É natural perguntar a uma criança: – O que você quer ser quando crescer?

Quem não ouviu essa pergunta por inúmeras vezes e, conforme a idade você tinha uma resposta diferente, ressalvadas algumas condições atípicas nas quais uma criança já decidiu o que pretende fazer na vida e não muda de opinião com o passar dos anos. Conheço uma sobrinha que é assim, desde cedo sempre disse que queria ser médica. O tempo passou, as fases foram ocorrendo, terminou os estudos básicos e está fazendo medicina. Acredito que pessoas assim foram predestinadas por alguma razão nem sempre clara, podendo ser uma inspiração oriunda em vidas passadas, ou alguma influência de alguém ou uma associação com uma atividade relacionada ao seu sentido da vida.

Mais importante do que fazer medicina e ter os benefícios gerado pela profissão, o mais importante é realizar algo que tenha a ver com a mais profunda vocação, vinculada ao estado de ser. Assim, a trilogia do ter, fazer e ser, ganha uma direção, pois em primeiro lugar vem o ser: eu sou médico, eu sou um prestador de serviços, eu sou alguém predestinado a servir às outras pessoas.

Depois do “Eu sou”, a conjugação é “Eu faço”, fase de concretização do objetivo vinculado ao desejo que vem da alma, do coração, e por último, o “Ter”, passa a ser uma consequência de uma vida predestinada ao tipo de atividade que gera uma profunda realização interior, quer sejam financeiros, sociais, psicológicos da empreitada escolhida.

Quantas pessoas há que não fazem o que gostam; aliás, detestam o que fazem, lamentam sua sorte, são infelizes porque não realizam seus sonhos e fazem algo em troca de uma segurança financeira ou medo de arriscarem algo que seria, em princípio, mais interessante. Aliás, um bom caminho para a percepção de que se está no rumo certo, é ter clareza daquilo que gosta e ir nesse caminho ou aprender a gostar daquilo que faz, sentir prazer em realizar o que realiza, acordar cedo e não perceber o trabalho como um fardo a ser carregado, mas ter, logo cedo, a satisfação de fazer algo prazeroso.

Uma das melhores formas para ter essa nítida percepção se está ou não fazendo a coisa certa, é vislumbrar o futuro e verificar o resultado do impacto do seu esforço e trabalho na vida das pessoas impactadas pelo que você fez.

Existe uma diferença entre propósito e legado. Enquanto legado é o que você pretende deixar para o mundo a partir do que escolheu fazer, propósito trata-se das razões pelas quais você pretende deixar como legado. Explicando melhor: enquanto o propósito tem a ver com seu estado interior, com sua consciência, sua decisão e escolha, o legado é a edificação no mundo exterior, como consequência daquilo que fez ou pretende fazer.

Uma boa forma de entender o legado é ver-se no final da sua vida de forma otimista, vivendo muito tempo e tendo feito grandes realizações; ao olhar para trás, antes de se despedir deste mundo, ter a convicção de que sua escolha foi certa, realizando o que seria importante para você fazer.

Há um filme que mostra bem essa situação: “O Resgate do Soldado Ryan”, de 1998, que conta a história de um capitão que tem a missão de comandar um batalhão para resgatar o soldado James Ryan, caçula de quatro irmãos, dentre os quais três morreram em combate. Durante o resgate, em confronto com soldados alemães, seu salvador, o soldado Miller, quem tomou um tiro para salvar o soldado Ryan, antes de morrer profere suas últimas palavras: “faça por merecer”. A cena volta para tempos atuais: Ryan, já envelhecido e veterano de guerra, diante do túmulo do soldado Miller, grato por ter dado a ele a oportunidade de viver e emocionado, pergunta à sua esposa se ele fez por merecer.

O momento mais emocionante do filme, quando ela olha para ele, os dois conectados e ela diz: – Sim, Ryan, você fez por merecer, foi um homem bom e fez sempre o melhor que pode. Você fez por merecer, e, desse modo, a câmara se afasta e o filme termina, mas deixa a quem o assiste a mensagem indelével do quão é importante ao olhar para todo o passado, ter a consciência de ter feito o que precisava ter feito, de ter tomado as decisões certas e coerentes com o propósito de vida. É, sem dúvida um bom exemplo de legado: o que se deixa a partir das ações do dia a dia, em especial da escolha para a carreira ou profissão.

No trabalho que realizo, felizmente tenho a sensação de que estou alinhado ao meu propósito de servir às pessoas para que sejam melhores no que escolheram fazer, apoiando-as para utilizarem seus recursos para seu sucesso na vida pessoal e profissional. Os caminhos que estão no entorno desse objetivo são a comunicação e a preparação de palestrantes ou pessoas que precisam melhorar sua performance para fazerem valer o seu potencial e influenciarem outras pessoas, por meio de negociações, vendas, liderança, apresentações, aulas, discursos e palestras.

Tenho estimulado esse questionamento sobre legado, provocando-as a pensarem a respeito dessas perguntas:

  • Qual é o legado que pretende deixar para o mundo? Entenda-se mundo sua esfera de influência, sua família, seus amigos, seus colaboradores, seus colegas de trabalho, as pessoas com as quais convive.
  • Quando você morrer, o que gostaria que estivesse escrito sobre você, em sua lápide?
  • Qual é a contribuição que pretende deixar ao planeta? Como pode deixá-lo melhor do que o encontrou?
  • Quais as crenças que você tem e que te impulsionam a fazer o que escolheu fazer? No caso de palestrante, qual o impacto que deseja deixar nas pessoas que assistirão as suas palestras?
  • Quais são os valores que alicerçam as escolhas que faz na vida. Mais do que isso, ao fazer escolhas e tomar decisões, leva em consideração essas energias advindas dos seus valores?

Como sugestão, mesmo que não tenha a resposta de bate-pronto, proponho que faça um exercício, sabendo que, como seres humanos flexíveis estamos sempre aberto a mudanças de ideias ou caminhos escolhidos, o que não significa dizer que não podemos fazer escolhas nem decidir nossa trajetória, no nosso entendimento, nos farão mais realizados e felizes, definindo para si mesmo, esses passos:

  1. Defina, claramente o que você quer. Pode ser uma carreira, uma profissão, algo que tenha a ver com um chamado ou uma vocação, algo que seja maior até do que você mesmo.
  2. Analisar os prós e contras, verificando o que lhe falta para atingir esse objetivo, avaliando o que já possui como recursos (físicos, materiais, psicológicos, tempo etc.) e fazer um plano de ação para direcionar sua vida nesse sentido.
  3. Focar, escolher algo sempre tem a ver com abrir mão de outras coisas que podem ocupar seu tempo. Não dá para fazer tudo o que sonhamos ou desejamos. Por isso, a escolha deve considerar a importância e magnitude do que pretende com o objetivo definido.
  4. Agir. Colocar em ação o plano é construir, passo a passo, aquilo que deseja. Pode até ser que faça alguma alteração na caminhada, pois o processo é dinâmico e está à mercê das circunstâncias que te envolvem e rodeiam seu sonho de legado.
  5. Desfrute, procure sentir o prazer de fazer algo seu, importante, significativo, sem a pretensão de receber elogios ou reconhecimentos, mas por fazer algo que tem a ver com você, com a sua vida, com o que julga mais importante e sagrado para deixar para os seus descendentes, para as próximas gerações, para a sua história pessoal e, ao final da sua vida, possa olhar para trás e você mesmo tomar a consciência de que foi a coisa mais certa possível a ser feita, sem um pingo de arrependimento e, se pudesse voltar, faria tudo de novo, acreditando que fez tudo o que pode para a vida ter valido a pena ser vivida.

Reinaldo Passadori, Professor de Oratória e Escritor, Mentor, fundador e CEO da Passadori Comunicação, Liderança e Negociação. Adaptação do seu livro ‘Quem Não Comunica Não Lidera’ – Ed. Passadori. É um dos colunista do RH Pra Você. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.