Candidatura, testes de português, inglês, espanhol – em forma de game -, raciocínio lógico (que mais parecia uma prova de matemática), videoentrevista, entrevista com o RH, teste de personalidade, entrevista com o requisitante da vaga e entrevista com o dono da empresa. Foi essa a jornada do Analista de Marketing, Pedro Moisés, 33, antes de ser reprovado em uma empresa de médio para grande porte paulista por ter uma pretensão salarial em torno de R$ 1 mil acima do que estavam dispostos a pagar.

“Talvez o sentimento de frustração só não tenha sido maior porque apenas a última etapa obrigou que eu me deslocasse à empresa. Ela tem uma reputação boa, a estrutura parece bacana, mas o processo seletivo deixou uma impressão ruim. Em todas as entrevistas deixaram claro que o uso do inglês era fundamental por conta dos clientes, tanto que a vaga o pedia. Mas nada citava o espanhol. Quando surgiu aquele jogo na minha tela, pensei que minhas chances acabariam ali. Mas ainda tinha muito mais etapas, que fui passando até receber um não porque minha pretensão salarial era alta demais. Eu estava disposto a baixá-la, a negociar, mas em nenhuma entrevista trataram isso como um problema, apenas no e-mail com o retorno negativo que trouxe a remuneração como justificativa.”

O incômodo com o excesso de fases na seleção não é uma exclusividade do profissional de marketing. De acordo com um levantamento realizado pela Luandre, consultoria de RH, um dos principais desejos dos candidatos é para que os processos seletivos sejam mais objetivos. 94% afirmam que é importante que seja informado com antecedência quantas etapas farão parte da seleção da vaga.

“Fica claro que prezam pela transparência no início do processo seletivo, inclusive para conseguir avaliar e entender sua complexidade e poder programar seu dia a dia de acordo com as diversas fases”, diz Gabriela Mative, diretora de RH da Luandre.

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Impressão ruim

Para Alisson Souza, CEO da abler, empresa de tecnologia para recrutamento, as organizações precisam se atentar à experiência dos candidatos durante o processo seletivo, uma vez que a fase não pode ser ignorada no trabalho de atração de talentos.

Uma experiência ruim em um processo seletivo pode afetar e muito alguns profissionais”, diz. O executivo recomenda ao recrutador atenção a todas as etapas do processo, identificando como cada um dos candidatos reage a elas e, se necessário, questionando como se sentem e se consideram que há ou não sentido nas etapas envolvidas. “Dessa forma, gera-se uma conexão com o interessado e deixando-o mais à vontade para prosseguir na seleção”, argumenta.

O ponto trazido por Souza é refletido na pesquisa da Luandre. De acordo com o material, 59% dos entrevistados se sentem mais pressionados à medida que a seleção aumenta a quantidade de etapas. Já 66% manifestam que isso torna as vagas mais injustas, mesmo com 70% pontuando que tentariam ir até o fim do processo.

Ingressos Top of Mind

Os dados deixam claro que, para atender toda a demanda necessária da vaga e, ao mesmo tempo, oferecer uma experiência positiva ao candidato, é crucial que cada oportunidade em aberto seja trabalhada de acordo com suas especificidades e não seguindo padrões que fazem muito sentido para algumas vagas e absolutamente nenhum para outras. A análise pondera que mesmo que cerca de 76% dos candidatos consultados considerem que até três etapas seja o ideal para um processo seletivo, 42% deles compreendem que essa objetividade depende da vaga em questão.

“A palavra-chave é equilíbrio. Por um lado, a maioria afirma que o ideal é ter menos etapas, mas boa parte dos candidatos não vê como problema o processo ser mais extenso, contanto que haja justificativa, seja pela complexidade da vaga ou pelo tipo de perfil do profissional desejado”, explica Gabriela.

Na opinião do CEO da abler, quanto antes a área de RH antecipar o processo, maiores serão as chances de fechar uma boa contratação. “Por isso, o planejamento da vaga é importante, pois conhecer bem e definir todos os critérios, conhecimentos e habilidades que o perfil ideal deve ter facilita a busca”. Estabelecer as etapas do funil de recrutamento, definir o canal de comunicação com os candidatos e escolher com assertividade os canais de divulgação também são pontos que, segundo Souza, fazem a diferença.

Além disso, por mais que o recrutamento esteja cada vez mais ágil, digital e tecnológico, Ricardo Haag, sócio da Wide, consultoria boutique de recrutamento e seleção, faz menção de que o fator humano não pode ser ignorado. Mesmo que existam as etapas das entrevistas, nela o recrutador precisa ter desenvolvidas skills que tornam a jornada do candidato mais agradável, especialmente quando já há o sentimento de tensão ou frustração pelo excesso de testes.

“Estamos presenciando uma nova dinâmica de negócios, com a urgência em trazer processos de recrutamento e seleção mais empáticos e, menos focados meramente em questões técnicas ou interesses exclusivos da empresa contratante. Ao trazer este novo olhar, atrair e reter os melhores talentos do mercado fica muito mais fácil, reduzindo os índices de turnover e, elevando a satisfação, assim como o desempenho de todos os times”, salienta.

Haag salienta que as empresas que adotarem tal mentalidade terão destaque em relação aos seus concorrentes, especialmente à medida que o legado da marca somado a sua reputação são fatores cada vez mais determinantes para que haja atração.

Por Bruno Piai