Enquanto o futuro do trabalho bate à porta, o RH Summit 2025 abriu um espaço para reflexão e confronto. Realizado nos dias 3 e 4 de junho, o evento trouxe discussões profundas sobre o presente e os próximos anos da área. 

A edição deste ano se afastou do óbvio para explorar as zonas cinzentas da liderança, a urgência de uma cultura organizacional autêntica e o verdadeiro significado de um RH estratégico, em um encontro movido por provocações afiadas e a honestidade de exemplos práticos.

Confira alguns momentos do evento:

O chefe tóxico e a zona cinzenta da liderança

Um dos painéis mais impactantes foi comandado por Eberson Terra, que lançou seu novo livro, "Manual antichefe: Como enfrentar a toxicidade na gestão e não repetir os mesmos erros ao se tornar líder". A publicação, construída a partir de 20 anos de experiências em consultorias e liderança, aborda os comportamentos sutis que tornam ambientes organizacionais insustentáveis.

A maioria dos líderes tóxicos não grita e esbraveja mais. O que vemos hoje são pequenas atitudes que minam a saúde mental dos times — e nem sempre são percebidas como assédio”, afirmou.

Segundo ele, a zona cinzenta da toxicidade exige atenção especial das empresas. “O colaborador muitas vezes nem sabe que está sendo assediado. E isso corrói.”

Eberson também destacou que a nova versão da NR-1, prevista para entrar em vigor em 2026, poderá ajudar na identificação desses microcomportamentos tóxicos. “É uma mudança urgente e necessária.”

RH estratégico: além da folha e da festa

Outro destaque foi o bate-papo com as gêmeas do DP, Tati e Cátia, figuras conhecidas por traduzirem o complexo universo do Departamento Pessoal (DP) para a realidade das empresas. Elas foram diretas: não existe RH estratégico sem um DP forte.

Muita gente ainda acha que RH é só folha de pagamento. Mas, se eu penso em oferecer benefícios, cultura ou um programa de desenvolvimento, eu preciso de uma base bem feita. Isso começa no DP”, reforçaram. Para elas, a mudança de percepção sobre o papel do RH precisa partir dos próprios profissionais. “RH e DP são setores diferentes, mas precisam andar juntos. O arroz com feijão vem antes da roda-gigante.”

Cargos, salários e coragem para negociar

Na palestra “Comece pequeno, termine grande”, Priscila Santos falou sobre planos de cargos e salários e destacou a importância da negociação já no momento da contratação. “Se a empresa está escolhendo o melhor talento, o talento também precisa avaliar se quer estar naquela empresa.”

Segundo Priscila, embora muitas empresas ainda mantenham práticas conservadoras, há um movimento claro nas startups e empresas mais modernas: flexibilidade, benefícios personalizados e autonomia ganham espaço como moeda de troca.

“O que atrai hoje não é só o salário — é o equilíbrio.” Ela também alertou para o retrocesso silencioso: apesar do discurso pró-flexibilidade, 95% das vagas atualmente são presenciais. “Estamos voltando ao presencial como manada. Não há reflexão sobre o que realmente funciona para o negócio ou para o colaborador.”

Skills obrigatórias do RH

Diversidade vai além do marketing: como empresas que tratam o tema como transformação estrutural ganham relevância — mesmo em setores majoritariamente masculinos

Com investimentos sendo cortados e áreas de diversidade sendo encerradas até mesmo por big techs, ganha força quem trata o tema não como tendência, mas como estratégia de transformação estrutural. É o que defende Cibele Carvalho Diniz, Diretora de Pessoas e Cultura da Webmotors.

Durante um painel sobre o futuro da diversidade nas organizações, Cibele destacou que, apesar de 54% das empresas declararem adotar ações para se tornarem mais diversas, ainda há uma lacuna entre discurso e prática. “A diversidade está na decisão das empresas, mas nem sempre é vivida de forma consistente. O mercado está revelando quem realmente sustenta essa pauta e quem apenas surfa a onda”, afirma.

A executiva também trouxe a realidade do setor automotivo — historicamente masculino — e os avanços dentro da Webmotors. “Quando entrei em 2019, tínhamos apenas 12% de mulheres na liderança. Hoje, esse número subiu para 34%”, compartilha. Ela acredita que transformar a cultura em setores como esse exige atenção redobrada e políticas claras, mas é essencial para refletir a sociedade e os consumidores de hoje.

“Afinal, se mais da metade da população é composta por mulheres, e queremos criar produtos e experiências relevantes para esse público, precisamos de mulheres construindo isso dentro das empresas”, conclui.

Quem cuida de quem cuida?

RH cuida de todo mundo, mas quem cuida do RH?” — essa foi uma das provocações que o RH Summit fez nesta edição. Camila Securato, CSO da Exame Educação e da Saint Paul Escola de Negócios, uma das palestrantes, abriu sua participação em um painel sobre saúde mental e protagonismo nas áreas de Recursos Humanos. Segundo ela, o RH, apesar de ser o principal responsável por promover políticas de cuidado e acolhimento nas empresas, frequentemente é desumanizado e negligenciado.

A área está sempre sendo demandada, mas raramente alguém pergunta se o RH está bem”, afirmou. O alerta é especialmente relevante diante de um cenário em que a sobrecarga e o desgaste emocional se tornam cada vez mais comuns entre os profissionais da área.

Camila destaca que parte da solução passa por uma mudança de postura dentro do próprio RH: “A liderança de RH precisa ser exemplo, não apenas formadora de bons líderes. Também é essencial que esses profissionais desenvolvam a habilidade do autocuidado, saibam impor limites e tenham autonomia para explicar o seu papel”.

Outro ponto levantado no painel foi o risco de se depositar toda a responsabilidade de gestão de pessoas nas mãos do CEO, especialmente em startups e pequenas empresas, onde nem sempre há uma estrutura formal de RH. Para Camila, isso é prejudicial: “O CEO tem um cargo de poder muito alto. Isso gera barreiras para os colaboradores levarem questões sensíveis sobre bem-estar, clima organizacional ou conflitos com líderes. O RH precisa ser um espaço seguro — e isso se perde quando é confundido com a alta liderança”.

Sobre estruturas horizontais, Camila pondera que elas podem ser eficazes, mas só funcionam se houver preparo: “Gestão horizontal não significa ausência de liderança. É necessário formar gestores com olhar humano, que saibam lidar com pessoas, não apenas com processos. Sem isso, a horizontalidade vira desorganização.”

A fala da executiva reforça um ponto essencial para empresas de todos os portes: cuidar de quem cuida é uma estratégia de sustentabilidade humana no ambiente corporativo.

Curiosidade é o novo diferencial: por que relações e perguntas certas valem mais do que certezas prontas no mundo corporativo

“Como você se imagina daqui a dez anos? Nem eu sei. E esse é o ponto.” É com essa provocação que Ana Minuto (capa), CEO da Minuto Consultoria, e uma das palestrantes do evento, inicia o papo exclusivo com o RH Pra Você. A repensar a forma como lidamos com mudanças, conexões e desenvolvimento pessoal e profissional.

Segundo Ana, em um cenário em que 50% da população se sente sozinha, é essencial refletir sobre a qualidade das conexões que estamos construindo. “As relações que criamos hoje são as que vão nos sustentar no futuro. Você está construindo essas relações com intenção?”, questiona.

Ela também alerta para o risco da obsolescência emocional e intelectual em um ambiente de mudanças rápidas. “Não existe mais uma verdade absoluta. A curiosidade se torna um ativo: quem pergunta, quem questiona, quem busca entender o porquê das coisas está 50% mais preparado do que quem apenas repete o que já sabe.”

Para as empresas, o recado é claro: é hora de cultivar ambientes que incentivem a escuta ativa, o senso crítico e a formação de vínculos genuínos — não apenas com foco em performance, mas em sustentabilidade emocional e capacidade de adaptação. Em tempos de incerteza, a curiosidade pode ser o único plano de carreira viável.

Por Noelle Neves