Liderança e psicopatia: O que podemos aprender sobre liderança com os políticos? (parte 1)
A cena foi digna de um filme de ação, mas infelizmente aconteceu em um palco político real. Durante o debate para a prefeitura de São Paulo, transmitido ao vivo pela TV Cultura, no dia 15 de setembro de 2024, o apresentador e candidato José Luiz Datena perdeu o controle após uma troca de ofensas com o também candidato Pablo Marçal.
Tudo começou quando Marçal, que é conhecido por seus comentários provocativos, promoveu uma série de ataques pessoais a Datena e Incluiu referências a processos judiciais envolvendo o jornalista. O clima esquentou, e no quarto bloco do debate, Datena não se conteve: levantou-se, pegou uma cadeira que estava próxima e a arremessou contra Marçal.
A confusão foi generalizada, com Datena sendo expulso do debate e Marçal precisando ser atendido no hospital. O episódio repercutiu imediatamente nas redes sociais e gerou um debate sobre o nível de agressividade nos debates políticos, levantando questões sobre a qualidade da liderança no Brasil e o que esperamos de nossos candidatos.
Ademais, não se tratava apenas de uma questão de descontrole emocional por parte de Datena, mas também de provocação verbal e agressividade emocional por parte de Marçal.
Violência física e verbal
Esse episódio, marcado pela violência física e verbal, não foi apenas um incidente isolado.
Ele simboliza algo maior: a degradação do espaço de debate político no Brasil, onde o confronto toma o lugar da construção de soluções. A “cadeirada” é o ápice de um comportamento cada vez mais comum, em que a falta de empatia, a agressividade e o espetáculo se tornaram armas políticas.
Mas, como chegamos ao ponto em que ataques pessoais e violência física são, para alguns, símbolos de liderança?
E por que essa falta de controle emocional, tanto verbal quanto físico, parece se perpetuar em quem busca posições de poder?
Dificuldade em lidar com emoções
Essa cena lamentável reflete a dificuldade de muitos líderes em lidar com suas emoções e, portanto, provoca um questionamento sobre as qualidades que valorizamos nos líderes.
O controle emocional e a empatia parecem estar desaparecendo do discurso político e, em seu lugar, vemos líderes que optam pela agressividade como forma de afirmar poder.
Assim sendo, Datena ao arremessar a cadeira, demonstrou um comportamento descontrolado que, embora chocante, é algo que muitos interpretam como “autenticidade” ou até “coragem” em um cenário onde a provocação constante está sempre à espreita.
Mas isso é mesmo um traço que queremos em nossos líderes?
Por outro lado, as provocações de Pablo Marçal também nos fazem refletir sobre outro problema: a falta de empatia no diálogo.
Palco de insultos e humilhações
Portanto, o debate, que era para ser um espaço de troca construtiva, transformou-se em um palco de insultos e humilhações. Quando a agressividade verbal é usada para atacar, ela gera uma espiral de respostas emocionais, criando um ambiente tóxico que serve apenas para inflamar os ânimos e afastar a real resolução de problemas.
Esses comportamentos levantam a questão de como líderes com traços psicopáticos ou desregulados emocionalmente ascendem ao poder. Psicopatas, com sua habilidade de manipulação, superficialidade emocional e agressividade disfarçada de confiança, muitas vezes encontram um terreno fértil para prosperar em cenários onde a empatia e o diálogo são desprezados.
Por que alguns líderes parecem ser incapazes de agir com empatia, compaixão ou até mesmo respeito básico pelos outros?
Dar exemplo de equilíbrio emocional e sabedoria
O que acontece quando um líder, que deveria ser um exemplo de equilíbrio emocional e sabedoria, desconecta-se das emoções humanas básicas?
Em conclusão, a resposta pode estar em um traço de personalidade muito estudado, mas pouco compreendido em seu impacto na liderança: a psicopatia.
O que é psicopatia e como ela se manifesta na liderança?
Quando falamos em psicopatia, eu sei que a imagem que vem à sua cabeça podem ser assassinos de filmes de terror ou criminosos infames como Ted Bundy e Charles Manson.
Essas representações icônicas de psicopatas se tornaram parte da cultura popular, mas elas contam apenas uma parte da história.
Na realidade, a psicopatia não se limita a atos extremos de violência. Muitos psicopatas estão entre nós, vivendo vidas aparentemente normais. É possível que eles possam ser aquele colega de trabalho que parece sempre disposto a manipular situações em benefício próprio.
Inclusive, até mesmo alguém em uma posição de liderança que exerce o poder de maneira destrutiva, sem nunca levantar suspeitas de seus verdadeiros traços.
Os psicopatas funcionais
Os psicopatas funcionais, como são chamados, não precisam cometer crimes hediondos para causar danos. Muitas vezes, seus comportamentos passam despercebidos, pois eles são mestres em camuflar suas intenções por trás de um carisma envolvente e de uma aparência de normalidade.
Em outras palavras, essas pessoas podem estar em cargos de poder, onde suas ações têm impactos devastadores sobre as pessoas ao seu redor, mesmo que sem o uso da violência física.
A psicopatia é definida cientificamente como um transtorno de personalidade que afeta cerca de 1% da população. De acordo com o psicólogo canadense Robert Hare, autor do livro “Without Conscience“ e criador da Lista de Verificação de Psicopatia de Hare (PCL-R), a psicopatia é caracterizada por traços como:
- falta de empatia;
- superficialidade emocional;
- manipulação e
- comportamento antissocial.
Hare explica que os psicopatas são incapazes de experimentar emoções profundas, como remorso ou culpa, e muitas vezes vêem os outros como meros objetos a serem usados para alcançar seus próprios fins.
A estrutura cerebral é diferente
Estudos demonstram que a estrutura cerebral dos psicopatas é diferente, especialmente nas regiões associadas à empatia e ao controle emocional. Pesquisas realizadas pela Universidade de Wisconsin-Madison, por exemplo, mostram que psicopatas têm conexões cerebrais anormais entre a amígdala (responsável por processar emoções) e o córtex pré-frontal ventromedial (envolvido na tomada de decisões éticas e controle de impulsos). Por conseguinte, significa que eles são capazes de entender, cognitivamente, o que são as emoções, mas não conseguem senti-las de verdade.
Quando falamos de psicopatia no contexto de liderança, os danos podem ser profundos.
No ambiente de trabalho eles podem se destacar por sua habilidade de manipular situações e pessoas em benefício próprio. Podem também exibir traços de liderança como confiança e determinação, mas suas motivações são completamente autocentradas.
Psicopata corporativo tem atração por posição de poder
Um estudo publicado no Journal of Business Ethics indica que psicopatas corporativos são frequentemente atraídos por posições de poder e, uma vez que estão no controle, não hesitam em sacrificar o bem-estar de seus liderados ou da empresa para satisfazer seus interesses pessoais.
Esses líderes costumam ser encantadores à primeira vista, conquistando a confiança de suas equipes e superiores. Entretanto, ao longo do tempo, começam a se revelar manipuladores, insensíveis e, em alguns casos, até mesmo abusivos. Por consequência, o dano que eles causam nem sempre é facilmente visível. De fato, eles muitas vezes prosperam em ambientes corporativos que recompensam comportamentos agressivos e a busca incessante por resultados, mesmo que isso signifique passar por cima dos outros.
Promovem cultura de medo e desconfiança
Eles são conhecidos por promover culturas de medo e desconfiança, onde o abuso emocional e a manipulação são usados para manter o controle. Dessa forma, como eles não sentem empatia, decisões que prejudicam os outros ou que geram ambientes tóxicos no trabalho não causam neles o menor desconforto. Para eles, o que importa é o poder, e qualquer ação é justificada se isso os levar a manter ou aumentar esse poder.
Como Robert Hare aponta, psicopatas são “predadores” emocionais. Eles veem o mundo como um jogo, onde as pessoas são peças a serem manipuladas para seu benefício. Por isso, enquanto muitos líderes psicopatas podem alcançar sucesso a curto prazo, o dano que causam às suas equipes e às organizações é enorme a longo prazo. O nível de rotatividade de funcionários, a queda no moral e a instabilidade emocional são apenas alguns dos efeitos nocivos de se trabalhar com um psicopata.
E por que psicopatas sobem ao poder?
Isso nos leva a uma questão intrigante: por que tantos psicopatas conseguem ascender a posições de liderança?
A resposta está em como nossa sociedade valoriza certos traços. Em muitas culturas organizacionais e políticas, características como autoconfiança, determinação e ousadia são vistas como indicativos de uma boa liderança. Psicopatas, com sua habilidade de manipular e parecer confiantes, podem se destacar nesses ambientes.
Além disso, a falta de empatia e culpa, que são traços definidores da psicopatia, permite que essas pessoas tomem decisões difíceis, sem se sentirem emocionalmente sobrecarregadas.
Por isso, em situações de crise, onde decisões rápidas e firmes são necessárias, líderes psicopáticos podem parecer extremamente bons, mesmo que seus métodos sejam moralmente questionáveis.
Você já conheceu um líder assim? Aquele que toma decisões sem considerar o impacto que elas terão sobre os outros?
Veja a parte 2 deste artigo aqui
Por Charles Betito, Especialista em Saúde Mental Corporativa | Consultor de Treinamento e Desenvolvimento. Com mais de 20 anos de experiência em meditação e práticas de atenção plena, adquiriu habilidades em tecnologia e inovação por meio de treinamento avançado em instituições de renome como o MIT, Singularity University e o Institute for The Future.
🎧 Ouça o episódio 149 do Podcast RH Pra Você Cast: “Líder, já colocou a empatia no seu currículo?“
Empatia na Liderança: acima de tudo desenvolva Essa Habilidade Essencial
Busque uma Gestão Humanizada
Assim, no episódio 149, vamos explorar a pergunta: “Líder, já colocou a empatia no seu currículo?”. Pois à medida que o perfil das lideranças passa por transformações, a empatia emerge como uma habilidade-chave. Mas o que realmente significa ser um profissional empático na prática?
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Conversamos com Vivian Laube, Especialista em Liderança e Comportamento Organizacional, e Priscila Monaco, Diretora Senior de RH da Visa, para entender como desenvolver essa habilidade essencial. Analogamente, a pandemia e os períodos de crise também destacam a importância das soft skills no ambiente corporativo.
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Descubra como o RH pode contribuir para que a empatia faça parte da cultura da empresa. Em outras palavras, acompanhe essa discussão inspiradora e aprenda a fortalecer sua liderança com empatia.
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