Muito tem se falado sobre as dificuldades estruturais que as empresas brasileiras estão encontrando para gerenciar grandes contingentes de funcionários em home office. Em um período de dois meses, elas precisaram adequar quase todos os seus processos habituais a uma nova forma de interação – a digital, que antes era restrita a poucas atividades, como reuniões com clientes ou parceiros no exterior.

Uma pesquisa da empresa de monitoramento de mercado Hibou em parceria com a plataforma de dados Indico feita no final de março mostrava que quase 60% da força de trabalho brasileira estava em home office. Nesse número, segundo o estudo, estão muitos funcionários de empresas privadas, microempreendedores e até informais. Vão de trabalhadores qualificados, como designers e comunicadores, até manicures que, na crise, atendem em horários específicos na própria casa em que vivem. Todo mundo ligado por ferramentas digitais que vão da complexidade de softwares privados até o WhatsApp.

Por outro lado, a pesquisa mostra que as empresas públicas estão encontrando dificuldades para colocar os servidores em home office — o que é óbvio, já que é de conhecimento comum que, nelas, as tecnologias tardam em chegar. Muitas organizações privadas, ao contrário, já contam com ao menos uma ferramenta digital — e grande parte delas já estava se transformando digitalmente até o início da crise.

Isso tudo mostra que a conexão brasileira, apesar de não poder ser comparada à americana, consegue suportar um aumento exponencial de demanda. Esse era, inclusive, um dos mitos sobre o home office no nosso país que servia como álibi para que ele não fosse implementado. Mais do que isso, revela que as empresas do país têm condições de — fazendo suas transformações digitais — manterem os esquema de trabalho remoto mesmo no mundo pós-pandêmico.

Essa posição da nossa estrutura é mais bem visualizada quando a comparamos com os vizinhos latino-americanos: nos últimos dias, temos encontrado graves dificuldades de conexão quando precisamos nos comunicar com alguém no Peru ou no Equador, por exemplo — países em que a Apdata está presente.

Em março do ano passado, a principal operadora de telefonia do Equador anunciava, com louros, que estava colocando 800 pessoas uma vez por semana em home office. O “El Comercio”, um dos principais veículos de imprensa do país, precisava explicar aos leitores o que significa “teletrabalho”. Agora, em meio à crise, os problemas de conexão impedem que boa parte das empresas sigam operando: o Instituto Nacional de Estadística y Censos (INEC) publicou no final de março que apenas 8% dos trabalhadores com renda igual ou superior ao salário mínimo nacional estavam conseguindo ficar em home office, enquanto a Asociación de Empresas Proveedoras de Servicios de Internet (Aeprovi) já afirmou que o aumento na demanda por Internet no país é de 25%, enquanto a rede está em vias de saturar.

No Peru, uma das maiores empresas de tecnologia do país sentenciou em um artigo na revista de negócios “Gestión”: não estamos preparados para o teletrabalho. O texto cita uma pesquisa da consultoria Mercer Mash que mostra que apenas 22% das empresas peruanas têm condições de colocar seus funcionários em regime de trabalho remoto. Sem contar o fato do Ministério do Trabalho ter elaborado um guia de trabalho para as organizações às pressas.

Não é diferente mesmo em países mais desenvolvidos da região, como a Argentina e o Chile: no primeiro, 75% são pequenas e médias empresas que, segundo o jornal “La Nación”, não estavam prontas para o home office porque ainda funcionam quase totalmente no analógico. Os problemas só não são maiores porque há um consenso que a estrutura de acesso à web é boa. A situação é semelhante entre as empresas chilenas.

Essa é uma oportunidade para que as organizações latino-americanas entendam a importância de se transformarem em direção ao digital e, no caso do Brasil, de expandir uma tendência que, até o início da pandemia, já era significativa.

Por Roberto Bertolo, Diretor de Negócios Internacionais da Apdata