2”+”1 = 21! Opa! Errei na conta? Pelo viés da matemática, certamente, mas pelo viés da
criatividade não. No dia 21 (A união e não a soma de 2 e 1) comemora-se o Dia Mundial da Criatividade, que veio à luz pela ideia e ação de um brasileiro, Lucas Foster, em 2014 (2+0+1+4 = 7, que também significa infinito. Aquele símbolo ∞ que conhecemos, que representa o mesmo, não é um número 8 😉

Exige criatividade falar de criatividade. Talvez eu não a tenha tanto para este artigo uma vez que o faço indo contra o que defenderei aqui. Inconsistência de minha parte? Depende do olhar, pode ser que sim, pode ser que não. O fato de “poder,” no âmbito da possibilidade, é justamente onde, ao meu ver, mora a criatividade, afinal se não é possível, já na largada, a criatividade morreu. Mas, não poderíamos usar a criatividade para fazer o que era ou parecia impossível tornar-se possível? Se sim, então a criatividade renasce.

Quero agora desdobrar um pouco do que falei no parágrafo anterior. Quando digo que faço aqui algo que afronta o que defenderei é porque o farei sozinho. Mas, não dá para ser criativo sozinho? Veja tantos artistas e pessoas tidas como criativas neste mundão e que fizeram tudo isso sozinhos. O que parece não é necessariamente, ou para usar um ditado antigo: “Nem tudo que reluz é ouro.” (Pouco criativo, eu sei, mas avisei!).

Explico! Vamos pegar Michelangelo, um hábil criativo do século 15. Quando ele esculpiu suas obras o fez com suas mãos. Pietá é obra de sua habilidade em traduzir imaginação em arte! Por mais que a beleza de suas criações veio, aparentemente de seu esforço solitário, o que de fato aconteceu na execução, suas habilidades foram aprimoradas ao longo do tempo com a ajuda de mentores. Na época de Michelangelo existiam as Guildas, conforme explica Daniel Coyle em seu livro “O Código do Talento” (Editora A negócios):

“(…) Florença foi o centro irradiador de uma poderosa invenção social – as guildas. Guildas eram associações de tecelões, pintores, ourives e outros artesãos ou artistas que se organizavam para regular a concorrência e controlar a qualidade do que era produzido. Assemelhavam-se a cooperativas. (…) O que faziam melhor, contudo, era cultivar o talento.”

E continua, Daniel Coyle, agora sobre Michelangelo:

“Dos seis aos dez anos, ele viveu com a família de um artesão que cortava e talhava pedras. Nessa casa de família, aprendeu a manejar um martelo e um cinzel antes mesmo de saber ler e escrever. Após uma breve e infeliz tentativa de escolarização, ele se tornou aprendiz de Ghirlandaio. Trabalhava nas grandes encomendas, fazendo esboços, copiando e preparando afrescos numa das maiores igrejas de Florença. Em seguida estudou com o mestre escultor Bertoldo e teve como professores outros expoentes, na casa de Lorenzo de Médici, onde morou até os 17 anos.”

Da mesma forma, Leonardo da Vinci estudou sob a supervisão de Verrocchio, este sob a de Donatello, que por sua vez, sob a de Ghiberti e aquele de Michelangelo, Ghirlandaio, sob a supervisão de Baldovinetti.

Então criatividade trata-se de arte, certo? Não. A arte é um dos meios, vamos dizer, clássicos da expressão criativa. Contudo, nos dias atuais, criatividade é uma habilidade necessária em todos os setores. Quanto mais o mundo se conecta, hiperconecta, mais complexo ele fica. Veja o que diz Edgar Morin em sua incrível obra “O Método 5” (Editora Sulina):

“(…): cada ser humano dispõe cerebralmente de todas as potencialidades inteligentes, mas predisposições hereditárias, determinações familiares, culturais, históricas, acontecimentos ou acidentes pessoais limitam-nas, inibem o exercício ou, ao contrário, estimulam-nas. Insuficiência de complexidade e de adversidade atrofiam a inteligência, mas complexidade em demasia e adversidade em demasia esmagam-na.”

Vale lembrar então que inteligência tem em sua origem a palavra Intelligere, cujo prefixo “inter” significa “entre” e “legere,” “escolha.” Inteligência, como diria a Professora Lucia Helena Galvão, é então a capacidade de “escolher dentre.”

Assim estamos experimentando um paradoxo. No momento em que mais precisamos de criatividade para lidar com a enormidade de problemas, que vão desde uma escala global ao nível pessoal, é também o momento em que menos temos a verdadeira união (daquela que 2+1 vira 21). No Mundo digital a polarização é extrema abrindo um vácuo enorme entre tais pólos que as opções de escolha vão ficando menores, não porque elas não existem e sim porque o imaginário das pessoas vai atrofiando, ficando cada vez mais arraigado a opiniões construídas sem base de conhecimento, apoiadas em opiniões alheias dispersadas pelas redes sociais, que por sua vez filtram aquilo que cada um vê no intuito de levar somente aquilo que se deseja consumir
afunilando ainda mais a diversidade de informações a um espectro que impede a construção de um pensamento critico e com este a capacidade de de se sentar à mesa civilizadamente para trocar ideias diferentes e que por suas diferenças trazem o potencial criativo, do qual nascem as múltiplas possibilidades de solução, de que tanto carecemos hoje.

Nossos Ghirlandaio, Baldovinetti e Ghiberti de hoje são breves vídeos e posts que não tem a menor competência de instruir, corrigir, ajudar e promover a aprendizagem profunda para a criação de um berço que acolha uma criatividade tão necessária para a situação social que enfrentamos hoje.

A criatividade, da maneira que vejo, deve ser meio para solucionarmos nossa  convivência planetária e individual, de maneira que se baseie na tolerância, no respeito à quem sabe mais pois tem mais experiência e estudos, na humildade para ouvir e refletir sobre a própria vida e buscar se colocar no papel mais adequado dentro do qual seu talento se torna meio para a construção de um lugar mais adequado para todos vivermos. Criatividade que nasce de um pensar próprio, profundo, apropriado porque houve interesse em aprender, entender, conhecer antes de formar uma opinião e muito antes de expressar tal opinião. Criar a partir de uma opinião infundada é expressar o que não é seu.

Criatividade vem do que unimos para gerarmos caminhos que permitam nos unirmos ainda mais, ao ponto de entendermos que somos um só planeta, constituído da diversidade necessária para promover as soluções dos problemas que nós mesmos criamos.

Tiago Petreca, diretor fundador e curador chefe da Kuratore – consultoria de educação corporativa, Country Manager da getAbstract Brasil e autor do Livro “Do Mindset ao Mindflow”. É um dos colunistas do RH Pra Você. Foto: Divulgação. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista.