Este espaço tão especial que o RH Pra Você me concede tem por objetivo trazer momentos de reflexão. Mais do que informação, o propósito é provocar um olhar que vai além do que está escrito aqui alcançando os recantos de sua própria forma de ver o mundo, os negócios, as pessoas e a si mesmo(a).
Esta proposta condiz com a intenção que carrego de poder proporcionar, em cada interação que tenho com meus amigos, familiares, seguidores, leitores e toda a comunidade de RH e Liderança caminhos que permitem encontrar formas de criar transformações intencionais.
Há muito tempo, pelo menos 15 anos, que tenho dedicado minha vida profissional e meus estudos ao entendimento das relações humanas e seu contexto. Diante disso cheguei à uma conclusão: Se o básico não for bem feito, tenderemos a enfrentar desdobramentos desafiadores que exigem constante atenção sem que nunca chegam a ser realmente resolvidos.
Por esta razão, venho defendendo a necessidade de se compreender a relação do fruto desejado, da semente e do terreno, sendo esta a metáfora inicial dos processos de raciocínio e compreensão dos fatores que devemos cuidar para que tenhamos condições de encontrar respostas que atendam aos nossos desafios por um olhar sistêmico.
Como professor convidado da BSP já tratei em aulas, na pós-graduação, do tema da
complexidade e da integração de sistemas. As provocações deste curso têm por base a mesma metáfora acima, com a qual convido cada aluno a visitar a base dos conceitos que permitem uma correta compreensão do tema tratado.
A você quero fazer o mesmo convite, trazer seu olhar para o terreno de onde potencialmente os seus desafios, como líder e como praticante do mundo das relações humanas (RH), emergem.
Se pensarmos, por exemplo, em temáticas como politicas de prevenção nas empresas, demissões espontâneas motivadas por uma busca de melhores oportunidades, movimentos em prol de semanas com 4 dias de trabalho dentre outras possivelmente encontraremos suas raízes abaixo do nosso olhar inicial.
Um tema transversal a estes movimentos mencionados é o do bem-estar. Esse, por sua vez, pode ter suas raízes fincadas na recente compreensão de que aqueles que trabalham nas companhias são seres humanos, desafiando uma velha máxima atribuída a Henry Ford, em que dizia precisar dos braços de seus empregados, mas que lamentavelmente os mesmos vinham acompanhados de seus cérebros.
Atualmente, eles vem acompanhados de todo o corpo e alma e assim carregam suas necessidades naturais. Parece um tanto quanto estranho falar isso, pois, afinal,
ninguém nunca viu apenas braços trabalhando (a não ser os dos robôs), pois eles estavam sempre coladinhos aos corpos de seus donos.
Contudo, mesmo que um todo esteja disponível aos olhos do ser humano, acabamos vendo apenas aquilo que nos interessa. O interesse por ver o ser humano de forma mais ampla pode ter suas razões compreendidas em uma fórmula muito simples, embora profunda: performance = potencial – interferência, criada por Timothy Gallwey.
Entender o ser humano, mesmo que aos poucos, em sua completude é diminuir o nível de interferências que potencialmente atrapalham a performance de cada empregado. Assim, compreender que se deve desconectar para reconectar-se, que menos dias podem significar mais performance, que uma liderança que se debruça sobre as relações humanas criadas dentro das equipes e entre as equipes ameniza atritos desnecessários e traz à mesa os temas mais importantes exige um olhar diferente do que aquele criado nos primórdios da industrialização e que se atualiza, hoje, tal qual os aplicativos em nossos celulares.
Trata-se de uma nova postura para todos, independentemente de sua atribuição profissional. Requer a habilidade de, constantemente, olhar para si mesmo ao mesmo tempo que se olha para o seu contexto e o compreende com uma visão de mundo que busca saber coisas novas, inclusive aquilo sobre o que já se sabe.
Embora estejamos em um ritmo alucinado de descobertas tecnológicas, não há descoberta mais transformadora do que se descobrir. Não se trata de fazer um curso de autoconhecimento e ter o tema dado por finalizado. Estou falando de um processo para a vida toda, uma postura quase que filosófica sobre si mesmo e a vida, com a qual se busca a “verdade”, uma aproximação do seu “eu” com a realidade que se expande ao passo que nos expandimos.
Com esse olhar para si e para o todo, ao mesmo tempo, devemos abordar todas as nossas questões, pessoais e profissionais, ganhando, aos poucos, frações de liberdade. Um bom indicador de que a liberdade que você tem e exerce é na verdade bastante limitada pode ser, incialmente, revelada com algumas observações.
1) Veja se as suas decisões são resultados de seus afetos imediatos, isso é ao traduzir a sua experiência do momento em um sentimento, você decide fazer algo a partir de tal sentimento ou decide por causa do sentimento? Desde a compra de alguma coisa ao empreendimento em uma nova carreira são movidos pelo o que você está sentindo no momento ou o que você está sentindo é um indicador que você observa atentamente para compreender suas razões?
2) Ao emitir uma opinião (as redes sociais têm muitos exemplos disso) ela veio de uma análise sobre o tema ou foi apenas o seu ponto de vista expresso de forma superficial? Isso não se aplica apenas às redes sociais e, sim, a tudo que você encara no seu dia a dia, seja uma temática tratada em uma reunião na empresa ou sobre uma conversa à mesa do jantar. Recentemente, em um dos meus clientes, trabalhamos o Livro de Patrick Lencioni, Os 5 desafios das equipes, dentro do qual trabalhamos todos os níveis da pirâmide proposta de forma muito participativa.
Estamos falando, neste caso, de uma equipe 100% sênior e para surpresa deles mesmos, ao chegarmos ao nível do comprometimento (terceiro nível), ficou claro que a essência deste momento estava ainda distante do seu ideal. Este nível exige clareza, um entendimento sobre o significado que todos atribuem ao tema discutido. Isso exige ouvir e falar, conhecer e ponderar, pois quando nossas opiniões são colocadas à prova nos é exigido ter embasamento para “segurar a onda” e dar conta de sustentar o que pensamos. Claro que temos direito a ter opinião, mas partilhá-la, e ainda mais no intuito de convencer alguém pede profundidade, pois de outra forma ficamos na superfície dos debates que levam a pouco progresso.
Somente estas duas observações iniciais nos remetem a uma análise importante sobre as transformações pelas quais estamos passando e pelas quais desejamos passar. Se estamos no comando e compreendemos como nos relacionamos com a vida teremos mais chance de decidir meios para sermos agentes transformadores, pois de outra forma seremos apenas sujeitos das transformações, sem que carreguemos o poder da ação ficando presos unicamente às nossas reações, alienando nossa existência de nossa própria vida.
Os frutos que desejamos virão a partir da compreensão de nosso terreno e das sementes que estamos dispostos a plantar.
Tiago Petreca, diretor fundador e curador chefe da Kuratore – consultoria de educação corporativa, Country Manager da getAbstract Brasil e autor do Livro “Do Mindset ao Mindflow”, Criador do Método Work Life eXperience. É um dos colunistas do RH Pra Você. Foto: Divulgação. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista.