Em nosso País, tem sido muito comum o uso do termo saúde corporativa. Curiosamente, ele não consta dos Descritores em Ciências da Saúde da BIREME (https://decs.bvsalud.org/). Ou seja, se fizermos uma busca nas bases de dados de pesquisas em saúde, não vamos encontrar pesquisas sobre “saúde corporativa”. Além disso, se alguém quiser fazer uma publicação científica usando este termo não poderá fazê-lo, pois ele não existe nos Descritores.

Portanto, na minha opinião, ainda se trata de conceito mal definido e utilizado para muitas finalidades. Pode facilitar a comunicação interna nas empresas ou em marketing comercial, mas exige cuidado pois não tem sido utilizado em outros países.

Por outro lado, saúde populacional ou saúde das populações são termos bem definidos e discutidos em vários tratados e livros-texto. Ela pode ser definida como “os desfechos em saúde em um grupo de indivíduos de uma população adstrita, incluindo-se também a distribuição de tais desfechos dentro deste grupo”.  Estes grupos podem ser constituídos por empregados de uma empresa, beneficiários de um plano de saúde, a população de uma cidade, de um estado ou de um país.

A saúde populacional é focada nas pessoas e não na “corporação” e visa contribuir para que as pessoas tenham a oportunidade de viver com boa qualidade de vida durante a maior parte de suas vidas, reduzindo as suas condições patológicas e incapacidades. Pressupõe estratificar a população, elaborar estratégias de ação e definir desfechos desejados.

Naturalmente, a corporação não é uma ilha, pois as pessoas moram, se deslocam, tem seus momentos de lazer, passam por dificuldades financeiras, sociais e de relacionamento. Assim, todo este contexto tem que ser considerado.

Há algumas décadas, o renomado epidemiologista Michael Marmot ressaltou que os determinantes sociais de saúde são os fatores principais relacionados ao bem-estar e o processo de adoecimento da população. Assim, em uma empresa, é importante conhecer como as pessoas moram, se deslocam, se alimentam e como lidam com sua renda.

Às vezes as empresas orientam sobre atividades que estão fora do alcance dos trabalhadores, seja em alimentação, atividade física ou adesão a tratamentos. E os culpam por não se engajarem nas atividades.

Naturalmente, um trabalhador que não tem boas condições de saneamento básico em sua casa, que está “falido” pelas dívidas, que tem dificuldades de deslocamento ou se alimenta mal não aderirá de maneira adequada aos programas “top” oferecidos pelas empresas.

Em todo o mundo, particularmente durante a pandemia de SARS-CoV2, os determinantes sociais de saúde emergiram como o grande tema a se abordado nas empresas, vide a recente conferência da organização Health Enhancement Research Organization (HERO) que reúne as principais corporações mundiais. Nesta conferência, que pude acompanhar, os gestores dos programas de saúde estão cada vez mais abordando este tema, colocando o trabalhador no centro do processo e com profunda integração com o sistema de saúde (atenção primária, registro eletrônico de saúde, gestão de crônicos).

No Brasil, ainda observamos muitos programas em silos, com as áreas de medicina do trabalho e saúde ocupacional, os planos de saúde, as áreas de recursos humanos, as consultorias e o SUS atuando sem sinergia e sem considerar os determinantes sociais de saúde.

O agravamento da crise econômica, com altos níveis de inflação, desemprego e aumento da desigualdade social são sinais de alerta para os gestores de saúde das empresas não ficarem encastelados em suas “corporações”.

Alberto Ogata, presidente da Associação Internacional de Promoção de Saúde no Ambiente de Trabalho (IAWHP). É um dos colunistas do RH Pra Você. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.