Ao longo dos meus setênios  (teoria que defende que a vida é dividida em fases de sete anos e cada um desses ciclos traz novos conhecimentos, incorporando os já absorvidos em fases anteriores), apoiando pessoas e profissionais no seu processo de autoconhecimento e desenvolvimento e também observando a mim mesmo, nas minhas limitações e nos meus acertos,  percebo que um dos maiores desafios é viver em conformidade com aquilo que acreditamos e falamos.

De um lado, dar conselhos sobre ter paciência, ser uma pessoa corajosa, generosa, leal, confiável, esforçada é a coisa mais fácil do mundo. Do outro lado, as ações empreendidas nem sempre refletem, na prática, o que foi dito, tanto que há um pensamento popular que diz: “falar é fácil; difícil é fazer”.

Um exemplo que me ocorre é de uma pessoa do meu convívio, cujos discursos sobre respeito ao próximo, aceitar as diferenças, falar a verdade são extraordinários, mas, na hora H, seu comportamento é diametralmente oposto ao que fala:  é extremamente preconceituosa em relação a gênero, etnia, tem o hábito de criticar, faz maledicências, é falsa e mente com muita facilidade. Fala uma coisa e faz outra.

Sobre isso, cursando Pós Graduação em Comportamento Organizacional na PUC, tive a incumbência de fazer um trabalho cujo título era “A teoria da Dissonância Cognitiva de Leon Festinger”. Essa teoria sustenta que uma pessoa fica em conflito quando tem dois ou mais elementos que não sejam coerentes, ou seja, quando tem uma opinião ou adota um comportamento incoerente com sua opinião, ocorre uma dissonância.

Um bom exemplo e bastante fácil de entender esse conflito é quando tenho duas alternativas para uma decisão. Talvez, o caso mais clássico é se uma pessoa casa ou fica solteira. Enquanto não decide, há um conflito íntimo e esforça-se para estabelecer uma condição de consonância consigo mesma ou com o contexto que a envolve: é como se fossem duas forças opostas bombardeando-a ora em uma, ora em outra direção, e essa indecisão gera o desconforto ou o conflito.

De um lado, o pensamento é…

–  Devo me casar. Encontrei a pessoa certa e acredito que seremos felizes; formarei minha família, atenderei a todas as expectativas dos meus pais, terei filhos, viverei uma vida normal construirei um bom patrimônio; um dia irei me aposentar e viver bem pelo resto da vida.

Acontece que, do outro lado, como se fosse um antagonista, surge uma voz:

– Casar, para que? Estou tão feliz assim! Minha vida de solteiro(a) é tão boa, tenho uma vida livre, não devo satisfações a ninguém, faço o que desejo, flerto quem quero não suporto dar satisfações e não preciso ficar preso a uma pessoa pelo resto da minha vida. Surgem pensamentos prós e contras diante desse dilema. E assim continua, até que, toma uma decisão: Vou me casar, sabendo que isso implica abandonar todas as outras oportunidades de outros relacionamentos íntimos, casando-se também com a família do noivo ou da noiva, conforme manda o figurino.

Ao tomar essa decisão, naturalmente com a pessoa escolhida, iniciam-se os planos e a vida passa a ter um rumo focado nesse objetivo e algo interessante acontece: há, justificativas para a decisão tomada, do tipo se serei feliz, farei meu cônjuge feliz, terei uma família muito legal, criarei os meus filhos, darei o melhor que puder para eles, viverei com uma outra pessoa repartindo tudo e assim as coisas serão. Ao mesmo tempo em que isso ocorre, iniciam-se as críticas para a decisão não tomada, como por exemplo: era isso mesmo que eu tinha que fazer, imagine só, viver uma vida só, sem deixar um legado, nem filhos. E quando estiver mais velho então, só de pensar em ficar só, fico angustiado. Além disso, uma vida de solteiro(a) é uma vida solitária, certamente ficaria infeliz.

Vamos, agora, imaginar o contrário: decido não me casar, viver livre, leve e solto, tendo a oportunidade de convier e namorar com muitas pessoas, não ter que dar satisfações a ninguém, fazer o que quero, como desejar, do jeito e no tempo que escolher.

Curiosamente, como se reforçando para nós mesmos a decisão tomada, começamos a justificar e a menosprezar a decisão não tomada: imagine só, ter que dar satisfações de tudo que faço, ainda mais se tiver uma pessoa ciumenta do meu lado. Não, isso não é comigo. A maioria das pessoas que conheço e que se casaram ou se separaram estão infelizes. Tenho tudo o que eu quero, e o que mais prezo é minha liberdade; se estivesse casado não poderia ter essa vida extraordinária que tenho.

É o mesmo princípio da fábula da raposa que vê algumas uvas e deseja comê-las, mas não consegue alcançá-las por estar em um vaso em que não cabe o seu focinho. Conclui então que não vale a pena mesmo, porque as uvas estão verdes e azedas. Moral da história: “qualquer tolo pode desprezar o que não pode ter”.

Entender que estamos mais próximos dessas dissonâncias no nosso dia a dia nos permite agirmos de maneira mais coerente com os nossos valores e crenças. E, para isso, há três formas para se eliminar a dissonância:

  1. Substituir uma ou mais crenças, valores, conceitos, comportamentos e atitudes envolvidos na situação dissonante;
  2. Buscar novas informações, ampliar crenças, rever conceitos que irão aumentar a consonância, ou seja, justificativas para a opção escolhida;
  3. Tentar desqualificar, esquecer ou reduzir a importância das cognições que mantém a situação dissonante.

Estudos de neurociência nos ajudam também a viver melhor, notadamente se nossas atitudes e comportamentos forem congruentes com nossos valores e assim, agimos em conformidade com o que nos é mais profundo e sagrado, tomando as decisões mais adequadas.

Uma das formas mais eficazes para a conquista dessa congruência é termos claros nossos propósitos, ou seja, aquilo que nos faz acordar cedo e buscar o que nos é mais precioso: uma causa, um sonho, um objetivo que vale a pena. Além disso, sabermos sobre as nossas crenças e os compromissos assumidos conosco mesmos. Esses critérios funcionam como a seta de uma bússola, apontando sempre na mesma direção, assegurando-nos a certeza de que não haverá conflitos nem agiremos de forma incongruente com nossos pensamentos e sentimentos e, como consequência, viveremos uma vida plena, no momento presente, tendo consciência das nossas emoções e estando em paz com nossas escolhas e decisões.

Reinaldo Passadori, Professor de Oratória e Escritor, Mentor, fundador e CEO da Passadori Comunicação, Liderança e Negociação. Adaptação do seu livro ‘Quem Não Comunica Não Lidera’ – Ed. Passadori. É um dos colunista do RH Pra Você. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.