Reflexões sobre Contrato Intermitente de Trabalho e sua Constitucionalidade

É sabido que a Reforma Trabalhista trouxe maior flexibilização das relações de trabalho, com intuito de regulamentar novas modalidades emergentes no mercado. O art. 443, §3º, da CLT, que aborda o contrato intermitente, permite que o trabalhador seja contratado para prestar serviços de forma não contínua. Isto é, com períodos alternados de trabalho e inatividade. Além disso, determina que a remuneração abrange o tempo efetivamente trabalhado, seja em horas, dias ou meses.

O contrato intermitente deve ser celebrado por escrito e conter, especificamente, o valor da hora de trabalho. Ademais, é vedado valor inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais colaboradores do estabelecimento que exerçam a mesma função.

Validade do contrato intermitente

Outro requisito para a validade do contrato intermitente é que o empregador faça a convocação, informando qual será a jornada, com pelo menos três dias de antecedência. Ainda, o colaborador tem um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa, sem afastamento da subordinação.

Ademais, ressalta-se que referida modalidade contratual garante, ao colaborador, o recebimento de férias proporcionais com acréscimo legal, 13º salário proporcional, descanso semanal remunerado e outros adicionais legais pertinentes. 

No entanto, o contrato intermitente tem sido alvo de debates acerca de sua constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. Isso acontece por meio das ADIs 5.826, 5.829 e 6.154. Afinal, é acusado de precarizar as relações de trabalho. Também, em ofensa aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e valorização do trabalho. Pois, permitiria que o trabalhador fique sem renda fixa. E, assim, colocaria em risco sua subsistência e o cumprimento de suas obrigações básicas.

Retirar a informalidade

Com efeito, Luciano Martinez destaca que o argumento mais utilizado para justificar a adoção do contrato para prestação do trabalho intermitente foi o de retirar da informalidade um conjunto de trabalhadores que normalmente eram identificados como biscateiros ou freelancers. Em que poderiam, enfim, ter CTPS anotada, férias, décimo terceiro salário, FGTS e recolhimento de contribuições previdenciárias.

No entanto, há preocupações sobre a falta de garantia de uma jornada mínima, o que pode deixar o trabalhador em uma situação de instabilidade financeira. Isso, por sua vez, pode gerar insegurança e dificuldade no planejamento de suas finanças, um ponto crucial quando falamos da dignidade da pessoa humana — um princípio consagrado pela Constituição Federal de 1988 3. A Carta Magna, além de garantir a dignidade, também assegura direitos fundamentais como o salário mínimo necessário para suprir as necessidades vitais (art. 7º, IV) e a proteção contra a despedida arbitrária (art. 7º, I).

Diante desse cenário, temos que a regulamentação do contrato intermitente deve ser examinada sob a perspectiva de sua contribuição para a inclusão de trabalhadores. Em particular, aqueles que, antes da Reforma Trabalhista, operavam na informalidade, sem qualquer proteção jurídica ou garantia de direitos.

Contrato intermitente como resposta

De qualquer forma, é inegável que o contrato intermitente surge como uma resposta às mudanças no mercado de trabalho, impulsionadas pela tecnologia e pelo aumento das atividades no setor de serviços.

A flexibilidade nas relações de trabalho tem sido uma demanda crescente, e o ordenamento jurídico precisa acompanhar essas transformações para evitar que os trabalhadores fiquem à margem da proteção social.

Outro ponto de destaque é o princípio da autonomia privada nas relações laborais. O contrato de trabalho intermitente é pactuado mediante mútuo consentimento das partes (empregador e empregado). Observa-se o princípio da autonomia da vontade, essencial nas negociações contratuais.

Empregado pode aceitar ou recusar

O empregado detém a prerrogativa de aceitar ou recusar as convocações para prestação de serviços. Isso sem incorrer em qualquer penalidade. Além disso, configura uma relação de trabalho pautada pela flexibilidade e voluntariedade. A possibilidade de recusa da oferta laboral assegura ao trabalhador a preservação de sua dignidade e autonomia. Portanto, afasta a concepção de subordinação irrestrita ao empregador.

A regulamentação do contrato de trabalho intermitente não configura mecanismo de precarização das relações laborais. Na verdade, auxilia na melhora da proteção social daqueles que, anteriormente, trabalhavam de maneira informal ou esporádica. Além disso, confere a possibilidade de administrar os períodos de inatividade conforme suas conveniências pessoais. Também, permite obter novos contratos intermitentes, eis que tal modalidade não exige exclusividade.

A análise do contrato intermitente sob a ótica da Constituição Federal e da CLT não leva necessariamente à conclusão de que ele seja inconstitucional. Pelo contrário, ele pode representar uma forma de inclusão para trabalhadores que, antes, não tinham qualquer proteção legal.

Dessa maneira, a questão, portanto, não é apenas jurídica, mas também social. Isso nos leva a fazer a seguinte reflexão: como garantir que a flexibilização das relações de trabalho promova a dignidade e o bem-estar dos trabalhadores em um cenário econômico em constante transformação? E, de forma que também atenda a demanda das empresas?

Contrato Intermitente_foto da autora

Por Gabriela Pimenta Vilela, advogada trabalhista do escritório Granito Boneli Advogados Associados (GB Advogados Associados). Pós-Graduada em Direito do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, em Direito Empresarial pela Faculdade Legale, em Direito Digital pela Faculdade Metropolitanas Unidas e, em Direito Tributário pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus.

 


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