Zoológicos humanos, também chamados de exposições etnológicas, foram exposições públicas de seres humanos nos séculos XVII,XIX e XX (!), com seres humanos geralmente em um estado “natural”. As exibições enfatizavam as diferenças culturais entre europeus da civilização ocidental e povos não europeus, especialmente indígenas e negros africanos, ou outros povos europeus que praticavam um estilo de vida julgado como primitivo pelo ocidente. Alguns desses zoológicos colocavam populações indígenas em espaços compactados entre grandes macacos. As exposições etnológicas agora são vistas como altamente degradantes.
Fontes: Le monde diplomatique Brasil. Os jardins zoológicos humanos. Nicolas Bancel, Pascal Blanchard,Sandrine Lemaire 1.08.2000 e Wikipedia.
Mas, “eu vejo o futuro repetir o passado, eu vejo um museu de grandes novidades…” Cazuza, O tempo não para
Hoje o cenário: um reality show
O elenco. Pela primeira vez, quase equilibrado entre participantes brancos (onze) e negros (nove pretos e pardos). Que bom! Pode ter sido a primeira reação para alguns e, o contrário, para outros. Mas, de qualquer forma, uma inovação adequada aos tempos atuais e aos clamores de justiça frente ao grito das pessoas negras: “Não estamos conseguindo respirar!”. “Basta de nos matar”.
Uma alternativa para jogar luz sobre a representatividade esperada por 56.2% da população brasileira constituída por negros (pretos e pardos).
Para aqueles que viram a composição do grupo com otimismo, bastaram alguns minutos para inferir que deveriam ter cautela, em suas avaliações.
Uma maioria, entre os nove participantes negros, escolhidos com um perfil muito próximo, com históricos respeitáveis e estilo de fala despreocupado quanto à aproximação e conquista de seus interlocutores.
Ao se verem em um lugar que possibilitava alta exposição, procuraram exercer a representatividade negra.
E o que é Representatividade, senão a ”expressão dos interesses de um grupo (seja uma partido, uma classe, um movimento, uma nação) na figura do representante, de forma que aquele que fala em nome do coletivo o faz comprometido com as demandas e necessidades dos representados. Portanto, falar de representatividade revela o sentido político e ideológico por trás do termo”.
Fonte: Dicionário da Língua Portuguesa e Dicionário de Política de Norberto Bobbio.
Essa expressão dos interesses, na minha opinião, deve ser muito bem cuidada quanto à forma de comunicação. O que falar, revela o direito de livre expressão da sua crença. O como falar pode possibilitar avanços, estagnação ou retroação.
Alguns dos participantes negros definiram a estratégia: “nós contra eles” e aí, tal foi a incorporação da personagem que a estratégia de guerra passou a dominar as mentes de alguns e, tão rápida quanto foi incorporada, também rapidamente levou o primeiro participante negro para fora do reality show.
E esse participante não foi poupado. O que vimos, foi um verdadeiro fratricídio, se considerarmos morte não só a física, mas também a moral, emocional e social. Participantes negros, reduzindo a pó, com palavras e gestos, outro participante negro.
O que está sobressaindo nesse reality é a luta pelo poder naquele espaço midiático, custe o que custar.
Percebe-se claramente como não fazer uma abordagem para reposicionar o que está na mente de pessoas que pensam diferente. Uma evidência para mim, sempre foi “informar, para poder dialogar”. Trazer para o seu lado o seu antagonista; não assustá-lo para que fuja ainda mais da conversa.
Impacto nas empresas
Eu, mulher preta, não aprovo a fala agressiva, os gritos, o achatamento da estima alheia, porque sofro na minha pele, literalmente, sei quais são as consequências e quero neste momento de inflexão, repetindo Nelson Mandela, dizer: “se as pessoas são ensinadas a odiar, também podem ser ensinadas a amar”. Não será pela trilha do ódio que atingiremos este objetivo: Juntos. Negros e Brancos.
O ambiente tóxico, preparado para isto, e estimulado com as chamadas de “seja você mesmo”, “vamos botar fogo no parquinho”, como se naquele espaço, as pessoas pudessem se dissociar do mundo exterior, para sempre. O que ficará, por longo tempo, serão as marcas na mente das pessoas, daquilo que lhes interessava ver desde o início do reality.
Mas, para aqueles que buscam a convergência de direitos entre brancos e negros, ficará um vazio que passará, pois temos muitos exemplos de mestres negros e negras que estão ávidos por dialogar e contar a verdadeira história dos negros na sociedade e reposicionar a nossa imagem, positivamente e usando como estratégia a comunicação não agressiva.
Cultura do cancelamento
Esta edição com a sua formatação está conseguindo reafirmar estereótipos e preconceitos mantidos contra negros e fomentar a cultura do cancelamento, como se uns tivessem o direito e o poder de cancelar outro por rejeitar condutas tidas como reprováveis pela sociedade. Voltamos ao tempo do tribunal do “certo ou errado”.
Esse episódio vai impactar negativamente na trajetória que vem sendo firmada, preparando pessoas para o antirracismo? Apenas nas pessoas que não se derem a oportunidade de analisar que os participantes foram escolhidos para desempenhar papéis desejados pelo idealizador; para manter o status quo, aumentar audiência, ser um circo porque falta pão, e não para reposicionar conceitos na mente da sociedade.
Por Jorgete Lemos, sócia fundadora da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços – Consultoria. É uma das Colunistas do RH Pra Você. O conteúdo desta coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.