidação de uma adoção imediatamente após o fato ou pelo menos durante o período legal de afastamento remunerado. O colaborador não pode se ausentar por conta própria e tampouco pode avisar a empresa quando bem entender na esperança de ter a ausência nos dias que escolher por conta própria – aliás, por já ter a garantia dos cinco dias, o empregado pode negociar com o seu empregador qual será o período de gozo da licença.

Embora a concessão da licença-paternidade seja obrigatória, o funcionário pode, sim, perder o direito a ela caso não cumpra as regras estabelecidas de comunicação e documentação”, esclarece Juliana, que acrescenta que a certidão de nascimento ou um documento que comprove a adoção deve ser apresentado ao RH da empresa.

Há a consideração, também, de que se o nascimento da criança ocorrer durante as férias do pai e os cinco dias de licença (que são contados a partir do primeiro dia útil pós-nascimento) se cumpriem durante o descanso, a empresa não é obrigada a posteriormente ausentar o colaborador por mais cinco dias de trabalho. Porém, é uma situação que pode ser negociada com a gestão para que o funcionário tenha o direito ao descanso e à licença.

7) O direito se estende a casos de aborto ou de crianças natimortas?

Em relação ao aborto, somente profissionais do sexo feminino têm direito a afastamento, sendo ele de 14 dias. O afastamento paterno somente é incluso nos casos de natimorto, nos quais o pai poderá ficar de cinco a vinte dias (neste caso, considerando o Empresa Cidadã) ausente do trabalho. Nesses casos a mãe recebe a licença integral de 120 dias a 180 dias.

Humanização e respeito: os maiores direitos

Ser pai ou mãe é um momento verdadeiramente especial e que muda para sempre a vida de muitas famílias. Portanto, é natural que muitos profissionais desejem ter um tempo a mais com seus filhos, podendo focar um pouco mais neles e um pouco menos no trabalho. Em razão disso, muitas empresas não precisam se apegar somente à legislação e podem, também, dar o seu toque de sensibilidade e humanização à causa. Para ilustrar o fato, trouxemos o exemplo da Japan Tobacco International.

A JTI lançou uma nova política global de licença-maternidade e paternidade para os seus 44 mil colaboradores: 20 semanas de licença remunerada, independentemente de gênero, orientação sexual ou forma como os colaboradores se tornaram pais (gravidez, adoção ou barriga solidária). O plano, que será implementado em fases a partir de 1º de janeiro de 2021, vai colocar a organização entre o 1% de empresas brasileiras que oferecem mais de dois meses de licença-paternidade segundo pesquisa do grupo Talenses.

Ao todo, são 140 dias de licença. O tempo vai muito além do exigido pela legislação brasileira, cinco dias, e que é seguido por 71% das empresas ouvidas no estudo. A nova política da JTI também se destaca no cenário global tendo um tempo maior de licença do que 80% dos 81 países em que a empresa atua.

Com a mudança, a organização espera reforçar que se tornar pai ou mãe não representa um obstáculo para a carreira e que ambos têm responsabilidades nos cuidados com os filhos. “Essa nova política de licença-familiar é um grande marco na nossa jornada em busca da diversidade e da igualdade de gênero. Estamos orgulhosos de apresentar esse novo benefício sem distinção de gênero, que apoia todas as famílias e dá a todos os pais oportunidades iguais de passar um tempo de qualidade com seus filhos, sem se preocupar com o impacto que isso poderia ter em suas finanças ou carreiras”, diz Eddy Pirard, presidente e CEO global da JTI.

Com essa nova estratégia, a JTI busca apoiar o bem-estar de seus colaboradores, ajudando-os nos estágios iniciais de criação de uma família enquanto continuam a prosperar no trabalho“, afirma Paulo Saath, Líder das Operações de Tabaco no Brasil.

Para garantir um processo de implementação tranquilo e a utilização adequada dos benefícios,  a nova política de licença-paternidade e maternidade será feita em fases nos diferentes países onde a JTI atua. No Brasil, em janeiro de 2021, será implementada a licença-paternidade de 4 semanas (28 dias) e a licença-maternidade de 20 semanas (140 dias). Nos casos de casais LGBTs, será definido o cuidador primário, que terá licença de 20 semanas, e o cuidador secundário, que terá, inicialmente, a licença de 4 semanas. A efetivação total da nova política no País se dará em janeiro de 2023, quando a licença de 140 dias passa a valer para todos.

Licenças maternidade e paternidade em números no Brasil

Em época do Dia dos Pais, assim como ocorre no Dia das Mães, o comércio e a sociedade estão mobilizados. Marcas preparam homenagens (merecidas) aos patriarcas e as redes sociais deixam de lado sua rotina de discussões e polêmicas para dar lugar a mensagens de carinho e amor àqueles que nos acolhem e tanto ensinam durante a vida.

Porém, mesmo com todo esse “clima de emoção”, queremos entender como as organizações estão lidando com a paternidade. Para isso, confira alguns números abaixo:

  • 71% das empresas dão apenas cinco dias de licença-paternidade para seus colaboradores, o mínimo exigido pela lei brasileira.
  • Entre as entrevistadas, 13% cedem 20 dias aos pais e apenas 1% garantem mais de dois meses de benefício.
  • 3 em cada 10 empresas oferecem licença-maternidade estendida no Brasil. Este número cai para 2% no caso da licença-paternidade.
  • 63% das empresas entrevistadas garantem o tempo mínimo de licença-maternidade, de quatro meses. Já 29% cedem seis meses.
  • 55% das empresas não oferecem qualquer tipo de programa ou ação voltada para a jornada da maternidade. Este número sobe para 68,3% no caso de ações voltadas para os pais.

Os dados são do estudo “Os Efeitos da Licença-Maternidade e Paternidade no Mercado de Trabalho” do Talenses Group em parceria com a Filhos no Currículo. A pesquisa foi realizada com os profissionais responsáveis pelas licenças paternidade e maternidade de 721 organizações em dezembro de 2019.

 

Por Bruno Piai