Seis pessoas por metro quadrado. Essa era a concentração média de passageiros nas composições do metrô de São Paulo, fora dos horários de picos. Ao todo, só os sistemas de metrô e trens transportavam 12 milhões de pessoas diariamente em todo o país, antes da pandemia da Covid-19, segundo dados da ANPTrilhos.
No entanto, é fato que, assim como outros diversos setores, o transporte público urbano terá que se reinventar no pós-pandemia. Essa reinvenção passará por mudanças operacionais e jurídicas, que já começaram a ser discutidas por gestores públicos, operadores e empresas.
O novo coronavírus tem forçado as cidades a repensarem a mobilidade. Será possível adotar conceitos mais flexíveis e inteligentes para oferecer serviços com mais qualidade e menor custo para o cidadão, mantendo a saúde financeira das companhias? Ônibus, metrôs e até aviões precisam se adequar às novas normas sanitárias e limite máximo de passageiros, o que refletirá também na questão financeira das operadoras e, consequentemente, no valor das tarifas aos usuários.
Muito tem se falado sobre o trabalho remoto como uma opção para melhorar o fluxo de pessoas nas cidades e nos meios de transportes. Porém, nos casos de atividades em que isso não é possível, quais seriam as alternativas para garantir uma circulação mais segura de pessoas e veículos?
Uma das opções que começa a ganhar voz é a volta do uso de soluções individuais como o carro. Um movimento contrário do que apontavam estudos sobre o desejo, principalmente dos mais jovens, em não querer ter um carro. Em uma pesquisa sobre Mobilidade que realizamos há 3 anos, 55,4% dos jovens acima de 18 anos disseram não ter CNH (Carteira Nacional de Habilitação) e 41,1% afirmaram não ter interesse em tirar. Nos últimos anos, vimos a explosão de meios de transportes compartilhados ganhar o mundo, mas será que agora isso mudará e teremos ainda mais carros pelas ruas?
O BID (Banco Internacional de Desenvolvimento) realizou uma pesquisa em abril, com 33 mil usuários de transportes público em cidades latino-americanas. Em São Paulo e Rio de Janeiro, 3% dos entrevistados afirmaram que mesmo se as restrições forem suspensas, pretendem evitar o transporte público, daqui para frente.
A discussão não é exclusiva de nós, brasileiros, muitos países estão revendo suas opções de mobilidade urbana. A construção e expansão de ciclofaixas, por exemplo, é uma das alternativas que já começou a ser implantada em outros países como na Bélgica, na capital Bruxelas, onde o governo rapidamente aumentou em 40 quilômetros sua rede ciclística, incentivando os cidadãos a optarem por bicicletas em viagens curtas, evitando as aglomerações nos transportes públicos. Milão pretende transformar 35 quilômetros de ruas em espaços exclusivos para bicicletas e para pessoas caminharem. E em Londres, profissionais de saúde receberam acesso grátis e temporário de bicicletas elétricas, por parte de companhias de mobilidade compartilhada.
Essa última alternativa aplicada na capital da Inglaterra, por acaso, foi por empresa de transportes, mas penso que, nós como companhias, independentemente do segmento de atuação, também devemos ser responsáveis por garantir melhores opções e novas alternativas. Para mim, mobilidade vai muito além do transporte, é sobre o respeito ao acesso e liberdade de escolha das pessoas. Segurança, qualidade de vida, sustentabilidade e produtividade devem estar intimamente ligadas à questão de mobilidade.
Periodicamente, em nossa empresa, realizamos diversas pesquisas que nos ajudam a entender os novos comportamentos e, com isso, desenvolver novos produtos que atendam a este mercado em constante movimento. Partimos de um ponto que para nós é essencial: o direito à liberdade do usuário em escolher a melhor maneira de ir e vir do trabalho. O vale-transporte como benefício para ser utilizado nos transportes públicos “tradicionais” como ônibus, trem e metrô já não é mais a única opção. É preciso oferecer opções de escolhas, ainda mais no pós-pandemia.
Por isso, cabe a nós desenvolver e incentivar produtos que possam atender essas novas necessidades, como a entrega de um cartão multimodal, que permita ao colaborador pagar vários tipos diferentes de transportes, desde os públicos tradicionais (ônibus, trem e metrô), como usar também como meio de pagamento em aplicativos de táxi, carro compartilhado, locação de bicicleta, patinetes, em seu trajeto de ida ou volta do trabalho. Com mais opção, é possível minimizar as grandes aglomerações centralizadas em poucos tipos de transporte.
Ainda não temos todas as respostas sobre as melhores práticas que deveremos adotar quando tudo isso passar, mas uma coisa é certa: flexibilizar e dar mais opções e segurança a quem precisa se locomover é um bom começo.
Por Cesário Nakamura, presidente da Alelo, bandeira especializada em benefício, gestão de despesas corporativas e incentivos