Há um ranking que, não é exagero dizer, todas as organizações ambicionam fazer parte. Afinal, como não desejar receber a alcunha de estar entre as “melhores empresas para se trabalhar”. Anualmente, o Great Place to Work (GPTW) publica mais de quarenta rankings com esse objetivo.

Mas como avaliar as companhias quando uma pandemia chega e altera o curso das relações de trabalho? Há mudanças? O que esperar do mercado? Qual o papel do RH? Conversamos com Ruy Shiozawa, CEO do GPTW no Brasil, sobre isso e muito mais.

Na entrevista especial que concedeu ao RH Premium Melhores Práticas em RH [baixe aqui a edição na íntegra], o executivo também contou sobre a criação do GPTW; o que mudou desde que o selo chegou ao Brasil, em 1996; o amadurecimento das organizações e, claro, sobre o atual momento que vivemos e como ele alterará o mercado de trabalho.

Confira abaixo um trecho da conversa:

 

RH Pra Você: Nesse cenário inusitado, meio apocalíptico, que estamos vivendo agora, inédito para a população, o GPTW vai usar os mesmos critérios para avaliar as empresas em 2020 ou terá alguma mudança só neste ano?

Ruy Shiozawa: O que estamos discutindo nesse período? Para esse momento temos duas grandes diretrizes, que recomendamos fortemente que as empresas sigam. A primeira delas é: cuidado com as pessoas, colocá-las em primeiro lugar, pensando na saúde, pensando no bem-estar, na contenção da Covid-19, na prevenção da pandemia. Quanto melhor fizermos isso, mais rapidamente sairemos desse período. Dá para observar como vem sendo feito no mundo: países que fizeram isso melhor e pior.

A segunda diretriz é incentivar os negócios. O que está se discutindo, tenho participado de vários grupos com presidentes de empresas e empreendedores, é como – mantendo o cuidado com as pessoas – priorizando a saúde, começamos a retomar os negócios? A chave desse processo está na liderança. Vamos comparar o Brasil a uma empresa, que está passando por uma crise.  A atuação da liderança, que são o presidente, diretores, gestores ou, em última análise, todo mundo que pode influenciar as pessoas. Não precisa ter cargo para ser um líder. Pode ser uma pessoa na área de operação, não é chefe de nada, mas exerce influência, gera confiança, estimula o debate.

O que é necessário nessa liderança?

Uma liderança que inspire as pessoas para um propósito. Qual é nosso propósito nesse momento? Preservar vidas e retomar os negócios. Esse é o propósito de uma grande empresa chamada Brasil. Para fazer isso, o primeiro pilar é inspirar pessoas: queremos salvar vidas e recuperar os negócios, não um ou o outro. Não adianta ter negócios com as pessoas mortas e tê-las vivas com a economia parada. Liderança é um exercício complexo, se fosse fácil qualquer um faria. Segunda coisa é preciso de um ambiente de confiança, onde haja transparência, que se fale a verdade, que aceita opiniões diferentes. O nosso problema agora não é saber quem tem razão, mas, sim juntos encontrarmos um caminho comum. E o terceiro ponto é o trabalho em equipe. Trabalharmos juntos é o ponto que está pegando.

Quais são as estratégias que as grandes empresas já têm que podem ser utilizadas nesse momento de crise que estamos vivendo?

A primeira coisa quando se fala de crise já ficou para trás. Há companhias que estão muito mais preparadas para enfrentar uma situação como esta que outras. Quando elas estão fazendo o planejamento, já imaginam vários cenários, positivos e negativos, e se preparam para isso. Há outras que só pensam na crise quando já estão dentro dela e só aí descobrem que deveriam ter feito algumas coisas. Por exemplo, num momento desses qual é a coisa mais importante do ponto de vista de gestão financeira? É ter uma reserva de caixa. Tem empresas que passam anos como se estivessem fazendo uma poupança para deixar algum recurso reservado para caso uma hora tenha um situação difícil, tenha alguma reserva para enfrentá-la, como o planejamento financeiro pessoal: você pode ter um problema, ficar desempregado muito tempo, se você se preparou e tem uma reserva vai passar esse período até psicologicamente melhor que outro que não planejou nada e vai entrar em desespero logo. A primeira coisa é isso: a preparação antes da crise. Claro que agora não adianta discutir, mas fica como lição para a próxima, olhando para a frente.

E o segundo passo?

É essa atenção com as pessoas. Há empresas que têm uma cultura de sempre cuidar das pessoas, envolvê-las, de querer ter um ótimo ambiente de trabalho. Isso é importante porque leva as pessoas a estarem mais comprometidas com você.  Quando há uma crise e a companhia tem práticas de proximidade e comunicação essas pessoas estão mais engajadas e querem te ajudar a sair da crise. Elas têm um sentimento de dono: “essa empresa também é minha, preciso ajudá-la a sobreviver”. Há situações nas quais as pessoas estão pouco comprometidas com a organização, estão preocupadas em conseguir sobreviver, salvar o emprego, arranjar uma outra coisa, mas não necessariamente com a empresa. Se a direção da companhia está próxima às pessoas, há uma chance muito melhor nesse momento.  O terceiro ponto podemos chamar de alinhamento. Se você tem equipes que trabalham de maneira integrada e alinhada, em uma hora de crise precisa definir um caminho e persegui-lo com bastante persistência. Uma companhia que não está acostumada a discutir, ter debates de ideias, cada um quer fazer do seu jeito, por achar que sua maneira é melhor e o outro está falando besteira.

Qual é o papel do RH nesse processo todo, especialmente no que diz respeito à inclusão, inovação e criatividade? Qual o papel desse novo RH que não é só aquele que recebe currículo e que tem várias atividades, mesclado com outros setores, por exemplo comunicação interna.

Temos batido nessa tecla há muitos anos. Desde que se começou a falar em transformação digital discutimos que o departamento mais relevante nesse processo é o RH, porque essa transformação não é tecnológica – essa está aí disponível há 20 anos.  A grande mudança é a cultural, de hábitos, de formas de relacionamento de pensar o mundo e modelos de negócios. O RH tem que ser o departamento mais ativo da empresa. O desafio não é o RH conseguir ocupar esse espaço, mas sim se colocar nesse lugar. Você tem hoje alguns profissionais de RH que estão muito conectados e envolvidos nessa questão toda, frequentam fóruns de debates de tecnologia e modelos de negócios. Há também aquele RH que ainda está dez ou 20 anos para trás: não percebeu a importância do que ele pode fazer estrategicamente para a empresa. Ele é o cara que tem que discutir negócios, como pode melhorar, a ter mais cliente, abrir mercado a partir da tecnologia, é ele que vai ajudar a engajar as pessoas nesse processo.

No RH Premium Melhores Práticas em RH trouxemos uma matéria especial sobre os impactos da crise do novo coronavírus nas empresas e, além disso, abordamos temáticas extremamente ricas às organizações e que, sem dúvidas, contribuem para que possam avançar em sua atuação, a exemplo da atração e inserção de refugiados no mercado de trabalho; equidade de gênero; mobilidade corporativa. Trouxemos também exemplos de empresas que se destacaram e são exemplos em diferentes frentes (compliance, gestão de conflitos, sustentabilidade, diversidade). Baixe aqui a publicação na íntegra.