A situação do Rio Grande do Sul é de calamidade publica, que foi declarada já pelo Governo do Estado[1].
A situação é grave, com a maior parte do estado sob as águas.
Por óbvio, a atividade econômica vai parar, e não só nas áreas afetadas, mas nas áreas com atividade econômica relacionada com essas áreas ou nas que não forem acessadas por falta de estradas, aeroportos.
Como as empresas devem agir para proteger seus trabalhadores e os empregos, ou seja, proteger sua atividade e os empregos que dependem dela?
A legislação no Brasil tem várias possibilidades para atuação em situações de força maior como essa.
A CLT tem regulamentação da força maior no art. 501, e nos art. 502 e 503 regula, respectivamente, a demissão por esse motivo ou a redução proporcional de salário e jornada. Ainda que haja discussão sobre esses artigos, se teriam ou não sido recebidos pela constituição federal, eles estão ali e não foram revogados. O ideal, no entanto, seria usá-los em uma negociação coletiva (como fazer isso, está mais abaixo).
O art. 476-A traz uma possibilidade de suspensão do contrato de trabalho, mas no caso atual, as empresas, em sua maioria, não terão nenhuma atividade econômica, portanto dificilmente terão recursos para arcar com um curso, nem mesmo com um pagamento de auxílio não salarial ali previstos (atuação sindical + tema 1046 do STF podem resolver).
Há outros artigos de leis que podem ser usados em negociação coletiva, como art. 2º da lei 4.923/1965, que também trata de redução proporcional de salário e jornada.
Há ainda a lei 14.437/22. que manteve em prateleira e traz recursos usados durante a pandemia, e que pode ser usado, uma vez que já houve o reconhecimento do estado de calamidade pelo Decreto legislativo 36/24[2] – art. 2º: “... enfrentamento das consequências de estado de calamidade pública em âmbito nacional ou em âmbito estadual, distrital ou municipal reconhecido pelo Poder Executivo federal”
São elas;
I - o teletrabalho;
II - a antecipação de férias individuais;
III - a concessão de férias coletivas;
IV - o aproveitamento e a antecipação de feriados;
V - o banco de horas; e
VI - a suspensão da exigibilidade dos recolhimentos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Os itens são regulados na lei e devem ser analisados a cada caso, considerando a realidade da empresa.
No entanto, o capítulo III, que trata do Programa Emergencial De Manutenção Do Emprego E Da Renda Em Estado De Calamidade Pública, não pode ainda ser aplicado, pois depende de regulamentação pelo governo federal, já que envolve pagamento de benefício aos empregados com contrato suspenso.
Foi autorizada pela Portaria MTE n° 729, de 15 de maio de 2024, a suspensão do recolhimento do FGTS pelos estabelecimentos situados no Rio Grande do Sul[3].
O MPT[4] da 4ª região também emitiu uma resolução indicando medidas que podem ser tomadas pelas empresas, inclusive sobre a não aplicação, ainda, do cap II da lei 14437/22, por falta de regulamentação.
Dito isso, vamos às dicas práticas.
Hoje, sem precisar de medidas governamentais, há as previstas na legislação acima, e há as negociações coletivas, que têm a liberdade maior, conforme o tema 1046 do STF – negociado sobre o legislado para encontrar soluções para salvar empresas e empregos.
Então:
- Mapeie sua situação, como está a atividade econômica, qual a perspectiva de retomada, prejuízos etc. – sua situação econômica vai impactar na medida prevista na lei 4.923/1965, já que é condição essencial para seu uso - portanto financeiro e RH devem trabalhar juntos nessa.
- Verificada a situação, analise, nas medidas já possíveis de serem aplicadas, quais se adequam à sua realidade, e como a implantar com segurança jurídica – então, financeiro, RH e jurídico vão estar juntos.
- Se houver medidas emergenciais individuais que você pode aplicar e são necessárias, já as tome, e veja como contatar os seus empregados.
- Veja como implantá-las, contate o sindicato da categoria e identifique como eles estão agindo: já têm algum plano para a categoria? Já mapearam a situação em geral? Já mapearam que medidas podem acordar com as empresas? Ouça-os e sugira o que você já mapeou. Negociem.
- Não achou o sindicato? Veja com empresas do setor que tenham outros diretores, se conseguiram contato com alguém, busque a federação ou confederação, para tentar localizar pessoal dos sindicatos. Todos estão na mesma situação, então, o contato pode ser mais difícil.
- Com o sindicato, veja também como localizar os empregados, pois muitas vezes eles poderão estar dispersos, em abrigos, e sem comunicação, para verificar como fazer uma discussão coletiva com validade e representatividade.
- Faça a negociação e mostre a real necessidade das reinvindicações, as vantagens aos empregados, e a real situação da empresa. Transparência e ética são tudo sempre, mas neste momento mais ainda.
Use a criatividade e o arcabouço legal que já existe, se o governo criar outros ou regular o capítulo II da lei 14437/22, melhor. Se não, dá para tentar se arrumar com o que temos, e o tema 1046 com a liberdade negocial.
Vamos aprender algo com a população do Sul nesse momento difícil: Mão na massa e luta para resolver o que ai está.
Maria Lucia Benhame, advogada e sócia do escritório Benhame Sociedade de Advogados, especialista em gestão trabalhista. É uma das colunistas do RH Pra Você. O conteúdo dessa coluna representa a opinião do colunista. Foto: Divulgação.