Nas últimas semanas, algumas empresas geraram repercussão por conta de cortes significativos realizados em suas equipes de trabalho. O QuintoAndar foi, talvez, quem mais chamou atenção, uma vez que as 800 demissões realizadas aconteceram pouco depois de uma ação milionária de patrocínio no Big Brother Brasil (BBB).

A justificativa da empresa foi atrelada a um processo de reestruturação interna, o que também foi alegado pela Facily ao demitir cerca de 200 funcionários, e pela Loft, concorrente direta do QuintoAndar no mercado de aluguel e venda de imóveis, que dispensou mais de 150 pessoas. As medidas tomadas pelos três unicórnios não só geraram polêmica, como também trouxeram à tona o debate da humanização no processo de demissão.

Segundo o CEO da consultoria Trilha Carreira, Bruno Martins, o desligamento em massa nunca é um processo simples ou fácil de ser conduzido, mas é possível amenizar seus efeitos com o apoio de equipes qualificadas e com o uso de metodologias capazes de gerar o que chamamos de demissão humanizada

“Nesse modelo, a empresa adota medidas bilaterais para demonstrar empatia e respeito, tranquilizar e apoiar os colaboradores no processo de transição de carreira. Alguns exemplos são: pacotes estendidos de benefícios, como planos de saúde para toda a família, e treinamento online para atualização e capacitação”, analisa.

De acordo com estudos realizados pela Sales Benchmark Index (SBI), profissionais de RH passam oito vezes mais tempo estruturando o processo de admissão em relação ao de desligamento. Já a Aberdeen Strategy & Research revela, em pesquisa, que apenas 29% das empresas entrevistadas possuíam um offboarding (tudo o que envolve o processo de desligamento de um colaborador) estruturado.

“Ao implementar o offboarding, você reduz a possibilidade de conflitos com o ex-colaborador, seja com demandas judiciais ou outras atitudes vingativas contra a empresa”, explica a especialista em direito para startups do Lage & Oliveira Advogados, Lorena Lage.

Veja mais: Desligamentos em massa: onde as empresas estão errando tanto?

Outplacement

As sugestões trazidas por Martins (foto abaixo) como ações a serem realizadas pelas empresas durante o desligamento fazem parte do chamado outplacement, definido pela advogada como “uma metodologia que visa instruir e capacitar os colaboradores que foram demitidos da empresa para que possam ser realocados profissionalmente no mercado”. 

Bruno Martins - CEO Triha carreira

As vantagens da iniciativa valem tanto para as empresas quanto para os colaboradores. No primeiro caso, a organização não só reforça a sua marca empregadora, como também corre menos riscos jurídicos, enquanto para os empregados, eles podem ter algumas garantias enquanto buscam por uma nova oportunidade de trabalho.

A ideia central é ajudar o colaborador a se reorganizar e atingir novas metas em sua carreira, tendo como primeiro passo oferecer apoio psicológico para que ele saiba lidar com a demissão da melhor forma e também identifique os próximos objetivos. Neste momento muitas pessoas descobrem que, na verdade, querem mudar de área (transição de carreira) ou abrir a própria empresa, seguir caminhos diferentes daquele que estava sendo trilhado. Com isso em mente, o próximo passo é oferecer o apoio de orientadores e profissionais especializados para traçar um novo plano de carreira para o colaborador”, pontua Martins.

Ainda de acordo com CEO da Trilha Carreira, o outplacement, quando bem executado, pode, inclusive, auxiliar para que o profissional dispensado volte ao mercado mais preparado.

“Algumas empresas optam por começar o outplacement antes mesmo da demissão para encontrar a melhor forma de dar a notícia. Essa metodologia também favorece a redução do número de processos trabalhistas, porque presta apoio ao colaborador mesmo após o seu desligamento. Os valores institucionais são reforçados e o impacto da demissão na equipe que ainda continuará trabalhando na organização é minimizado. A imagem da corporação também se mantém positiva no mercado, o que é imprescindível atualmente”, destaca. “Não é à toa que, conforme relatório da Verified Market Research, a movimentação do mercado global de serviços de outplacement deve chegar a US$ 2,37 bilhões até 2025”, acrescenta Lorena.

Para Jorge Martins (foto abaixo), CEO da Bullseye Executive Search, seja qual for o motivo da demissão – ou o fato do desligamento ser individual ou coletivo -, as empresas devem ser transparentes com os colaboradores. “As pessoas não devem ser tratadas como objetos. Demonstrar respeito e empatia no momento do anúncio de demissão faz com que aquela pessoa não se sinta tão mal”, comenta.

Jorge Martins Bullseye

O executivo elucida alguns pontos que não podem ser deixados de lado no momento da notícia da demissão ser dada. São eles:

Feedback

1 – Seja educado e claro sobre as razões da demissão. Muitas vezes o feedback ajuda no desenvolvimento daquele profissional;

Desligamento

2 – Escolha um lugar, preferencialmente, com privacidade e de forma presencial. Caso o funcionário esteja em outra cidade e não seja possível, marque uma reunião online e explique que está sendo feito dessa forma em função da especificidade de vaga;

Empatia

3 – Esteja aberto para ouvir o funcionário. Muitas vezes a pessoa pode ser mais reativa, ficar emotiva ou ainda em choque. Ter a empatia para entender que cada um reage de uma forma e tentar contornar da melhor maneira é o ideal a ser feito;

Líder

4 – Se você é o líder não deixe que outra pessoa da equipe faça o comunicado. A responsabilidade deve ser da liderança.

Comunicado

5 – Comunicar à equipe sobre o desligamento. Essa atitude é importante para evitar comentários e elucubrações sobre o motivo da demissão. Seja respeitoso com quem está saindo da empresa, fale das contribuições positivas, mas que foi necessário o desligamento.

“Embora seja um momento delicado para ambos, é possível conduzir de uma maneira muito respeitosa, onde os dois lados tenham aprendizado”, diz.

Veja mais: A importância de humanizar o processo de desligamento do colaborador

Cuidados jurídicos

A especialista em direito para startups deixa claro que não basta somente realizar um outplacement para que a demissão seja humanizada e bem encaminhada. Acima disso, todas as obrigações trabalhistas devem ser cumpridas. Ela aconselha que os empregadores tomem todos os cuidados necessários, como se certificar de que todos os pagamentos sejam realizados ao colaborador.

“No caso dos empregados CLT, por exemplo, é necessário verificar todos os benefícios e as verbas rescisórias a que eles têm direito. Além disso, é importante que os pontos altos da conversa com o funcionário sejam documentados, preservando a segurança jurídica da instituição”, finaliza Lorena.

Por Bruno Piai