Desafios Invisíveis do Trabalho Feminino e seu Impacto na Garantia de Direitos, O trabalho das mulheres muitas vezes se desenrola nas sombras da visibilidade, apesar de seu impacto crucial no crescimento econômico.
Este trabalho invisibilizado abrange uma miríade de atividades, desde o cuidado não remunerado da família até a contribuição vital nos setores econômicos informais. Essa invisibilidade não apenas perpetua desigualdades estruturais, mas também representa um desafio significativo na garantia dos direitos das mulheres.
Ademais, a inserção das mulheres no mercado de trabalho esbarra em dificuldades já conhecidas.
Entre as mulheres o número de desemprego é maior. As mulheres ganham salários 21% menores que os homens, mesmo realizando funções similares e obtendo maior escolaridade, possuindo também uma maior dificuldade no tocante ao crescimento profissional na carreira, de acordo com um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) sobre estatísticas de gênero.
A pandemia também afetou mais mulheres que homens. Enquanto a participação dos homens voltou ao nível anterior à crise sanitária, as mulheres sentiram mais dificuldades para voltar ao mercado de trabalho e enfrentaram taxas de desemprego mais altas. Ademais, ao longo da pandemia, algumas mulheres se viram sobrecarregadas com responsabilidades adicionais em seus lares, como cuidar de familiares.
Outras enfrentaram o impacto direto da crise econômica, perdendo seus empregos em setores fortemente afetados, como comércio, restaurantes e serviços. Mesmo com a gradual recuperação da economia, muitas ainda lutam para encontrar novas oportunidades de trabalho, como revela o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).
Isso demonstra um dos aspectos mais marcantes do trabalho invisibilizado das mulheres: o cuidado não remunerado. Esse cuidado abrange tarefas domésticas, cuidados com os filhos, idosos e doentes.
Embora essas atividades sejam essenciais para o funcionamento da sociedade, elas, frequentemente, não são reconhecidas como trabalho real. Esta invisibilidade contribui para a desvalorização do trabalho feminino e perpetua a ideia de que as mulheres são naturalmente destinadas a assumir tais responsabilidades, impedindo assim a conquista de uma verdadeira igualdade de gênero.
Assim, as mulheres são mais oneradas que os homens pelo cotidiano do trabalho que, muitas vezes, é prestado por elas de forma totalmente gratuita. Isso corrobora para o crescimento profissional dos homens que não lidam com a carga mental do cuidado com o lar e não são responsáveis por conciliar tarefas de casa com o trabalho fora do lar.
Além disso, as mulheres são frequentemente relegadas a setores econômicos informais, onde seu trabalho é subvalorizado e mal remunerado. Nos mercados de trabalho formais, elas enfrentam discriminação salarial e obstáculos à progressão na carreira. Essa segregação ocupacional resulta em uma lacuna salarial de gênero persistente e impede o acesso das mulheres a recursos e oportunidades econômicas.
Esses desafios do trabalho invisibilizado têm implicações significativas na garantia dos direitos das mulheres. Em primeiro lugar, a invisibilidade do trabalho feminino dificulta a formulação de políticas públicas eficazes para abordar as desigualdades de gênero. Sem uma compreensão abrangente do trabalho que as mulheres realizam, é difícil programar medidas que reconheçam e valorizem adequadamente suas contribuições.
Outrossim, a invisibilidade do trabalho das mulheres cria barreiras sociais que subestimam o valor das mulheres. Uma dessas barreiras se encaixa no acesso à justiça. Muitas vezes, as violações dos direitos das mulheres ocorrem no âmbito privado, como no caso da violência doméstica ou da discriminação no local de trabalho.
Essas questões podem ser subestimadas ou ignoradas pelo sistema legal devido à falta de visibilidade do trabalho das mulheres e à prevalência de estereótipos de gênero. A divisão sexual do trabalho representa uma exclusão das mulheres dos espaços de poder e da tomada de decisões, dando aos homens o monopólio, ou seja, o controle direto da construção de direitos. Assim, podemos dizer que o mercado de trabalho possui uma correspondência direta com as hierarquias de gênero.
Quando se observa a distribuição social do trabalho precarizado, as mulheres negras assumem uma posição de liderança. A obra “Gênero e Desigualdade: Limites da Democracia no Brasil”, da escritora Flávia Biroli, comprova que as mulheres correspondem 39% (trinta e nove por cento) das pessoas que exercem esse tipo de trabalho.
Seguidas pelos homens negros que representam 31,6% (trinta e um, seis por cento) e as mulheres brancas que perfazem o importe de 27% (vinte sete por cento), por fim, temos os homens brancos que constroem o total de 20,6% (vinte, seis por cento). Concluímos, então, que a categoria de análise gênero, constrói um eixo com a categoria raça. Em razão disso, as mulheres negras sofrem uma dupla opressão: a de gênero e de raça.
Apesar da divisão sexual do trabalho marcar de forma mais violenta a vida de mulheres pobres, ela também representa uma dificuldade no acesso de mulheres a posições de prestígio, como, por exemplo, na advocacia. De acordo com dados recentes divulgados pelo Conselho Federal da OAB, em um total de 1.319.357 inscritos na ordem dos advogados do Brasil, mais de 51% (cinquenta e um por cento) são mulheres.
Ocorre que, apesar de serem maioria na profissão, pesquisam mostram que as mulheres têm menos chances de se tornarem sócias dos escritórios. Um dos principais fatores que leva a essa questão é a maternidade.
Com a necessidade de exercer um maior cuidado na criação dos filhos e nas tarefas do lar, elas são consideradas menos aptas ao investimento profissional por parte dos escritórios. Além disso, elas são as maiores vítimas dos casos de assédio moral e sexual no ambiente de trabalho, segundo pesquisa realizada pela Datafolha no ano de 2021.
Esses dados demonstram a necessidade de uma abordagem multifacetada que inclua a conscientização pública sobre a importância do trabalho feminino, a promoção de políticas que reconheçam e valorizem o cuidado não remunerado e a luta contra a discriminação de gênero nos mercados de trabalho formais e informais.
Além disso, é crucial que a advocacia incorpore uma perspectiva de gênero em todas as suas atividades, garantindo que as necessidades e os direitos das mulheres sejam devidamente considerados em todas as áreas do direito. Isso inclui a defesa de leis que protejam os direitos reprodutivos das mulheres, a luta contra a violência de gênero e a promoção da igualdade salarial.
Em última análise, a visibilidade e o reconhecimento do trabalho das mulheres são fundamentais para avançar na igualdade de gênero e garantir a realização plena dos direitos das mulheres.
A advocacia desempenha um papel crucial nesse processo, defendendo políticas e leis que reconheçam e valorizem o trabalho feminino, e desafiando ativamente as estruturas de poder e os estereótipos de gênero que perpetuam a invisibilidade das mulheres. Efetivando tais direitos, podemos conquistar espaços onde o trabalho feminino seja reconhecido, valorizado e celebrado como sempre deveria ter sido.
Por Kamila Carino Machado, advogada especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário, Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho, Doutoranda em Sociologia Política, Membro da Comissão de Direito Previdenciário na OAB e Sócia fundadora do MCF Advogadas. Com mais de 08 anos de exercício na área, é focada na advocacia para as demandas sociais complexas e humanizada, e com atuações no Tribunal de Justiça, Justiça Federal e na Defensoria Pública.
Ouça o episódio 185 do podcast RH Pra Você Cast, “A relação do mercado de trabalho com as mulheres está mesmo evoluindo?“. Segundo dados de um estudo realizado pela Think Olga, 86% das mulheres sentem que sua carga de responsabilidade é muito alta, enquanto quase 60% têm a responsabilidade de cuidar de alguém. Diante de um mercado de trabalho já desafiador para o público feminino, uma vez que muitos tabus ainda estão distantes de serem quebrados em algumas empresas, a jornada dupla de trabalho se soma como mais um enfrentamento para as profissionais brasileiras. o RH Pra Você Cast convidou duas grandes referências em inclusão para debater ações que o RH pode tomar para garantir o bem-estar das mulheres em ambiente de trabalho. Jorgete Lemos, sócia fundadora da Jorgete Lemos Pesquisas e Serviços, e Maíra Liguori, Diretora das organizações da Think Eva, trouxeram uma importante discussão sobre as melhorias que podem ser promovidas. Confira!
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