Houve um momento (não tão longínquo assim) em que apenas o ato de falar sobre saúde mental causava desconforto nas pessoas. Dentro das empresas, então, o silêncio imperava. Aos poucos, o mercado de trabalho passou a incluir o tema em suas pautas e ações. Gradualmente, as estratégias ganharam programas específicos.

A evolução é contínua e não anula o fato de ainda existir um estigma acerca do assunto. É justamente por isso que ele deve seguir em evidência e, desde o início da pandemia do novo coronavírus, em março de 2020, esse destaque vem aumentando na sociedade e, consequentemente, nas organizações.

Segundo pesquisa do Instituto Ipsos, encomendada pelo Fórum Econômico Mundial, 53% dos brasileiros declararam que seu bem-estar mental piorou um pouco ou muito no último ano. Essa porcentagem só é maior em quatro países: Itália (54%), Hungria (56%), Chile (56%) e Turquia (61%).

A pandemia, de fato, apurou o olhar das companhias à urgência de exercer um protagonismo diante do bem-estar de seus colaboradores. Na Ambev, que já vinha prestando atenção nisso, a saúde mental ganhou uma diretoria exclusiva e dedicada ao tema.

À frente da área, Mariana Holanda destaca que a criação [em junho de 2020] teve como base a evolução cultural da empresa que busca, desde 2019, revisar e pensar quais atualizações precisavam ser feitas.

“A saúde mental veio de forma muito forte, não só pela tendência do mundo, mas como uma discussão interna. O nosso desafio de evoluirmos a cultura é igual ao de qualquer outra empresa que passa por esse processo. Precisamos honrar nosso passado, pois foi ele que nos trouxe até aqui, mas é preciso reconhecer os valores, processos e rotinas que não estão fazendo mais sentido, e melhorarmos”, afirma.

Ao RH Premium Melhores Práticas em RH, a profissional falou sobre a criação e desenvolvimento da área, a inovação em gestão de pessoas, home office e flexibilidade e o papel da companhia no consumo consciente de bebidas alcoólicas. Confira trechos do bate-papo.

RH Premium: Quando a Ambev percebeu e decidiu que seria necessária a criação de uma área exclusiva para cuidar da saúde mental? Como foi esse processo evolutivo pré-criação?

Mariana Holanda: A saúde e a segurança de nossos funcionários são nossa prioridade e, mesmo antes da pandemia, a Ambev já vinha discutindo e prestando atenção nos efeitos e no que estava acontecendo com os funcionários. Nesse ponto, eu – como psicóloga e dentro da área – conseguia puxar o tema e o debate para a companhia. Sem dúvida a pandemia acelerou e evidenciou os desafios de saúde e o fato de todos terem que se ajustar para um sistema de home office trouxe muitas inseguranças, com os medos e receios de passar pela maior crise sanitária de toda uma geração. A saúde mental de uma pessoa está relacionada à forma como ela reage às exigências da vida e ao modo como harmoniza seus desejos, capacidades, ambições, ideias e emoções. Então, de fato, a pandemia acelerou a criação da área, mas já vínhamos conversando sobre saúde mental e já estávamos falando, no ambiente corporativo, sobre valores como vulnerabilidade, empatia e escuta ativa, por exemplo.

Mariana Holanda, diretora de saúde mental da Ambev

Quais os pilares, prioridades e objetivos da área? 

Nós a criamos com o objetivo de olhar para o ser humano em sua totalidade e, além disso, sabemos que – como empresa que valoriza segurança e saúde – precisávamos questionar e ajustar os processos internos para ter um cuidado mais integral. Estamos fazendo isso para levantar o tema e estimular as pessoas, pois entendo que o cuidado com a saúde é compartilhado, ou seja, temos a responsabilidade como empresa, mas também existe a responsabilidade do próprio indivíduo. A empresa precisa abrir a visão e instigar os funcionários a não terem esse estigma sobre o assunto. A gente fala sobre o mental, mas tudo isso tem a ver com outras questões da vida, como estimular uma boa alimentação e a prática de exercícios físicos, por exemplo. Somos responsáveis por criar as iniciativas, como vamos transformar as impressões em dados, as informações em aprendizados e transformar essa visão de que saúde mental é um problema, já que deveria ser um estímulo e nossa maior fortaleza para despertar essa potência individual.

A criação dessa diretoria passa, imagino, por uma inovação na gestão de pessoas. Essa inovação tem como prioridade a humanização? 

A Ambev está em um momento de transformação profunda e abrangente, que passa por sua estrutura, portfólio, comportamentos e maneira de fazer negócios. E a própria criação da área teve como base essa evolução cultural que, desde 2019, estamos revisando e pensando quais atualizações precisavam ser feitas e a saúde mental veio de forma muito forte, não só pela tendência do mundo, mas como uma discussão interna. O nosso desafio de evoluirmos a cultura é igual ao de qualquer outra empresa que passa por esse processo. Precisamos honrar nosso passado, pois foi ele que nos trouxe até aqui, mas é preciso reconhecer os valores, processos e rotinas que não estão fazendo mais sentido, e melhorarmos. A sociedade não fica parada, os valores evoluem e nós precisamos acompanhar. Sabemos que não é fácil e leva tempo. A cultura Ambev está dentro de cada um dos nossos funcionários, então falar de evolução cultural é também falar de evolução de cada um dos indivíduos pertencentes a esse meio nada trivial.

Qual a importância e como engajar a alta liderança nesse processo?

O líder nesse contexto é extremamente importante, porque ele tem a missão de incentivar e impulsionar a mudança nos seus times. Porém, é preciso que a liderança viva de fato esses novos valores. Se envolver no processo, se atualizar internamente e praticar o autoconhecimento são peças fundamentais. Quando a liderança se torna uma referência nesse sentido, o resto do time se sente mais direcionado e os receios diminuem. Também é papel da liderança cultivar um ambiente aberto à inovação, mostrando que não há ideia ruim e que o time pode se sentir confortável para falar sem medo, porque juntos podemos aprimorar. Isso faz parte do processo de inovação. E estar aberto a novas ideias também contribui muito para que a empresa evolua mais rapidamente nessa jornada.

Vocês são uma grande marca do segmento de bebidas. Algumas pesquisas mostraram que houve um excesso de consumo de bebida alcoólica durante a pandemia. Qual a responsabilidade de uma empresa do setor olhar para esse aumento e, ao mesmo tempo, para a saúde mental? 

Na Ambev promovemos o consumo responsável há mais de 30 anos e estimulamos que os consumidores possam fazer suas escolhas de maneira consciente. Nosso principal compromisso é o de comercializar e promover nossos produtos sempre de maneira responsável.

Estamos empenhados em promover uma cultura de consumo inteligente e em reduzir o consumo nocivo das nossas cervejas. Para tanto, é fundamental ter atenção na forma como nos comunicamos e anunciamos os nossos produtos. Nosso objetivo é desencorajar o uso nocivo de bebidas alcoólicas, para que toda experiência com nossos produtos seja uma experiência positiva. O nosso propósito é a celebração e queremos brindar momentos alegres e inesquecíveis, hoje e sempre.

Compartilhar informação em busca de propósitos relevantes é um dos nossos princípios e o nosso programa de Consumo Inteligente é parte do sonho de conscientização sobre o consumo equilibrado de bebidas alcoólicas. Em 2020, o foco da companhia foi atuar e falar sobre moderação e entendemos que é também nosso papel fornecer as ferramentas necessárias para o consumidor reconhecer e analisar o que é moderação para si próprio.

Acompanhe a entrevista na íntegra na edição RH Premium Melhores Práticas em RH.

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