De acordo com um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), no Brasil, cerca de 16,8% dos brasileiros com mais de 50 anos já foram vítimas de algum tipo de discriminação por conta da idade. O estudo deixa claro que o etarismo – que se refere ao preconceito moldado por estereótipos de idade – não é um problema exclusivo da população idosa, o que se agrava quando a discussão é levada ao mercado de trabalho.

Em escala corporativa, os 40+ já começam a sentir o peso da segregação e dificuldades para se recolocar, enquanto aqueles que ultrapassaram os 50 anos, segundo pesquisa de 2019 da Robert Half, são preteridos por 69% das organizações. Um levantamento da Hype50 revela, ainda, que quase 40% dos profissionais brasileiros acima dos 55 anos se sentem descartados ou excluídos.

Pavimentar caminhos não é uma opção, é uma necessidade

Dados do IBGE mostram que 14,6 % da população brasileira tem 60 ou mais anos, o que equivale a 30,3 milhões de pessoas. No recorte para 50+, são 54,8 milhões de habitantes. A expectativa de vida média, atualmente, é de 76,8 anos no país. Para efeito de comparação, até 1998, 24 anos atrás, tal índice sequer chegava aos 70 anos.

Para a consultora de Recursos Humanos, Adriana Pinheiro, combater o etarismo no trabalho vai além do aspecto profissional. É também uma questão social de quebra de estigmas, preconceitos e também de construção para que os trabalhadores atuais não se vejam diante do mesmo panorama no futuro. E com o envelhecimento populacional e a maior expectativa de vida, se torna ainda mais evidente a necessidade de abrir portas para o público 50+.

“Criou-se o tal mantra de que uma empresa só é inovadora se contar com jovens. Eu estou na casa dos 30 e não poderia discordar mais. Ser um nativo digital é apenas uma qualidade, mas o mercado de trabalho vai muito além disso. Um time tecnológico, mas formado por pessoas do mesmo perfil, não é um time inovador, que vai saber sair fora da caixa, que vai conseguir compreender as necessidades de diferentes públicos. E mais, temos que parar de pensar que não vamos envelhecer. Hoje, nós não construímos pontes e em breve será nossa vez de nos sentirmos excluídos pelo mercado se não começarmos a mudar as coisas”, destaca.

Na visão da mentora de Carreira & Liderança, Gisele Miranda, o pensamento de que os indivíduos mais novos são mais ágeis, proativos e produtivos não apenas é ultrapassado, como também prejudica profissionais e negócios. “Proatividade, curiosidade e outras características valorizadas pelo mercado de trabalho não dependem de idade, e sim, do perfil de cada pessoa. A idade não define, de forma nenhuma, o que um indivíduo é, nem aquilo que ele é capaz de desempenhar no ambiente de trabalho”, avalia a especialista.

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Cristina Sabbag, sócia, CDO e Researcher da Talento Sênior, destaca que dentro da chamada “Economia Prateada”, que reúne atividades econômicas associadas às necessidades do público 50+ e que é estimada como uma das principais economias do mundo (cerca de US$ 7,1 trilhões anuais movimentados – R$ 1,6 tri anual no Brasil), o mercado perde ao não contar com a expertise de pessoas que conhecem melhor tal público.

“Sobre a resistência e as dificuldades com a tecnologia, saibam que os 50+ estão nas redes e consomem produtos digitais. Segundo dados da pesquisa ‘Webshoppers’, os consumidores 50+, pela primeira vez, foram os que mais fizeram compras online em 2021, totalizando 33,9% dos pedidos e ultrapassando os adultos de 35 a 49 anos, historicamente o maior público que compra pela internet, que responderam por 33,2%, segundo a pesquisa”, salienta.


Muito se fala que o encontro de gerações nas empresas é uma medida positiva para a empresa ampliar sua diversidade. Mas como ele deve ser feito de forma a ser vantajoso para todas as partes? E qual o papel do RH nesse contexto? É sobre isso que Cris Kerr, fundadora da CKZ Diversidade e uma das maiores referências em D&I, vai falar no EncontRHo no dia 07 de julho. É gratuito e online. Se inscreva agora mesmo em https://www.even3.com.br/egee2022/

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Como promover a inclusão?

Segundo Thaís Bento Lima, gerontóloga e parceira científica do Método Supera – Ginástica para o cérebro, para que as empresas, de fato, possam construir times de trabalho mais plurais, o fator idade precisa ser incluído na equação. Para a especialista, muitas vezes é nos profissionais 50+ que os gestores encontram bem desenvolvidas skills que ainda estão em formação nos mais jovens, como resiliência, flexibilidade e capacidade para enfrentar situações problemáticas.

“A pluralidade dentro das empresas deve também considerar o idadismo e, mais do que isso, é preciso haver uma política de inclusão para essas pessoas. Isso não deve apenas ficar no papel ou na divulgação da marca, mas, sim, considerar os números do envelhecimento no Brasil e no mundo”, esclarece.

Para Cristina, o “grande poder humano” será a soma das soft skills com as hard skills. Ou seja, a executiva da Talento Sênior levanta que por mais que as empresas estejam se tornando mais digitais, a avaliação em torno dos profissionais que farão a diferença não deve se resumir à crença de que jovens aprendem mais rapidamente a serem tecnológicos.

“Tecnologia é um conceito muito amplo. Um processo novo, um novo jeito de fazer, são inovações que precisam ser implementadas e treinadas e os 45+ não têm medo disso, porém, estão sendo colocados à margem das novas ações por preconceito, por capacitismo. Esse público se mostra muito mais aberto a experimentar tecnologia. Porém, mesmo com tantos dados que provam o contrário, o mercado ainda atribui a eles a falsa ideia de resistência em aprimorar seus conhecimentos tecnológicos. Superar estereótipos etários é o maior desejo dos profissionais 45+”, elucida.

No processo de promoção da inclusão 50+ (ou já 40+, dependendo do cenário), para que seu potencial seja melhor aproveitado e também potencializado, Thaisa Batista, fundadora da abler, startup voltada a soluções para recrutamento, pontua que investir em tecnologias inclusivas e intuitivas favorece que os programas de seleção e também de capacitação tenham resultados mais concretos e que as empresas tenham maior assertividade no desenvolvimento de seus colaboradores.

Além disso, para ela, aos poucos o mercado começa a compreender o quanto o mix geracional só tende a contribuir. “Recentemente pudemos notar que grande parte das organizações e startups têm tido um olhar mais acolhedor, entendendo quais são os valores e os recursos que um profissional mais experiente pode agregar. Então o mercado como um todo tem notado os ganhos ao contratar pessoas com idades mais avançadas”, revela.

Adriana Pinheiro traz à tona que a quebra de estereótipos passa também por compreender que programas de treinamento e capacitação podem ter resultados muito efetivos. “O profissional 50+ não é uma caixa fechada na qual não cabe mais nada dentro. Ele tem muito a aprender e ele quer aprender. Desenvolvê-lo traz tantos resultados quanto desenvolver alguém das gerações Y e Z. E quando você coloca uma geração para aprender com a outra, os benefícios ao negócio são muito poderosos”.

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Por sua vez, Gisele Miranda acrescenta que as empresas darem oportunidades a esses profissionais ajuda a melhorar os índices de diversidade, hoje um aspecto muito valorizado no mundo corporativo, a ter maior proeminência no mercado e melhorar estratégias de marketing,  e também para lidar melhor com o turnover.

“Na maioria dos casos, os mais jovens- como por exemplo estagiários- ainda estão tentando descobrir o que querem fazer da vida, e a chance de rotatividade e troca constante de funcionários é maior.”

Por fim, Adriana recorda que promover a inclusão é deixar de lado as acomodações. “Se sua empresa terá cortes, o rendimento precisa ser o critério, não a idade. Além disso, profissionais 50+ também querem crescer, desenvolver conhecimentos, ter a oportunidade de serem promovidos e contar com um plano de carreira estabelecido. Não é contratá-los por contratar, é oferecer dignidade”, diz.

Por Bruno Piai