O grau de sofrimento é grande e nós nos recusamos a ver o óbvio: é preciso compartilharmos afeto dentro das empresas. Embora seja tão simples e cognitivamente todos concordem com isso, os comportamentos mostram que muitas vezes não nos comportamos assim.

Recomendo um simples exercício, que é repetir, internamente, esta afirmação algumas vezes e ver o que acontece: “Precisamos compartilhar afeto dentro das empresas!” Esteja atento/a, pois talvez vozes surjam em você, como: “Não é assim que funciona”; “Não é bem assim”; “Empresa não é para isso”; entre tantas outras. Sentimentos de desconforto, de incredulidade e de apatia podem também emergir deste exercício.

Isso significa que alguma parte, provavelmente inconsciente, não acredita nesta ideia, e, portanto, age contra. É preciso uma grande disposição interna para investigar que parte nossa não acredita e o porquê.  Normalmente isso surge a partir de experiências passadas, que geraram feridas/marcas, e que necessitam ser reconhecidas, compreendidas e transformadas.

Ter afeto sempre foi importante, mas neste momento de burnout, indiferença, baixa confiança, pandemia sem fim, desafios econômicos, polarização, mudanças climáticas, afastamento social, ele é a tábua de salvação para atravessarmos tudo isso, com saúde mental e ânimo de viver positivamente.

Afeto é cuidado, ajuda, empatia, gentileza, compaixão, doação, etc. Ele envolve, no mínimo, duas variáveis: ação correta/amorosa e intencionalidade positiva. Também se preocupa com as consequências da ação, para que sejam positivas. Também chamo este afeto de ética, onde a ação, a intenção e a consequência da ação são positivas, lastreadas nos valores humanos.

Claro que na empresa temos que fazer a nossa parte, que vou chamar aqui de técnica: estudar o mercado, planejar, liderar, unir, criar, produzir, vender, entregar e tudo mais, de forma muito bem-feita. Mas também precisamos focar verdadeiramente na qualidade das relações e no afeto. Compliance, performance, liderança, governança, trabalho em equipe, diversidade, inclusão, gestão de pessoas, todos devem dar atenção ao afeto.  E afeto se manifesta no que é feito, no como e no porquê.

Otto Scharmer, professor do MIT, mostra que onde se coloca a atenção é para onde a energia do sistema (ou empresa) irá. Se colocamos a nossa atenção na parte técnica, sem afeto verdadeiro, estamos fadados a gerar sofrimento, em nós e nos outros.

Precisamos criar espaços de afeto, de acolhimento dentro da empresa, para que sejamos vistos, reconhecidos e amados. Ver o outro e senti-lo junto, presente, nos ajuda e nos dá força. A aliança consciente entre a parte técnica e o afeto é que nos permitirá atravessar todas as tormentas e dificuldades do caminho.

O afeto também alimenta a autoconfiança, elemento básico para nos sentirmos felizes. Claro que é fundamental também compartilharmos afeto fora das empresas. Aliás, afeto é fundamental em tudo. Eu não tenho dúvida, nem vergonha, nem medo do que os outros irão pensar, ao afirmar que eu quero muito afeto, fora e dentro da empresa. E de trabalhar firmemente para isso. E você?

Eduardo Farah é sócio da Invok e professor na FGV. É um dos colunistas do RH Pra Você. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.