Mesmo para as empresas mais consolidadas no mercado, a pandemia trouxe novos desafios e a necessidade de se reinventar. Para o bem ou para o mal, foram poucos os negócios que passaram incólumes aos efeitos proporcionados pela Covid-19 em escalas social e trabalhista.
Enquanto algumas organizações não precisaram de tanto esforço para se adaptar ao “normal pandêmico”, outras vivenciaram uma verdadeira reestruturação, tanto no que diz respeito ao modelo de trabalho quanto sobre as estratégias de sobrevivência e de manutenção (ou de redefinição) da cultura organizacional. Neste segundo grupo está a Premium Essential Kitchen.
Nascida no início dos anos 90, a Premium, empresa que oferece refeições coletivas personalizadas, precisou se reinventar para superar os desafios impostos pela pandemia. Ao mesmo tempo em que a companhia remodelou seus produtos para atender uma nova realidade – especialmente por conta do impacto financeiro sofrido em decorrência da transição do trabalho presencial para o home office, por parte de alguns de seus clientes -, a implementação de um plano para lidar com o momento não deixou a humanização de lado.
Foi durante a pandemia que a Premium se fortaleceu como marca empregadora e firmou projetos voltados a cuidar de pessoas, conduzidos principalmente pelo RH. Em meio à complexidade de equilibrar o caixa do negócio com o acolhimento às pessoas, os Recursos Humanos assumiram papel de protagonismo para auxiliar em ambas as demandas e levar o negócio de volta aos eixos.
Para falar mais sobre todo esse processo e as iniciativas de bem-estar, o RH Pra Você conversou com Caroline Nogueira, Diretora de RH e Jurídico da Premium Essential Kitchen, que revelou os segredos para a empresa crescer 30% em 2021 em relação a 2020 e as estratégias para engajar o time de trabalho. Confira:
RH Pra Você: A pandemia impactou a alimentação do profissional brasileiro, especialmente nos casos em que houve a troca do trabalho presencial pelo modelo remoto. Além disso, o setor alimentício foi um dos mais atingidos pela crise da Covid-19, segundo o Ministério da Economia. Como foi para a Premium enfrentar o cenário pandêmico?
Caroline: Na pandemia, houve uma mudança na cultura do trabalho. Indústrias dispensaram funcionários, o home office chegou e com isso ocorreu uma perda de faturamento. O começo foi complicado, pois tínhamos custos fixos, mas buscamos alternativas. Fizemos renegociações, utilizamos as medidas provisórias que o governo estabeleceu e assim evitamos dispensar pessoas. Buscamos fazer um controle de caixa e sempre acreditamos na melhora do segmento.
Conforme a pandemia prosseguiu, tivemos que nos reinventar. Reinventamos o produto, simplificando-o para atender os clientes, afinal, eles também sofreram com a pandemia. A Premium esteve aberta para acolhê-los. Oferecemos uma refeição mais barata, mas de qualidade, renegociando e sem perder o cliente. Trabalhamos muito esse relacionamento durante a pandemia e aos poucos, conforme a indústria retomava, o cliente também voltava.
Veja mais: Para 78%, pandemia expôs uma necessidade urgente de trabalho flexível
Sobrevive da crise quem se reinventa. As oportunidades nascem das crises. Aqui na Premium, soubemos aproveitar várias delas, fazendo novos produtos – o que inclui uma linha de congelados. Desenvolvemos um cardápio com diversas opções de marmitas.
O resultado de tudo isso foi bem bacana. No segundo semestre de 2020 voltamos a crescer de uma forma surpreendente. Nosso comercial seguiu trabalhando e investimos no relacionamento com os prospects, porque sabíamos que as coisas iriam voltar um dia. A Premium se dispôs a oferecer soluções neste novo cenário.
RH Pra Você: E essa reestruturação chegou ao RH?
Caroline (foto abaixo): Em termos de RH, primeiro nós “seguramos a onda”. Não demitimos e, em seguida, diante do cenário de medo que a pandemia trouxe, principalmente porque os colaboradores deveriam ir a campo por ser um serviço operacional, começamos a trabalhar algumas frentes, como ter um RH mais próximo das pessoas.
É um RH que também vai a campo, que oferece apoio psicológico, que estabelece uma relação de proximidade com os profissionais mesmo [com a empresa] estando em diferentes cidades.
RH Pra Você: Ao mesmo tempo em que fazer o negócio sobreviver foi uma preocupação, vocês não deixaram de lado projetos de diversidade, sociais, sustentáveis. Como foi o trabalho para seguir com essas ações mesmo em meio a um momento tão complexo?
Caroline: Isso é top-down. Nossa alta direção reuniu todos os executivos da empresa e sempre teve uma comunicação muito clara, além do pedido para pensarmos estrategicamente. Temos que solucionar os problemas, mas as formas como fazemos isso têm impacto. Então, sempre foi muito exigido não pensar somente no imediato, mas pensar com estratégia, no médio e no longo prazo. Isso é muito trabalhado.
Com a pandemia, foi normal empresas adotarem pensamento a curto prazo, mas aqui trabalhamos a cultura de um outro modo. Precisávamos de ações rápidas, porque o mercado e o caixa exigiam isso, mas organizamos as equipes para planejar o que seria feito não só naquele instante, mas também o que seria feito mais para frente. A alta direção, a gerência e os coordenadores se reuniram com frequência para definir ações. A discussão foi tão fomentada que as soluções surgiram.
Trouxemos, entre outras ações, com o RH à frente, uma plataforma para cuidar da saúde mental dos colaboradores. Para trabalhar com estratégia e poder [diante do cenário de incerteza] trabalhar com uma certa paz, precisávamos pensar na saúde emocional. Nossa diretoria, que tem uma mente muito aberta, aceitou de imediato. Separamos o processual da estratégia. Isso tudo faz parte da cultura organizacional do negócio.
RH Pra Você: Vocês têm algumas iniciativas interessantes, como um trabalho voltado a contratar profissionais 50+, um público que, hoje, tem dificuldades de recolocação. Como funciona na prática? E de que modo isso impacta a cultura organizacional de vocês?
Caroline: O projeto 50+ foi iniciado no auge da pandemia. Dentro da cultura da empresa, é muito trabalhada a discussão em torno dos problemas existentes e quais as melhores soluções para eles. O setor de serviços, como um todo, tem taxa de turnover alta. As pessoas sempre estão buscando outras alternativas e é mais difícil fidelizar o colaborador. Com os dados em mãos, analisamos quem é o público mais suscetível a ir embora e as razões, assim como visamos compreender quem são os colaboradores que mais se mantêm no negócio e o que motiva sua continuidade.
Por meio dos dados e pesquisas identificamos que nosso público acima dos 45 anos valoriza muito o convênio médico, que oferecemos, plano odontológico, o qual oferecemos três níveis, a cesta básica e todos os benefícios que a empresa tem. Não é só o salário e é também a perspectiva de crescimento existente. Temos oferta de cursos e um trabalho de carreira que faz parte da cultura organizacional.
Um dos maiores temores dos profissionais 50+ é que, por conta da idade, as portas do mercado comecem a se fechar. Então, por que, desde já, não pavimentar um caminho para que presente e futuro sejam diversos na questão etária? Afinal, quem ignora o problema hoje, sofrerá com ele amanhã. Para entender mais sobre e também a respeito de treinamentos, confira um papo multigeracional com a sócia da Acalantis, Fran Winandy:
Nosso trabalho passa por engajar os colaboradores, mas também passou por melhorar o recrutamento. Começamos a recrutar profissionais com mais de 50 anos, pois a ação seria mais efetiva e teríamos mais resultado em relação a turnover – que é uma conta alta em finanças e na cultura do negócio. É um projeto de priorização do perfil. Valorizamos a contratação dessas pessoas e isso tem sido bastante efetivo.
São colaboradores que trazem equilíbrio dentro da equipe, harmonia e ensinam os mais jovens a serem mais resilientes, a terem paciência e a entenderem o caminho a ser trilhado dentro da empresa e dentro da cozinha. Em uma cozinha industrial, se não há harmonia e resiliência, o trabalho não funciona.
RH Pra Você: E uma outra iniciativa que vale destacar é o RHUA – RH na Rua, no qual o RH, literalmente, vai para a rua para promover ações de trabalho. Mas que tipo de atuação é realizada?
Caroline: O RHUA tem duas frentes. A primeira delas é trabalhar a questão motivacional e a cultura organizacional da empresa e a outra é a frente do Recrutamento & Seleção in loco. Em relação à motivação, temos equipes com um público muito jovem e um turnover localizado. Para entender o que está acontecendo, o RH precisa ir à fonte. Por mais que nós trabalhemos a liderança das operações, nem sempre há o olhar que o RH tem, e por isso é preciso um apoio.
Vamos a campo. Fazemos uma visita para entender o que, efetivamente, está acontecendo. É preciso alguém do RH para trabalhar melhor o clima organizacional. Fazemos um café ou almoço com o RH e conversamos individual e coletivamente com os colaboradores. Precisamos ouvir as pessoas, as empresas não as escutam.
As pessoas buscam propósito no seu trabalho e sem ele não há como fidelizar um colaborador. Já tive um caso de cozinheiro que não gostava de cozinhar, e quem melhor que o RH para ouvi-lo e ajustar a equipe? Temos que colocar as pessoas certas nos lugares certos. O RHUA faz esse trabalho.
A frente de R&S in loco está relacionada à dificuldade de contratar pessoas. O segmento de serviços como um todo é complexo, então notamos que, com a pandemia, o desafio aumentou. A forma de trabalhar mudou, porque as pessoas estão buscando um trabalho híbrido. Do mesmo modo, o trabalho informal também cresceu e algumas pessoas conseguem medir o quanto precisam trabalhar. Em meio a isso, mais uma vez fomos a campo.
Veja mais: Guiness Book, unicórnio reformulado e PETernidade – Giro do RH #1
Entendemos que o público que buscamos, às vezes, não sabe onde procurar emprego, não tem internet em casa, não tem um celular. A tecnologia é extremamente importante, mas nem todos têm acesso a ela ou sabem como acessar uma plataforma.
Encontramos essas pessoas indo a campo em igrejas, locais de trabalho da assistência social, na prefeitura, na câmara de vereadores, é um trabalho que conta com parcerias com instituições de caridade. Vamos, às vezes, nos pontos de ônibus conversar com as pessoas. Assim, construímos um banco de dados por região e isso beneficia que possamos repor rapidamente quando necessário e ter contratações mais assertivas.
RH Pra Você: Dentro da estrutura da Premium, como o RH é visto pela alta direção?
Caroline: A alta gestão da empresa sempre trouxe para nossa cultura que não somos uma empresa de refeições, mas uma empresa de pessoas. O RH é a área mais importante. A alimentação qualquer outra empresa pode fazer, mas o diferencial está nas pessoas, e elas precisam ser valorizadas. Para isso, o RH precisa ter o seu valor.
O projeto RHUA foi uma iniciativa do próprio RH que a diretoria curtiu e pediu para fazermos acontecer. Há essa liberdade na empresa, o RH tem autonomia para fazer trabalhos, propor ações. Existe um elo muito forte com a alta direção. Meus analistas são escutados, as ideias são debatidas, sempre há feedbacks. Somos as pessoas que cuidam das pessoas.
Foto de capa: Facebook/Premium Essential Kitchen
Por Bruno Piai